Correio braziliense, n. 20933, 15/09/2020. Negócios, p. 7

 

Economia incerta com reforma

Vera Batista 

15/09/2020

 

 

Em 10 anos, União, Estados e municípios podem economizar, com a reforma administrativa e outras medidas de enxugamento da máquina, R$ 816 bilhões. Em duas décadas, o impacto positivo para os cofres públicos, em “um caso extremo”, mais que dobra, para R$ 1,767 trilhão. O resultado, para os próximos 20 anos, é a soma de economia potencial de R$ 1,040 trilhão nos estados, R$ 527,06 bilhões na União, e mais R$ 200 bilhões nos municípios. A análise faz parte da nota técnica “Ajustes nas despesas de pessoal do setor público: cenários exploratórios para o período de 2020 a 2039”, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Foram simulados vários cenários, considerando taxa de reposição de 90% para servidores de nível superior e de 50% para nível médio, redução de 30% do salário inicial dos novos admitidos e progressão mais lenta na carreira, bem como o congelamento dos vencimentos por dois anos (2020 e 2021) sem compensação posterior.

As projeções mais longas, porém, foram prejudicadas pela falta de números completos em alguns entes. E os próprios técnicos do Ipea consideram que “o cenário é pouco plausível”, dado que nem todas as medidas precisam ser aprovadas pelo Congresso. “Muito dificilmente, todas as mudanças vão acontecer”, afirmou o diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, José Ronaldo Souza Júnior.

O especialista em contas públicas Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, considera que o “estudo é válido, pois oferece as primeiras estimativas sobre os efeitos da reforma, ainda que dependendo de diversos fatores econômicos e políticos”.

Limite

O economista Pedro Galdi, da Mirae Corretora, reitera que o Estado chegou ao limite de gastos com pessoal — já que a União compromete 22% da despesa primária com o funcionalismo, e os estados, 56,3% da despesa e 76,1% da receita corrente líquida”, segundo o Ipea. “Não acho que a previsão é de destruição de vagas. Trata-se de mudança necessária. Mas a reforma administrativa deve sair do Congresso desidratada, como aconteceu com a da Previdência”, assinalou Galdi.

Sandro Alex de Oliveira Cezar, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS) avaliou que o possível corte de 50% no pessoal de nível médio “vai transformar o governo em um prestador de serviço sem contato com o público”. Ele lembrou que o atendimento inicial da população, em hospitais, na Previdência e outros locais, é sempre feito por profissionais de nível médio.

O presidente da CNTSS criticou a nota técnica do Ipea. “São dados para corroborar as ideias do presidente da República e da equipe econômica. Mas preparamos uma campanha para mostrar à sociedade — e deixar que ela julgue — porque um salário de R$ 39 mil para a elite é pouco e porque tem que jogar a culpa do desajuste das contas no colo dos barnabés”, afirmou.

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Fim da estabilidade é risco, diz deputado 

Israel Medeiros 

15/09/2020

 

 

A reforma administrativa apresentada pelo governo pode acabar com a estabilidade de diversas áreas do funcionalismo. Diante disso, há quem defenda que a proposta tem potencial para piorar a qualidade do serviço público. É o caso do deputado federal Professor Israel (PV-DF). Em entrevista ao CB.Poder — parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília —, o parlamentar criticou a reforma e defendeu que a avaliação dos servidores seja feita de forma isenta.

“O servidor tem estabilidade para se manter imune a certas pressões, mas ao mesmo tempo, abre mão de ter um salário alto na iniciativa privada. Com a estabilidade, vai dedicar a vida ao serviço público, se especializar dentro da carreira e terá um limite de até onde pode subir. Esse é o preço da estabilidade”, argumentou.

Para ele, a proposta do governo desestrutura o Estado brasileiro. O deputado alegou que países como a Holanda adotaram medidas parecidas e decidiram voltar atrás. Segundo ele, não adianta economizar se os serviços públicos forem prejudicados.

De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a reforma administrativa pode economizar até R$ 816 bilhões em 10 anos. O deputado afirmou que vê a estimativa com naturalidade, pois uma reforma com foco em redução de custos deve atingir esse resultado.

Professor Israel disse considerar positiva a avaliação de servidores públicos, desde que feita de forma justa. Ele argumentou que a ineficiência no serviço público, em geral, é maior em cargos ocupados por indicação. “Servidor tem de ser avaliado sim, mas sem perseguição política. O governo faz um diagnóstico correto do problema, mas apresenta uma solução incorreta. A produtividade é pior nas prefeituras, por exemplo, onde o prefeito indica a maior parte dos cargos. Não é via concurso público”, disse.

*Estagiário sob a supervisão de Odail Figueiredo