Título: Silêncio em Caracas
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 20/02/2013, Mundo, p. 14

O suposto retorno do presidente venezuelano, Hugo Chávez, parece longe de apaziguar os ânimos em Caracas e de arrefecer as dúvidas sobre seu estado de saúde. O círculo de poder bolivariano mantém hermetismo absoluto em torno do mandatário, que estaria internado no Hospital Militar Dr. Carlos Arvelo. Os 32 juízes do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) estão de prontidão para dar posse a Chávez a um novo mandato. Em entrevista ao jornal El Nacional, o advogado Víctor Mendible admitiu o potencial polêmico do ato. “A Carta Magna não assinala que (a posse) deve ser um ato público. Assim, se disserem que Chávez jurou, teremos que crer nisso”, comentou.

Sob condição de anonimato, uma fonte diplomática venezuelana disse ao Correio que as autoridades não descartam a entrega da Presidência por parte de Chávez. “A renúncia está sendo avaliada. O governo leva em conta o papel do vice, Nicolás Maduro, peça importante no desenho político”, explicou. De acordo com ela, Chávez ainda corre risco de morte. “O câncer não se disseminou, mas há perigos para saúde de Chávez, caso a doença progrida no ritmo atual.”

O cientista político Tony De Viveiros, professor da Universidad Simón Bolívar, compara a situação de Chávez a um paradoxo da física chamado de “O gato de Schrödinger”. “Foi um experimento criado por Erwin Schrödinger, que ilustra muito bem a situação de incerteza em meu país. Dentro de uma caixa lacrada, ele colocou um gato e o expôs a um veneno durante um tempo aleatório. Quem observa o teste considera que o animal está, ao mesmo tempo, vivo e morto, porque não se sabe se o mecanismo que o envenena foi ativado ou não. O único modo de sabê-lo é abrir a caixa”, disse.

De Viveiros defende que a posse de Chávez seja um ato público. “Se ela for feita em privado, isso lançará mais lenha à fogueira de incertezas, pois reforçaria as dúvidas em torno da saúde do presidente”, alerta. Na opinião dele, o suposto retorno do presidente em nada mudou o cenário político venezuelano. “Se nas fileiras do oficialismo, o anúncio do retorno de Chávez foi celebrado, entre a oposição, os questionamentos permanecem.”

Para o analista político Pedro Mario Burelli, ex-diretor da estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA), as lideranças chavistas farão de tudo para manter o véu de mistério. “Dizem que a doença (de Chávez) é câncer, mas a causa da morte poderia acabar sendo sua paranoia, como têm dito em privado alguns de seus colegas chefes de Estado. Se ele tomar posse, sem registro de vídeo, de áudio ou de foto, os rumores e a incerteza aumentarão”, alertou. “O tratamento dispensado à saúde de Chávez e a fórmula absurda com que se justificou o fato de não ter tomado posse para o novo mandato — a um imenso custo financeiro para país — demonstram que estamos numa democracia precária.”

Líderes rendem homenagens O presidente da Bolívia, Evo Morales, desembarcou às 10h30 (12h em Brasília) de ontem em Caracas, na expectativa de ver Chávez. O mandatário participou de uma reunião entre o vice venezuelano, Nicolás Maduro, e governadores bolivarianos. Até o fechamento desta edição, não havia a confirmação de que a visita de fato ocorrera. Por sua vez, o presidente do Peru, Ollanta Humala, celebrou o retorno de Chávez. “Saudamos que o presidente Chávez tenha voltado à Venezuela”, declarou. “Fazemos votos para o rápido restabelecimento da saúde do presidente Chávez, para que possa retomar o governo de seu povo”, acrescentou Humala, de 50 anos, tenente-coronel reformado — assim como o venezuelano.