O Estado de São Paulo, n.46281, 04/07/2020. Internacional, p.A14

 

Trump promove festa da independência dos EUA em meio a recorde de casos

04/07/2020

 

 

Em campanha, presidente reúne milhares para celebrações no Monte Rushmore e em Washington, ao mesmo tempo em que país tem mais de 55 mil novos casos por dia; 11 Estados chegam ao feriado do 4 de Julho com maior número de notificações desde o início da pandemia

Caubóis. Apoiadores do presidente Trump chegam para festa no Monte Rushmore

Donald Trump iniciou ontem as comemorações do dia da independência com um foguetório em Monte Rushmore, diante das efígies de expresidentes esculpidas na rocha, e promove hoje uma festa para milhares de pessoas em Washington. A celebração do feriado de 4 de Julho, porém, ocorre no momento em que os EUA registram recorde de novos casos de covid-19 e governadores e prefeitos impõem restrições de movimento.

Ontem, os EUA bateram mais um recorde em número de novas notificações de coronavírus: em 24 horas, foram mais de 55 mil infectados. Juntos, Arizona, Califórnia, Florida e Texas são responsáveis por quase 30 mil novas contaminações por dia. Ao todo, segundo o Washington Post, 11 Estados entram no feriado deste fim de semana com recorde diário de infecções.

Em 40 dos 50 Estados americanos, a curva de novos casos cresce, em vez de diminuir, de acordo com levantamento do New York Times. Nas últimas duas semanas, o total de novas contaminações cresceu 90%. O governo americano garante que o avanço da pandemia é causado pelo aumento no número de testes e indica como razão do otimismo a taxa de mortalidade, que vem se mantendo estável.

Especialistas, no entanto, dizem que, apesar do aumento no número de testes, a quantidade proporcional de resultados positivos para covid-19 vem crescendo. No Texas, por exemplo, a positividade aumentou de 5% para cerca de 15% em uma semana. Outra preocupação é com o aumento no índice de internações, que cresce rapidamente em vários Estados e coloca em risco a capacidade dos hospitais.

Ontem, o vice-almirante Jerome Adams, espécie de conselheiro da presidência para assuntos de saúde pública, explicou que o número de mortes é menor, possivelmente porque a faixa etária dos infectados caiu. Se no início da pandemia a maioria dos contaminados tinha mais de 60 anos, agora eles têm em média 35 anos – e correm menos risco.

"Mas é preciso cautela", disse Adams ao programa Fox & Friends, um dos favoritos de Trump. "Sabemos que as mortes ocorrem duas semanas depois do aumento das contaminações." Além disso, a preocupação, segundo ele, é que esses jovens sirvam de vetor para contaminar os pais ou os avós.

A celebração de ontem, no Monte Rushmore, organizada para 7,5 mil pessoas, não seguiu os protocolos de distanciamento social e não foi obrigatório o uso de máscara. A epidemiologista Celine Gounder qualificou as comemorações do feriado como "irresponsáveis". "Trump parece o líder de um culto que pede que seus seguidores pulem de um abismo, enquanto ele usa uma rede de proteção. Ele e todos ao seu redor são testados todos os dias", disse Gounder.

Hoje, Trump e a primeira-dama Melania promovem uma festa batizada de "Saudação à América", diante da Casa Branca, para milhares de pessoas. A organização pretende distribuir 300 mil máscaras – embora não esteja claro se o uso será obrigatório. Os organizadores prometeram uma queima de fogos de artifício e acrobacias aéreas dos esquadrões Blue Angels e Thunderbirds.

Além do risco de contaminações, autoridades locais também estão de olho em manifestações em Washington – há mais de 20 marcadas para hoje na capital, incluindo uma marcha do movimento Black Lives Matter. Apesar do bloqueio de ruas e do forte esquema de segurança, o risco de confronto é alto. / NYT, WP e REUTERS

Crítica

"Trump parece o líder de um culto que pede que seus seguidores pulem de um abismo, enquanto ele usa uma rede de proteção"

Celine Gounder

EPIDEMIOLOGISTA