O globo, n. 31798, 28/08/2020. Sociedade, p. 11

 

Cientistas investigam "reaparecimento" da Covid

Ana Lucia Azevedo

28/08/2020

 

 

Casos de pacientes cujos exames deram positivo duas vezes com meses de diferença intrigam cientistas; no Rio, pesquisadores estudam dois indivíduos para saber se foram reinfectados ou se O vírus persistiu em seu organismo

 Casos de pessoas que positivam duas vezes para o coronavírus podem ser mais comuns do que se imagina. A ciência debate se eles são realmente uma reinfecção ou se o coronavírus jamais deixou a pessoa, isto é, uma persistência. Emblemáticos desse mistério são os casos de dois indivíduos do Rio de Janeiro. São dois supostos casos de reinfecção investigados por cientistas do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho (IBCCF/UFRJ) e que podem ajudara explicar como a pandemia se propaga.

A resposta para os casos do Rio está no genoma do vírus. Foi assim que pesquisadores de Hong Kong chegaram à conclusão que se tratava de uma provável reinfecção, e não de persistência, o caso do homem de 33 anos que contraiuo coronavírus, em março, quando teve um quadro leve de Covid-19, e depois em julho, quando não teve sintoma algum. O sequenciamento revelou que se tratava de linhagens distintas do Sars-CoV-2, sugestivo de reinfecção.

Linhagens são como populações de um vírus, que se formam a partir da disseminação dele por uma determinada região. O homem de Hong Kong tinha na primeira infecção uma linhagem predominante no Reino Unido. Na segunda, na Espanha. Assim, foi possível concluir que poderia ser uma reinfecção, já ques e tratava de linhagens diferentes.

A cientista Rosane Silva, do IBCCF, diz que no Brasil a investigação é mais complexa porque há uma linhagem“brasileira” do Sars-CoV-2, ques e tornou dominante, e pode ser muito difícil de distinguira reinfecção. O primeiro caso é o de uma pessoa de 30 anos que apresentou os sintomas em abril. Cerca de dois meses depois, os sintomas voltaram.

ASSINATURA GENÉTICA

O segundo casoéo deu min divíduo de 40 anos. Ele teve sintomas de Covid-19 no final de abril e novamente em julho. Os dois casos tiveram a infecção pelo coronavírus comprovada por RT-PCR (molecular) em todas as ocasiões.

—Estamos analisando a assinatura genética do vírus para saber se foi um caso de persistência ou realmente uma reinfecção — afirma Rosane Silva, chefe do Laboratório de Metabolismo Macromolecular e especialista em diversidade genética de vírus.

No Brasil, a linhagem B.1.1.33docoron aví ru sé a mais frequentemente encontrada, detectada em cerca de 53% dos genomas já sequenciados no país. Em segundo lugar, está a linhagem B.1.1.28, considerada uma “linhagem brasileira” (presente em 22% dos genomas brasileiros). Todo o problema é que elas são consideravelmente semelhantes.

Porém, se houver no segundo episódio de positivação pelo coronavírus uma diferença significativa, pode representar uma reinfecção.

Ela acrescenta que o Brasil testou muito pouco com PCR, somente em estudos pontuais e, por isso, é difícil conhecer o perfil da propagação do coronavírus em nossa população.

As cientistas analisam ainda outros genomas de SarsCoV-2 extraídos de amostras de familiares e contatos próximos dos indivíduos. Também integrante do estudo, a professora de virologia Clarissa Damaso, chefe do Laboratório de Biologia Molecular de Vírus do IBCCF/UFRJ, acrescenta que os primeiros 17 genomas foram sequenciados, montados e depositados em bancos de genes internacionais, acessíveis à comunidade científica.

Ela salienta que tanto persistência quanto reinfecção não são inesperadas pelos virologistas porque vírus respiratórios fazem reinfecção frequentemente, isso é comum.

Costumamos não perceber porque, até a pandemia de coronavírus, não se dava muita atenção a casos brandos de infecções respiratórias. Mas reinfecções acontecem com os outros coronavírus e vírus de resfriado comum.

