Título: Um tormento para Dilma
Autor: Hessel, Rosana
Fonte: Correio Braziliense, 20/02/2013, Economia, p. 11

Portuários decidem interromper as atividades na sexta-feira e ameaçam decretar greve geral se o Planalto não alterar as regras de contratação de mão de obra previstas na MP dos Portos

Os trabalhadores portuários prometem atormentar a presidente Dilma Rousseff nos próximos dias. Em protesto contra a Medida Provisória 595, a MP dos Portos, que cria novas regras para o setor e flexibiliza a contratação de mão de obra, sindicatos de trabalhadores articulam uma paralisação nacional no momento em que começa o escoamento da produção brasileira de grãos para o exterior. Reunidos ontem em Brasília, sindicalistas decidiram suspender o trabalho das 13h às 17h da próxima sexta-feira e fazer manifestação semelhante no dia 26, no mesmo horário.

“Uma greve nesse período de safra será o inferno de Dilma”, afirmou ao Correio o deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, presidente da Força Sindical, entidade que representa os trabalhadores avulsos nos portos. No encontro, ele propôs uma paralisação nacional a partir de 21 de março. Até lá, sugeriu, os portuários deverão fazer uma série de manifestações pelo país, como a que aconteceu anteontem no Porto de Santos (SP), onde um grupo de 60 trabalhadores invadiu o navio chinês Zhen Hua 10, que descarregava cortêineres no terminal privado da Embraport, empresa controlada pelo grupo Odebrecht, pela trader Coimex e pela DP World, dos Emirados Árabes.

A invasão aconteceu no mesmo dia em que o governo anunciou a lista de 159 áreas portuárias que deverão ser privatizadas — das quais 42 serão terminais novos. O primeiro bloco será concedido até junho e terá, no mínimo, 10 áreas nos portos de Santos e de Belém. O embate entre governo e trabalhadores portuários será tenso nos próximos meses, já que a MP precisa ser aprovada pelo Congresso até 16 de maio para não perder validade. Nenhum dos lados promete ceder.

A MP dos Portos traz duas mudanças consideradas mais polêmicas. A primeira permitirá aos novos operadores privados operar carga própria e de terceiros, elevando a concorrência nos portos, atualmente dominados por quatro grupos. A segunda permite às empresas contratar trabalhadores sem passar pelos órgãos gestores de mão de obra (ogmos), que hoje controlam a escala nas operações de carga e descarga dos navios.

“A questão da mão de obra é inegociável”, disse Paulinho. “Não vamos permitir dois regimes de contratação de trabalhadores nos portos. Se o governo não alterar a MP, conviverá com uma greve por tempo indeterminado.” Segundo ele, 80 mil trabalhadores em todo o país poderão cruzar os braços.

Amigos De acordo com o governo e empresários que apoiam a MP, grupos que controlam os terminais privados desde a década de 1990, como o Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, estão insuflando os trabalhadores para minar a concorrência que será criada com a privatização. Já o deputado Paulinho afirma que o governo está defendendo os “amigos do rei”, citando nominalmente o grupo Odebrecht e os empresários Eike Batista e Gilberto Miranda, este último proprietário de uma ilha em Santos e acusado de participar de esquema de corrupção desbaratado pela operação Porto Seguro da Polícia Federal.

Pacote a hidrovias Depois de lançar planos de investimentos para rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, o governo federal prepara pacote semelhante para as hidrovias. A ideia é chamar a iniciativa privada para aplicar na modernização do modal. O primeiro passo foi dado ontem, com o lançamento do Plano Nacional de Integração Hidroviária, em Brasília. “Tanto a classe política quanto a empresarial demandam por isso”, afirmou o superintendente de Navegação Interior da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Adalberto Tokarski.