Título: Pânico na capital
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Fonte: Correio Braziliense, 21/02/2013, Cidades, p. 25

Em pouco mais de 15 horas, bandidos praticam sequestros relâmpagos no Sudoeste, em Águas Claras e em Taguatinga. Série de crimes antecipa operação especial da Secretaria de Segurança Pública

Bastaram 15 horas e 40 minutos entre a noite de terça-feira e o início da tarde de ontem para que homens armados fizessem três sequestros relâmpagos em várias cidades do Distrito Federal. O mais recente aconteceu no horário do almoço em uma quadra residencial do Sudoeste. Três homens abordaram uma fisioterapeuta enquanto ela entrava no carro. Na noite anterior, um homem, de 53 anos, acabou torturado por sequestradores ao levá-lo de uma faculdade, em Taguatinga. A Secretaria de Segurança Pública não fechou o balanço das ocorrências do crime em fevereiro. Em janeiro, houve 65 casos, mais de dois por dia.

A violência em série provocou a antecipação de ação organizada pela Secretaria de Segurança Pública. Ontem, policiais militares de diversas unidades se concentraram no Plano Piloto para combater a criminalidade em ascensão na região. Oficialmente, a Operação Asas será lançada hoje (leia mais na página 26).

A fisioterapeuta, de 27 anos, entrava no veículo, um Renault Clio, para ir trabalhar, às 12h40, quando três homens, sendo pelo menos um adolescente, a abordaram ainda no estacionamento da Quadra 104 do Sudoeste. O prédio fica ao lado do Batalhão de Policiamento de Trânsito da PM (BPTran). Segundo testemunhas, os suspeitos estavam sentados em uma mureta no prédio da frente e correram em direção à moça. A ação aconteceu diante da portaria do bloco onde a vítima mora. As câmeras de segurança do condomínio mostram o momento em que os homens forçaram a entrada da jovem no veículo e a obrigaram a passar para o banco traseiro.O adolescente, de 15 anos, não conseguiu entrar no automóvel e acabou deixado para trás pelos comparsas, que saíram da quadra em alta velocidade. O zelador do edifício testemunhou o crime e seguiu o garoto a pé, sem chamar a atenção. Ele andou até o comércio da Quadra 303 e procurou quem pudesse ajudá-lo a evitar que o suspeito fugisse. A tarefa ficou por conta do professor de artes marciais Guilherme Soares, 24 anos. “Saí correndo atrás dele. Ele tentou resistir, mas consegui imobilizá-lo até a polícia chegar”, contou o rapaz.

A confusão atraiu a atenção de clientes de restaurantes próximos ao local onde o menor foi apreendido. A família almoçava em casa e comemorava o aniversário de 53 anos da mãe da vítima, quando foi avisada do sequestro. Muito nervosa, uma das irmãs circulou por bancos no Sudoeste em busca da fisioterapeuta. Momentos depois, foi avisada de que um dos envolvidos tinha sido apreendido. “Eu só pensava no pior. Não acreditava que aquilo estava acontecendo com a gente, naquele horário”, desabafou.

Minutos após a localização do adolescente, a família recebeu uma ligação da mulher sequestrada, que havia sido deixada pelos sequestradores na Cidade do Automóvel, na Estrutural. Os suspeitos fugiram com o carro. Os policiais fizeram o adolescente telefonar para os comparsas no intuito de descobrir o paradeiro deles, mas ninguém havia sido preso até o fechamento desta edição.

A investigação do caso teve início na 3ª Delegacia de Polícia (Cruzeiro), mas acabou encaminhado à Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA). A delegada adjunta da unidade especializada, Viviane Bonato, informou que o acusado mora no Riacho Fundo e não tinha passagem pela polícia. Ele se recusou a prestar mais esclarecimentos sobre os outros dois envolvidos no crime. Apesar de o zelador relatar ter visto um dos envolvidos com uma arma, a polícia não confirmou a informação. Também não se sabe a idade dos comparsas.

