Título: Caverna está na berlinda
Autor: Valadares, João
Fonte: Correio Braziliense, 07/05/2012, Política, p. 3

Parlamentares pressionam para que as medidas de acesso a documentos sigilosos sejam modificadas

Grupo de deputados e senadores que integram a CPI mista do Cachoeira se reúne no fim da tarde de hoje para decidir encaminhamentos contra as medidas restritivas tomadas pelo presidente da comissão, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), em relação ao acesso às informações do inquérito da Operação Vegas. O descontentamento é grande e a confusão que se aproxima parece maior ainda. Numa espécie de caverna, localizada no subsolo da sala onde funciona a comissão, só há três computadores para 32 integrantes. Não foi definido nenhum critério para acesso dos dados. O mais provável é que seja por ordem de chegada.

Além disso, os parlamentares só podem entrar na chamada sala-cofre, monitorada por câmeras e sem internet, após deixar os aparelhos eletrônicos do lado de fora. Reservadamente, alguns insatisfeitos cogitam até mesmo a possibilidade de acionar a Justiça para tentar impedir o que chamam de bloqueio às informações.

O senador Pedro Taques (PDT-MT) declarou, na tarde de ontem, que a atitude inviabiliza o caráter fiscalizatório do legislador. "Uma das funções primárias do legislador é fiscalizar. Estamos impedidos até mesmo de entrar com nossos assessores para analisar as informações. Tenho que ler o inquérito no local e guardar na minha mente de super-homem. O detalhe é que são apenas 20 mil páginas", ironizou. O parlamentar preferiu não detalhar as medidas que o grupo vai tomar. "Vamos nos reunir e avaliar esses pontos. Já existe um movimento contrário às medidas. Como vamos fazer os nossos questionamentos desta maneira? Respeito a posição do presidente, mas é preciso dizer que essa postura inviabiliza o nosso trabalho."

Na sexta-feira, o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) já havia demonstrado grande insatisfação. Ele informou que vai requerer, além do fim do que considera restrição ao trabalho investigativo da CPI mista, todo o material bruto referente a interceptações telefônicas que ficou fora do inquérito. O senador Vital do Rêgo já deu demonstrações de que não vai ceder à pressão do grupo descontente.

Depoimentos Na terça-feira pela manhã, a CPI mista do Cachoeira ouvirá o delegado da Polícia Federal Raul Alexandre Marques Souza, responsável pela investigação da Operação Vegas. Na quinta-feira, é a vez do também delegado da PF Matheus Mella Rodrigues e dos procuradores da República Daniel de Rezende Salgado e Lea Batista de Oliveira, que estiveram à frente da Operação Monte Carlo. Existe uma grande probabilidade de os depoimentos serem fechados numa tentativa de preservar os investigadores. No entanto, esse encaminhamento precisa ser aprovado pelos integrantes da comissão.

Um dos momentos mais aguardados da CPI mista, o depoimento do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, ocorrerá na terça-feira da próxima semana. Ainda não há decisão se ele comparecerá algemado e em trajes prisionais. O ex-diretor da empresa Delta Cláudio Abreu vai à comissão em 29 de maio. Dois dias depois, o senador goiano Demóstenes Torres (sem partido), no foco das denúncias, será ouvido.

Cronograma Terça-feira Delegado da Polícia Federal Raul Alexandre Marques Souza, responsável pela investigação da Operação Vegas.

Quinta-feira Delegado da Polícia Federal Matheus Mella Rodrigues e dos procuradores da República Daniel de Rezende Salgado e Lea Batista de Oliveira, responsáveis pela investigação da Operação Monte Carlo

15 de maio Contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira

29 de maio Ex-diretor da empresa Delta Cláudio Abreu

31 de maio Senador Demóstenes Torres (sem partido-GO)

As táticas de cada um

JÚNIA GAMA

Acuados na CPI do Cachoeira, PSDB e PT ensaiam estratégias paralelas para tentar ganhos políticos com as investigações — ou ao menos evitar maiores estragos. A ação dos tucanos consiste em usar estratégias de guerrilha e lembranças permanentes sobre o julgamento do mensalão. Já petistas vão pressionar o procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

Para combater o uso político do suposto envolvimento do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), com Carlinhos Cachoeira, que deverá ser explorado por petistas durante os trabalhos, tucanos ameaçam expor o governador fluminense, Sérgio Cabral (PMDB), por sua relação com o dono da Delta, Fernando Cavendish.

Um dos objetivos de um grupo de petistas na CPI é Gurgel, a poucos meses do julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal — o magistrado atuará como advogado de acusação. Ele é questionado por setores do PT devido ao fato de não ter pedido o indiciamento do senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) em 2009, quando teve acesso à Operação Vegas da Polícia Federal. Para confrontar a tentativa de desgaste da credibilidade do procurador-geral, o PSDB planeja publicar o relatório do ministro Joaquim Barbosa, em que ele classifica o caso como"graves delitos" cometidos pelo PT.