Título: Pinheiro assume a Comissão da Verdade
Autor: Luiz , Edson
Fonte: Correio Braziliense, 26/02/2013, Política, p. 4

A Comissão Nacional da Verdade fez ontem um balanço dos trabalhos desenvolvidos até o momento, em quase 10 meses de funcionamento. No encontro, que reuniu representantes de 30 colegiados das unidades da Federação, além de instituições públicas e organizações de classe, também foi apresentado oficialmente o novo coordenador do grupo, nomeado na semana passada: o professor Paulo Sérgio Pinheiro, ex-secretário de Direitos Humanos no governo Fernando Henrique Cardoso. Pinheiro deverá dar um tom mais discreto à comissão, seguindo o estilo adotado quando esteve no Executivo.

Assim como os dois antecessores — o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp e o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles —, Pinheiro é ligado à questão dos direitos humanos. Além de ter trabalhado na área, ele era integrante do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, onde foi professor titular. Ao contrário dos antecessores, Pinheiro é avesso a entrevistas, mantendo as aparições públicas às estritamente necessárias.

A discreta atuação do ex-ministro foi notada, por exemplo, durante a elaboração do primeiro Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), entre 1996 e 2002, quando ele relatou a proposta. No governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele foi o revisor do mesmo plano, que está em vigor desde 2009. Na Comissão Nacional da Verdade, pelo menos até 15 de maio, quando termina seu mandato como coordenador do colegiado, Pinheiro terá poucos temas espinhosos para resolver.

“Não dá para sermos como aquele que abre a porta da geladeira, vê a luz e começa a dar entrevista. Muitas vezes, o açodamento em divulgar um documento, um depoimento ou uma suspeita põe em terra o trabalho cuidadoso de investigação, de coleta de indícios e identificação de depoentes”, disse Pinheiro, durante o encontro de ontem. Segundo ele, uma das metas do colegiado será a questão dos mortos e desaparecidos durante a ditadura. Pelo menos 40 pessoas já foram ouvidas pela comissão desde maio do ano passado, incluindo agentes públicos que atuaram no regime militar e torturadores.

Resultados

No encontro de ontem, as comissões estaduais da verdade também mostraram os resultados dos trabalhos, divididos em três blocos. No primeiro, apresentado pela advogada Rosa Maria Cardoso, foi abordado o golpe de 1964. Em seguida foram discutidas as violações de direitos humanos no campo e em terras indígenas. Na última parte, a apresentação focou os crimes graves contra os direitos humanos. Segundo levantamentos da comissão, pelo menos 50 mil pessoas foram alvo da repressão durante a ditadura. Muitas delas chegaram a ser presas em navios e em estádios.

Cada um dos blocos foi dividido por temas apresentados pelos conselheiros que atuam em cada setor. O ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, por exemplo, fez um balanço sobre a ditadura e o sistema de Justiça, enquanto Fonteles apresentou seu trabalho em torno do Estado ditatorial-militar. O novo coordenador da Comissão Nacional da Verdade falou do papel das igrejas na durante ditadura.

Para saber mais

Foco em três eixos Criada em 2009, mas instalada apenas em maio do ano passado, a Comissão Nacional da Verdade tem como obrigação investigar as violações dos direitos humanos durante o regime militar e de outros governos ditatoriais em diferentes períodos.

Pelo menos três casos têm sido priorizados pela Comissão Nacional da Verdade: a questão da Guerrilha do Araguaia, no início da década de 1970; a localização dos chamados porões da ditadura; e a Operação Condor, que teria unido as ditaduras sul-americanas. No último caso, o colegiado analisa as características da morte dos ex-presidentes do Brasil João Goulart e Juscelino Kubitschek. “Alcançamos nove meses da nossa jornada e, apesar de muito trabalho já ter sido feito, temos ainda um longo caminho pela frente”, diz o coordenador da comissão, Paulo Sérgio Pinheiro.

Segundo Pinheiro, alguns órgãos públicos têm sido fundamentais para os trabalhos do grupo, como os ministérios da Educação, de Relações Exteriores e de Defesa, além de empresas estatais, como a Petrobras, e as próprias Forças Armadas. Ontem, o colegiado firmou três convênios — com a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), com a Associação Nacional de História e com os Conselhos dos Pós-Graduados em Direito. (EL)