Porém, é importante estudar os casos de suspeita de reinfecção de Sars-CoV-2 para compreender como ele se comporta. Damaso enfatiza que não é para se pensar que não nos livraremos nunca de uma ameaça grave:

— Pode ser que não nos livremos do Sars-CoV-2, mas que ele fique na população como os demais coronavírus de resfriado, mais brando.

Ela observa que esses casos não têm correlação clínica sobre gravidade da Covid-19. Não é possível fazer qualquer relação de causa e efeito sobre a evolução dado ença.Oestudoé importante para investigar os mecanismos de propagação da epidemia, já que pessoas assintomáticas, mas infectadas podem continuara transmitir o Sars-CoV-2.

A ciência ainda não conhece todos os lugares onde o coronavírus pode se alojar no organismo humano. Por isso, os cientistas consideram que a persistência podes ermais comum doque a reinfecção. Além disso, Damaso explica ser mais provável que os casos das mulheres sejam uma persistência e não uma reinfecção devido ao tempo transcorrido entre os episódios, que deveria ser mais longo no caso da segunda hipótese.

O Sars-CoV-2 poderia persistir e reemergir em algumas pessoas. Outros vírus fazem isso, como o do HPV, principal causa de câncer doco lodo útero eque pode permanecer por 20 anos no organismo.

A virologista Luciana Costa, diretora adjunta do Instituto de Microbiologia da UFRJ, cultiva vírus isolados das duas mulheres e de alguns de seus contatos. Com isso, espera descobrir o quão infeciosos eles podem ser.

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Média móvel de mortes no Brasil cai para 900

Evelin Azevedo

28/08/2020

 

 

Apesar da queda, país segue com tendência de estabilidade nos óbitos causados pela Covid-19

 O Brasil registrou ontem uma média móvel de 900 mortes por Covid-19, a menor desde o dia 22 de maio, quando o cálculo apontou que 883 pessoas haviam morrido em média naquela semana. Apesar da queda, o país segue com tendência de estabilidade nos óbitos causados pelo novo coronavírus.

Ontem, o Brasil ultrapassou a marca de 118 mil mortes por Covid-19. Nas últimas 24 horas foram registrados 970 novos óbitos, elevando para 118.726 o total de vidas perdidas para o novo coronavírus. Foram contabilizados também 42.489 novos casos do coronavírus, totalizando 3.764.493 infectados no país.

As informações são do consórcio de veículos de imprensa formado por O GLOBO, Extra, G1, Folha de S.Paulo, UOL e O Estado de S. Paulo, que reúne dados das secretarias estaduais de Saúde.

Com seis meses de epidemia, o país tem um cenário de persistência da doença. A partir da data da primeira morte notificada no Brasil, em 80 dias a média de óbitos diários subiu de um para mil. Agora, já se passaram outros 80 dias neste platô, no qual cerca de mil mortes são registradas diariamente, considerada uma oscilação de 10%.

A média móvel de sete dias faz uma média entre o número de mortes do dia e dos seis anteriores. Ela é comparada com a média de duas semanas atrás para indicar se há tendência de alta, estabilidade ou queda. O cálculo é um recurso estatístico para conseguir enxergar a tendência dos dados abafando o “ruído” causado pelos finais de semana, quando a notificação de mortes se reduz por escassez de funcionários em plantão.

CENÁRIOS ESTADUAIS

Em 4 de junho, o Brasil ultrapassou pela primeira vez a média móvel de mil mortes em decorrência da Covid-19, com 1.041 óbitos. O cálculo recorde foi observado em 25 de julho, quando foi computada uma média de 1.097 pessoas mortas na semana. No entanto, desde o dia 12 de agosto o país apresenta uma média móvel de mortes inferior a mil.

O país tem 13 estados com tendência de queda nas médias móveis de morte por Covid-19: Acre, Alagoas, Amazonas, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Paraná, Pernambuco, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe.

O Distrito Federal e outras nove unidades federativas estão com tendência de estabilidade: Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sull e Rondônia.

Há ainda quatro estados em alta: Amapá, Bahia, Rio de Janeiro e Tocantins.