O Estado de São Paulo, n.46282, 05/07/2020. Metrópole, p.A14

 

Infecções aumentam em pelo menos 12 capitais que fizeram reabertura

Felipe Resk

Marco Antônio Carvalho

05/07/2020

 

 

Com avanço da pandemia e aumento da pressão no sistema de saúde, cidades recuam em flexibilização e adotam medidas restritivas. Secretaria de Belo Horizonte diz que cidade terá de conviver com abre-e-fecha. Em Brasília, quantidade de novos infectados quintuplicou

O número de casos de covid19 subiu em ao menos 12 capitais brasileiras que deram início ao processo de retomada das atividades econômicas. Com o avanço da pandemia e consequentemente o aumento da pressão sobre o sistema de saúde, algumas cidades já decidiram, nos últimos dias, recuar da flexibilização e adotar medidas mais restritivas contra o coronavírus.

Para fazer a análise, o Estadão levantou quantos casos foram registrados diariamente pelas capitais desde o início da pandemia, em março, com base em informações reunidas pela plataforma colaborativa Brasil.io. A reportagem comparou a média do fim de junho com a do momento em que a reabertura foi implementada em cada cidade, independentemente do grau de liberação, que varia de um local para outro.

O levantamento aponta que, após o retorno de atividades não essenciais, houve aumento da média de infectados por dia em São Paulo, Belo Horizonte e Vitória, no Sudeste. No Sul, as três capitais também estão com

mais casos: Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre. Outras cidades que sofreram alta foram Brasília, Campo Grande e Cuiabá, no Centro-Oeste, além de Salvador e João Pessoa, no Nordeste, e de Palmas, na Região Norte.

O aumento da covid-19 não é uniforme entre as capitais. Em São Paulo, cujo plano de reabertura gradual foi implementado pelo governador João Doria (PSDB) no início de junho, o número de casos diários subiu 15%, variação que não levou ao aumento das internações. Já em Brasília, onde o governador Ibaneis Rocha (MDB) reabriu o comércio no fim de maio, os casos quintuplicaram ao longo do mês passado.

Foram consideradas na análise 18 das 27 capitais brasileiras. Nos locais descartados, ou ainda não há plano de retomada dos setores econômicos ou as ações começaram há menos de duas semanas, tempo considerado necessário por especialistas para avaliar possíveis impactos das medidas.

Responsável por conduzir um estudo nacional sobre a propagação da doença, o epidemiologista Pedro Hallal, reitor da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), afirma que o avanço notado nas capitais "é muito natural". "A hora de flexibilizar é quando a curva estiver na descendente. Quando flexibiliza na ascendente, o problema cresce", explica. "Se a gente impedir o contato entre quem tem o vírus e quem está pronto para receber, conseguimos colocar a curva para baixo e assim dá para começar a reabrir."

Em Brasília, quando o comércio foi reaberto havia 300 casos diários. Um mês depois, a média está em 1,5 mil novos diagnósticos a cada 24 horas. Mesmo diante da guinada, Ibaneis afirmou nesta semana, ao Estadão, que as restrições "não servem mais para nada" e assinou decreto liberando totalmente o comércio, a indústria e o retorno às aulas presenciais.

Recuos. Outro episódio emblemático é o de Belo Horizonte, mas lá o prefeito Alexandre Kalil (PSD) optou por abrir mão da flexibilização e voltou a permitir apenas serviços essenciais. O recuo aconteceu após o número de casos diários saltar de 30, com isolamento social, para 150 com a reabertura em maio de shoppings populares, atividades varejistas e salões de beleza. Em Minas, a taxa de ocupação de UTI bateu em 88% na semana passada.

"Logo no início, a prefeitura rapidamente se articulou para fazer distanciamento social e a curva foi crescendo bem devagarinho. Veio a reabertura e vimos escalada da curva, com ocupação significativa da rede pública de saúde", diz a virologista Giliane de Souza Trindade, da Universidade Federal de Minas (UFMG). "Se não foi o relaxamento, o que mais poderia ter sido? O clima não mudou. A liberação é o único fator que destoa, não há outra explicação."

Recuo também foi adotado em Porto Alegre, onde os casos dispararam um mês depois da liberação de diversos estabelecimentos, de comércios a igrejas. Lá, a média, que era de cinco casos, hoje está em mais de cem novos por dia. Em um mês, o índice de internações em UTI cresceu 227% e atingiu o recorde de 141 pessoas internadas no início da semana passada.

Orientação

O controle de casos é o primeiro de seis critérios listados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para uma transição e manutenção de um estado de baixa transmissão.