Tortura Os outros dois casos registrados aconteceram em um intervalo de cerca de três horas, em Taguatinga Norte e em Águas Claras, na noite de terça-feira. No estacionamento de uma faculdade na Avenida Samdu Norte, um administrador, de 53 anos, acabou rendido por três homens armados, espancado e obrigado a seguir até a casa dele, em Sobradinho. “Disseram que sabiam que eu tinha R$ 10 mil. Bateram-me muito”, disse (leia Depoimento). A segunda ocorrência teve início na altura de Águas Claras. Dois amigos conversavam em um posto de gasolina, na Estrada Parque Núcleo Bandeirante, quando uma dupla armada os obrigou a entrar no veículo. Eles rodaram por 20 minutos, e as vítimas foram liberadas em frente ao Shopping Casa Park, na Estrada Parque Indústria e Abastecimento (Epia). O caso é investigado pela 21ª DP (Taguatinga Sul) e ninguém foi preso.

Na tarde de ontem, o clima de insegurança também atingiu a Asa Norte. Na 704, dois homens aproveitaram o momento em que duas moradoras abriam o portão eletrônico da garagem do prédio para rendê-las. Eles fugiram com o veículo roubado, mas, na altura da 706 Norte, bateram no carro de um policial militar e em uma placa de sinalização. Mesmo assim, conseguiram fugir em um táxi. A 2ª DP (Asa Norte) apura o episódio e usará as imagens do prédio para tentar identificar os criminosos.

Participaram da cobertura Kelly Almeida, Ariadne Sakkis, Isabela de Oliveira, Thaís Paranhos, Ana Pompeu e Mara Puljiz, Renato Alves e Amanda Maiah

Depoimento “Eles me bateram muito”

“Fui abordado em Taguatinga, no estacionamento da faculdade onde trabalho. Três caras rodaram comigo pela cidade, mas havia um carro atrás que nos seguiu o tempo todo. Eles disseram que sabiam que eu tinha R$ 10 mil. Bateram-me muito, me deram diversas coronhadas na cabeça. Eu fiquei cansando de apanhar e acabei falando que o dinheiro estava na chácara onde moro, em Sobradinho. Chegando lá, me bateram mais ainda. Ficaram mais violentos por não acharem o dinheiro e levaram os meus bens. Televisões de 50 e de 22 polegadas, DVD, home theater, uma moto, de R$ 27 mil, e o meu carro, de R$ 40 mil. Eles foram muito violentos, e eu acredito que não sejam menores de idade. Moro sozinho, então, ninguém pode me ajudar. Eles me amordaçaram, amarraram os meus pés e as mãos, colocaram um plástico no meu nariz, me bateram muito, sempre com a arma na cabeça. Depois, jogaram óleo em mim e ameaçaram atear fogo, porque, segundo eles, eu havia mentido sobre o dinheiro. Acabaram me trancando em um quarto e fugiram. Quando percebi que não havia ninguém, livrei as mãos e os pés e consegui abrir a porta com um pedaço de ferro. Chamei o caseiro, e fomos direto para a delegacia.”

Administrador, 53 anos, morador de Sobradinho

Linha do tempo

19 de fevereiro 21h — Um administrador é sequestrado na Avenida Samdu Norte, em Taguatinga, por três homens. Os criminosos foram até a casa da vítima, em Sobradinho, e a torturaram por mais de duas horas. Fugiram com o que conseguiram da casa, além do carro e de uma motocicleta.

23h40 — Casal de amigos é levado por dois sequestradores em um posto de combustíveis, na Estrada Parque Núcleo Bandeirante (EPNB). São liberados cerca de 20 minutos depois na Estrada Parque Indústria e Abastecimento (Epia). Os assaltantes fugiram com o Corsa das vítimas.

20 de fevereiro 12h40 — Uma fisioterapeuta, de 27 anos, é sequestrada por três bandidos, entre eles um adolescente, na Quadra 104 do Sudoeste. A vítima acabou abandonada na Cidade do Automóvel minutos depois. Um dos adolescentes foi apreendido pelo zelador do edifício e por um professor de artes marciais.