O Estado de São Paulo, n.46288, 11/07/2020. Economia e Negócios, p.B1
Executivos brasileiros pressionam e Mourão muda tom sobre questão ambiental
Cristiane Barbieri
Clarice Couto
Mariana Durão
Daniel Weterman
Mônica Scaramuzzo
11/07/2020
Ponto de inflexão. Em encontro com empresários de grupos como Suzano, Shell, Natura e Itaú, vice-presidente assumiu compromissos; avaliação dos participantes do debate é de que governo entendeu sua responsabilidade no combate ao desmatamento da Amazônia
Outro dia. Na quinta-feira, reunido com investidores estrangeiros, Mourão disse que os interesses deles eram comerciais
A reunião de um grupo de oito empresários brasileiros com o vice-presidente Hamilton Mourão terminou num tom diferente do encontro realizado na quinta-feira com investidores estrangeiros. Há dois dias, o governo basicamente tentou se esquivar das responsabilidades sobre o aumento do desmatamento na Amazônia. Mas, ontem, sob a pressão de executivos de grupos como Suzano, Shell, Natura e Itaú, acabou assumindo alguns compromissos.
"Hoje (ontem), o vice-presidente foi afirmativo ao dizer que o governo vai fixar metas para reduzir o desmatamento e não tergiversou como ontem (quinta-feira). O discurso está mudando, o governo já entendeu que o combate a atos ilegais e criminosos é responsabilidade dele", disse Paulo Hartung, presidente da Indústria Brasileira de Árvores (IBA) e ex-governador do Espírito Santo. "Conseguimos avançar, mas só com atos concretos é que criaremos outra visão da opinião pública internacional. A bola está do outro lado."
Segundo um dos participantes do encontro, que pediu para não ser identificado, os presidentes de empresas deram relatos fortes ao vice-presidente sobre os efeitos do desmatamento na Amazônia nos negócios e na economia. Empresas de agronegócio relataram que a soja brasileira começa a enfrentar boicotes em alguns países, por exemplo. A saída dos fundos de investimento também tem potencial de causar danos nos financiamentos às empresas privadas de maneira geral.
Os empresários sugeriram a Mourão iniciativas a serem adotadas pelo governo, como assumir o controle do rastreamento de todo o gado. O governo já teria a expertise e o programa não teria grandes impactos nos cofres públicos.
Para o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Marcello Brito, a principal notícia da reunião foi a promessa de um plano de redução do desmatamento na Amazônia com metas semestrais até 2022, embora não tenha dito qual será essa meta. "Não existe bala de prata na Amazônia, nada é simplista, mas nós notamos por parte dele compromisso e boa vontade", disse Britto.
"Houve uma inflexão. É positivo o Estado dizer: reconhecemos que é grave e vamos tomar medidas", disse Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável . "Do lado dos empresários, a principal mensagem é que preservação e produção podem conviver."
Em carta enviada esta semana a Mourão e representantes do Legislativo e Judiciário, o grupo de empresários locais – que inclui pesos pesados como Vale, Shell, Marfrig e Natura – cobrou ações firmes do governo no combate ao desmatamento e falou em "preocupação com o impacto nos negócios da atual percepção negativa da imagem do Brasil no exterior".
Após o encontro, a Cargill – que foi representada no encontro pelo seu presidente, Paulo Sousa – divulgou nota defendendo a "aplicação integral das normas aplicadas no código florestal", assim como "ações claras de comando e controle contra o que foge e que é ditado pelo código". E reforçou seu compromisso em transformar as cadeias de suprimentos que abastecem a companhia para que não haja desmatamento. "Sabemos que há trabalho a ser feito e estamos acelerando nossos esforços nessa área, incluindo soluções inovadoras economicamente viáveis para os agricultores", informou a companhia.
Também em nota, o presidente da Suzano, Walter Schalka, disse que a reunião foi positiva. "Reforça a necessidade de dialogarmos e construirmos juntos, entes públicos, iniciativa privada e sociedade em geral, um caminho que permita ao Brasil assumir um papel de protagonismo nas discussões ambientais globais."
A Shell, representada no encontro pelo seu presidente, André Araújo, divulgou nota afirmando que "se coloca à disposição para trabalhar com o governo no Conselho da Amazônia. "
'Gravidade e inflexão'
"Houve uma inflexão. É positivo o Estado dizer: reconhecemos que é grave."
Marina Grossi
PRESIDENTE CEBDS
"O vice foi afirmativo ao dizer que vai fixar metas para reduzir desmatamento."
Paulo Hartung
PRESIDENTE DA (IBA)