O Estado de São Paulo, n.46286, 09/07/2020. Política, p.A14

 

Entrevista - Eduardo André Brandão: "Liberdade de expressão não pode ser usada para cometer crimes"

Eduardo André Brandão

Rayssa Motta

Fausto Macedo

09/07/2020

 

 

Presidente da Ajufe defende uso das redes sociais, mas se diz preocupado com ataques contra magistrados

Juízes Federais. Eduardo Brandão, presidente da Ajufe

 

Diante dos ataques recentes dirigidos ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Congresso, o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Eduardo André Brandão, afirma que as instituições democráticas são fortes para reagir e aplicar a reprimenda necessária. Para o magistrado, discursos inflamados e a polarização ideológica atrapalham o País, e defende que a liberdade de expressão não é salvo-conduto para ataques, ofensas e calúnias. Nessa entrevista ao Estadão, o juiz federal fez uma análise de dispositivos legais que, recentemente, têm suscitado discussão, como a prisão após condenação em segunda instância, a Lei Orgânica da Magistratura e a figura do Juiz de Garantias. A seguir os principais trechos da entrevista.

Quais são as prioridades da sua gestão?

Uma delas é resolver a situação remuneratória dos juízes e juízas federais que não podem ser tratados com desigualdade em comparação com outras carreiras jurídicas públicas. Também pretendemos atuar no Congresso para que projetos que inibam a atividade judicial não sejam aprovados, demonstrando a importância da independência judicial para qualquer democracia.

Os atos antidemocráticos o assustam? O sr teme a volta do AI-5?

Não vejo qualquer risco de volta do AI-5 ou da ditadura ao País. As instituições estão funcionando bem, às vezes com algum excesso de confrontos, mas nada que possa gerar uma maior preocupação. Meu receio é que vivemos na era do escândalo, das fake news, em que algumas pessoas acabam ultrapassando limites aceitáveis em uma democracia, apenas para escandalizar e serem notadas.

O STF tem sido alvo de ataques. Até onde vai a liberdade de expressão?

A liberdade de expressão deve ser preservada e protegida, porém, não pode ser utilizada para cometer crimes. Quem age movido com o desejo de atacar, ofender e caluniar, à margem da lei, deve ser investigado e punido, se necessário. Essas manifestações, com viés criminoso, são preocupantes pois demonstram que não há respeito aos magistrados e à independência judicial, e ainda tentam tratar toda decisão do Judiciário com objetivos políticos e isso está longe de ser a verdade.

O presidente deve ser enquadrado no inquérito que apura financiamento e organização de atos antidemocráticos?

Penso que não. Não consigo enxergar gesto explícito ou concreto dele nesse sentido.

A Lava Jato atravessa sua fase mais crítica. Qual a sua avaliação? Há razões para que a força tarefa seja mantida?

A Lava Jato é um divisor de águas na história recente do País. Ela é um sucesso no combate a corrupção e na recuperação de valores desviados dos cofres públicos. Contribuiu para modificar uma péssima cultura, até então reinante, de que os governos aplicavam mal os recursos públicos e todos conviviam naturalmente com essa prática danosa.

Como avalia casos de corrupção na magistratura?

A magistratura federal não coaduna com transgressões. São péssimos para a imagem da Justiça, principalmente num momento de tanta polarização e ataques constantes ao Judiciário.