O globo, n. 31811, 10/09/2020. País, p. 4

 

Horizonte reduzido

Aguirre Talento

Carolina Brígido

10/09/2020

 

 

PGR encurta duração da Lava-Jato, que pode acumular derrotas no STF

 A Procuradoria-Geral da República prorrogou a força-tarefa de Curitiba até 31 de janeiro de 2021, oito meses amenos que a extensão feita antes. Em outro movimento que aumentaria a pressão sobre a operação, o ministro Dias T off o li, do STF, pode ir para a Segunda Turma, oque formaria maioria mais hostil à Lava-Jato.

Dois movimentos concomitantes podem reduzir as perspectivas da operação Lava-Jato nos próximos meses. O primeiro se trata da própria existência da força tarefa no modelo atual. Ontem, a Procuradoria-Geral da República (PGR) decidiu prorrogar apenas até o dia 31 de janeiro de 2021 a validade do grupo de procuradores em Curitiba.

Já no Supremo Tribunal Federal (STF), o fim do mandato do ministro Dias Toffoli na presidência, marcado em sessão plenária ontem, pode disparar uma articulação para que ele ocupe, a partir de novembro, uma vaga na Segunda Turma do tribunal, o que formaria, no colegiado que julga os processos da operação, uma maioria de ministros que costumam dar decisões contrárias à Lava-Jato.

Com prazo de existência a ser vencido hoje, a Lava-Jato de Curitiba requereu à PGR sua extensão por um ano. Por liminar, a subprocuradorageral Maria Caetana, do Conselho Superior do Ministério Público, concedeu o prazo pedido, mas agora a equipe de Augusto Aras, a quem cabe a decisão final, determinou que a força-tarefa vá apenas até janeiro.

No Supremo, cresce a pressão para que Toffoli vá para a Segunda Turma em novembro, quando Celso de Mello se aposentará. A movimentação formaria uma maioria que tenderá a ser mais hostil às ações da Lava-Jato.

A decisão sobre a prorrogação da força-tarefa de Curitiba foi tomada pelo procurador Humberto Jacques de Medeiros, número dois da gestão de Aras. Ele frisou a necessidade de o Conselho Superior discutir uma estrutura permanente para as forças-tarefas. Atualmente, o órgão debate um projeto para a criação de uma Unidade Nacional Anticorrupção (Unac), que absorveria a Lava-Jato dos estados em um grupo único de apoio a grandes investigações, vinculado à PGR.

Apesar do tempo menor, a decisão de prorrogação foi bem recebida por integrantes da força-tarefa de Curitiba, que viram uma sinalização positiva da PGR em meio a sucessivos embates com as forças-tarefas. Em nota, os integrantes do grupo afirmaram que a decisão “vai ao encontro do interesse público, pois permitirá que resultados significativos sejam obtidos em prol da sociedade brasileira”. Um dos desafios do novo coordenador do grupo, Alessandro Oliveira, é estabelecer uma relação mais cordial com Aras, que viveu atritos recentes com Deltan Dallagnol, antigo chefe do grupo.

Jacques apontou no despacho que as forças-tarefas consomem recursos do Ministério Público Federal (MPF) de forma desiguale provocam uma“desigualdade detratamento”entre suas unidades. O vice-procurador-geral da República citou que as unidades responsáveis por cederem procuradores ao grupo de Curitiba fizeram reclamações sobre essa cessão. Aforça-tarefa tem 14 procuradores, 11 com dedicação exclusiva.

FUX ASSUME PRESIDÊNCIA

No STF, a troca de comando hoje, coma posse de Luiz Fux na presidência no lugar de Toffoli, aumenta apressão sobre a operação. Toffoli ocupará a vaga de Fux na Primeira Turma. Mas, nos bastidores do STF, trava-se uma batalha pela transferência dele para a Segunda Turma, a que analisa processos relativos à Lava-Jato. Ontem, no discurso de despedida, Toffoli fez elogiosa Aras:

— Vossa excelência tem virtudes que suplantam a vaidade pessoal.

A Segunda Turma é majoritariamente garantista — ou seja, prioriza os direitos dos réus, como o de aguardar em liberdade por mais tempo, por exemplo. Coma aposentadoria de Celso de Mel loem novembro, seria aberta uma vaga. Em tese, acadeira será ocupada pelo ministro que o presidente Jair Bolsonaro indicar, que pode ser da corrente puniti vista, mais rígida em termos penais.

Atá ticados garantista sé convencer Toffoli a pedir para trocar de turma assim que Celso de Mello se aposentar. Com isso, a Segunda Turma continuaria com perfil garantista, já que Toffoli é adepto dessa corrente e formaria maioria com Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.

A interlocutores, porém, Toffoli disse que não quer mudar para a Segunda Turma. A ala garantista, no entanto, ainda não desistiu da tentativa de convencê-lo.

Recentemente, a turma deu decisões favoráveis aos réus. Na terça-feira, por exemplo, retirou o processo contra os ex senadores do MD B Valdir Raupp e Romero Jucá da 13ª V arade Curitiba, que conduza Lava-Jato, e o transferiu para a Justiça Federal em Brasília. Isso tem ocorrido por empates, porque Celso de Mello, cujos votos não são previsíveis, está de licença médica.

JULGAMENTOS QUE PODEM AFETAR A FORÇA-TAREFA NA GESTÃO FUX

Foro privilegiado

O STF restringiu em 2018 a regra do foro privilegiado apenas a casos em que o crime foi cometido durante o mandato, e em razão do cargo ocupado. Ainda há brechas, como os políticos que emendaram um mandato em outro diferente, caso de Flávio Bolsonaro.

Segunda Instância

No ano passado, o STF decidiu que condenados em segunda instância tinham o direito de aguardar mais tempo em liberdade. Na gestão Fux, dois ministros que votaram a favor dos réus, Celso de Mello e Marco Aurélio Mello, vão se aposentar, podendo haver revisão do tema .

Empate pró-réu

Em decisões recentes da Segunda Turma, o placar foi dois a dois, porque Celso de Mello está de licença médica. Nesses casos, aplicou-se a decisão mais favorável ao réu. A pedido de Edson Fachin, será analisada a aplicação dessa regra apenas a habeas corpus.