Título: Barão fora das ruas
Autor: Campos , Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 26/02/2013, Cidades, p. 19

Medida prevista em lei, mas inédita e considerada drástica, a intervenção decretada pelo governador Agnelo Queiroz (PT) nas três empresas do Grupo Amaral é o resultado do que deve ocorrer nos próximos meses: a transição do atual modelo para o sistema licitado vai provocar uma deterioração na eficiência dos serviços. Empresas que deverão sair do mercado do DF tendem a tratar com mais descaso uma população que chega a 1 milhão de passageiros por dia. Não há mais compromisso com a eficiência. A Rápido Brasília, a Viva Brasília e a Rápido Veneza se tornaram campeãs em reclamações dos usuários do sistema. Para tentar contornar esse quadro, o governo assumiu a operação das linhas de ligação da região norte do DF — Planaltina, Sobradinho, Itapoã, São Sebastião e Paranoá — com o Plano Piloto. A decisão pode se estender para outras empresas.

Numa situação financeira precária, o conglomerado do ex-senador Valmir Amaral (PTB-DF) está sem condições de permanecer nas ruas a longo prazo e não deve vencer nenhum dos lotes da concorrência em curso no DF. Embora tenha feito compromisso de recuperação de sua capacidade operacional, assinado no Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), o grupo não tomou nenhuma providência para atender melhor a população.

A situação do Grupo Amaral é a pior do DF, mas problemas semelhantes existem em outras permissionárias, principalmente nas da família Canhedo. O empresário Wagner Canhedo Filho, que está há mais de 50 anos no setor, briga para conseguir o seu quinhão na divisão de cinco bacias. Duas já foram licitadas. Empresas ligadas a ele tentaram entrar, mas não conseguiram qualificação para o negócio. Entre técnicos do Transporte Urbano do DF (DFTrans), há uma expectativa de que as viagens de linhas concedidas para a Viplan, a Condor e a Lotáxi sofram também uma deterioração à medida que se aproximar o fim do vínculo das permissionárias com o GDF.

Por isso, o Executivo não descarta também uma nova intervenção. "Depende muito mais das empresas que do próprio GDF. A obrigação das permissionárias é cumprir os contratos. O GDF não vai se furtar de tomar providências", disse, ontem, o governador Agnelo Queiroz.

As empresas de Valmir Amaral atuam em 10% do sistema de transporte, com 2,44 milhões de passageiros por mês (veja ilustração). Com a intervenção, o DFTrans ficará encarregado da gestão das empresas, e a Sociedade de Transporte Coletivo (TCB) assumirá a operação. Trata-se de uma medida ousada. Uma eventual má qualidade dos serviços cairá na conta do Executivo. A população quer eficiência, independentemente do responsável pelo transporte coletivo. Assim, para o governo, a responsabilidade pela parte que cabe a Canhedo representa um risco ainda maior, já que as permissionárias do grupo detêm 35% do mercado, com mais de 900 ônibus no sistema.

Recuperação judicial Canhedo, segundo técnicos da área de transporte, não aceitaria uma intervenção pacificamente. O conglomerado do empresário passa por um processo de recuperação judicial provocado por dívidas da antiga Vasp. Uma redução das viagens pode levar à falência das empresas. Além disso, o governo não tem o mapa financeiro do grupo. Mesmo que as empresas mantenham os ônibus em operação, não há garantia de que os serviços serão prestados a contento. "Essa fase de transição é difícil, mas já esperávamos por isso quando resolvemos fazer uma licitação. Temos condições de adotar medidas para manter a qualidade e vamos fazer o que for preciso", disse o vice-governador, Tadeu Filippelli (PMDB).

A intervenção, anunciada ontem, foi uma decisão amadurecida ao longo dos últimos oito meses. Em junho de 2012, já com a eficiência comprometida, as empresas do Grupo Amaral firmaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o DFTrans, intermediado pelo MP. O compromisso era de manter no mínimo 350 ônibus em operação e alocar R$ 880 mil por mês em investimentos na renovação e na manutenção da frota.

Em vez de cumprir o TAC, o grupo reduziu o número de veículos nas ruas e não conseguiu atingir o volume de recursos acertado. "Essa é uma decisão que cabe ao governo. Mas acredito que não havia outra saída. O Ministério Público aprova a medida", afirma o promotor Leonardo Roscoe Bessa, responsável pelo TAC. Na época da negociação, as empresas mantinham 294 ônibus em operação dos 300 necessários. Na última sexta-feira, apenas 186 veículos saíram das garagens do Grupo Amaral. "Havia risco de colapso do sistema", acredita o secretário de Transportes, José Walter Vazquez.