O Estado de São Paulo, n.46278, 01/07/2020. Política, p.A6

 

Governador do Amazonas é alvo de operação da PF

Rayssa Motta

Paulo Roberto Netto

Fausto Macedo

01/07/2020

 

 

Ação que apura fraude na compra de respiradores faz buscas em endereços de Wilson Lima e prende secretária de Saúde

'Sangria'. Policiais federais cumprem mandados em Manaus

O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), foi alvo ontem da Operação Sangria, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal (MPF), que apura suspeita de desvios de recursos públicos destinados ao combate do novo coronavírus. Houve buscas na casa de Lima, na sede do governo e na Secretaria de Saúde do Estado.

A PF havia pedido a prisão do governador nesta investigação sobre suposta fraude na compra de respiradores para o Estado, mas a solicitação foi rejeitada pela Procuradoria-Geral da República e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que autorizou, neste momento, somente mandados de buscas.

Lima não estava em Manaus ontem. Segundo nota do governo estadual, ele estava em Brasília cumprindo agenda oficial.

A secretária estadual de Saúde, Simone Papaiz, foi presa na ação de ontem. A biomédica assumiu o cargo em abril, já durante a pandemia do novo coronavírus. Outros sete mandados de prisão foram cumpridos.

De acordo com os investigadores, foram identificados indícios de compras superfaturadas de respiradores, direcionamento na contratação de empresa, lavagem de dinheiro e montagem de processos para encobrir os crimes praticados "com a participação direta do governador", de outros agentes públicos e de empresários.

"Os fatos ilícitos investigados têm sido praticados sob o comando e orientação do governador do Estado do Amazonas, Wilson Lima, o qual detém o domínio completo e final não apenas dos atos relativos à aquisição de respiradores para enfrentamento da pandemia, mas também de todas as demais ações governamentais relacionadas à questão, no bojo das quais atos ilícitos têm sido praticados", disse a subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo no pedido das medidas cautelares.

A operação de ontem foi resultado de investigação conjunta com a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Receita Federal e mira a atuação de uma "organização criminosa", que, segundo o MPF, estaria desviando recursos voltados ao enfrentamento da covid-19. O Amazonas recebeu cerca de R$ 80 milhões repassados pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS) para aplicar no combate à doença.

'Triangulação'. Em um dos contratos investigados, há suspeita de superfaturamento de, pelo menos, R$ 496 mil. Além disso, respiradores teriam sido adquiridos por valor superior ao maior preço praticado no País durante a pandemia, com diferença de 133%. Investigadores também destacaram que o governo do Estado comprou, com dispensa de licitação, 28 respiradores de uma importadora de vinhos.

Uma empresa fornecedora de equipamentos de saúde, que já havia firmado contratos com o governo do Amazonas, vendeu respiradores à adega por R$ 2,5 milhões. No mesmo dia, a importadora de vinhos revendeu os equipamentos ao Amazonas por R$ 2,9 milhões. Após receber os valores, segundo o MP, a adega repassou o montante integralmente à organização.

A Sangria apura crimes de peculato, delitos da lei de licitações, organização criminosa, lavagem de dinheiro e crimes contra o sistema financeiro. O ministro do STJ Francisco Falcão, que determinou as medidas da operação de ontem, ordenou ainda o bloqueio de bens no valor R$ 2,9 milhões, de 13 pessoas físicas e jurídicas.

Óbitos. O Amazonas soma até agora mais de 69 mil casos confirmados do novo coronavírus e 2.782 óbitos, segundo a Secretaria de Saúde. Lima é o terceiro governador investigado por supostas irregularidades em contratações para o enfrentamento da pandemia .

Em nota, o governo do Amazonas afirmou ontem que aguarda "o desenrolar e informações mais detalhadas" da operação para se pronunciar.

PARA LEMBRAR

Apurações em outros Estados

Wilson Lima, do Amazonas, foi o terceiro governador a se tornar alvo de investigação por suspeita de desvios em meio à pandemia do novo coronavírus.

Em maio, na Operação Placebo, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão no Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador Wilson Witzel (PSC). Segundo a PF, um organização social contratada para fornecer o material necessário para o funcionamento de hospitais de campanha superfaturou o valor dos insumos.

Em junho, outra operação, a Para Bellum, realizou buscas na residência do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB). A operação investiga suposta fraude na compra de respiradores pulmonares para o Estado.