Correio braziliense, n. 20936, 18/09/2020. Mundo, p. 12

 

Brasileiro deixa comando da CIDH

18/09/2020

 

 

Em uma carta pública de três páginas, o mineiro Paulo Abrão despediu-se do cargo de secretário executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), ligada à Organização dos Estados Americanos (OEA), depois que o secretário-geral, Luis Almagro, recusou-se a renovar o mandato do brasileiro. “Eu me despeço com o sentimento de ter cumprido uma missão importante nestes últimos quatro anos, sob a orientação da CIDH, e com o meu compromisso com as vítimas (de violações), além de ter reposicionado institucionalmente a comissão para redirecionar a atenção hemisférica na proteção aos direitos humanos de todas as pessoas das Américas”, afirmou. A OEA teria recebido “dezenas” de denúncias funcionais contra Abrão, que ocupava o cargo desde 27 de julho de 2016 e pleiteava novo mandato para o período 2020-2024. Ontem, a CIDH anunciou que elegerá um novo secretário executivo.

“Minha trajetória pessoal e profissional de 25 anos enfocou-se na defesa dos direitos humanos das pessoas e na realização da justiça. Meu primeiro compromisso é com o direito fundamental de denunciar, por parte de todas aquelas pessoas que sentirem seus direitos afetados. Por isso, respeito profundamente os denunciantes contra minha gestão”, escreveu Abrão. “Se os processos não se cumprem de acordo com a normativa e ante a  autoridade competente, existe o risco de que as denúncias não sejam atendidas, em detrimento dos direitos das pessoas que as apresentaram. Isso é fundamental, sob risco de permitir a instrumentalização política da voz das vítimas e de gerar novas vítimas, cancelando a reparação, e impedindo-se a aprendizagem institucional e a não repetição”, acrescentou. Abrão também sublinhou que, “historicamente, sempre existiram pressões e interesses muito poderosos contra uma CIDH ativa, mais forte e eficiente”.

Em 25 de agosto passado, 10 dias após o término do mandato de Abrão, Almagro disse que não prorrogaria o contrato “devido à existência de dezenas de denúncias de natureza funcional” movidas contra o funcionário, e lamentou a “falta de tramitação” destas queixas como um “duro golpe” para a credibilidade da CIDH.

A Comissão informou que, em 25 de setembro, abrirá o processo de contestação para ocupação de sua secretaria executiva, em comunicado no qual reafirmou a importância de sua “autonomia e independência”, agradeceu e reconheceu “altamente” a gestão de Abrão. Também ontem, a CIDH — que considerou a decisão de Almagro um “ataque sério” — anunciou que buscou, nos últimos dias, “um diálogo institucional respeitoso” para superar esse atrito, apontando para a defesa da eleição de Abrão e do “devido processo” para o tratamento das reclamações dos funcionários.