O globo, n. 31816, 15/09/2020. Mundo, p. 25

 

ONU alerta para crescente influência militar no Brasil

15/09/2020

 

 

Alta comissária de Direitos Humanos ressalta que ataques contra ativistas e jornalistas em solo brasileiro também preocupam

 A alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, alertou ontem para o crescente envolvimento militar nos assuntos públicos e na aplicação da lei no Brasil. Às vésperas do discurso do presidente Jair Bolsonaro na abertura do debate na Assembleia Geral da ONU, a ex-presidente chilena denunciou também ataques contra ativistas e jornalistas no país.

—No Brasil, assim como no México, em El Salvador e em outros lugares, estamos vendo um aumento do envolvimento militar nos assuntos público sena implementação da lei. Por maisque reconheça o desafiador contexto de segurança,qualquer us odas Forças Armadas na segurança pública deve ser estritamente excepcional, com fiscalização efetiva.

O governo brasileiro tem hoje oito ministros militares ou com formação militar. Além disso, de acordo com o Tribunal de Contas da União, cerca de 2,8 mil cargos comissionados do governo federal estão ocupados por militares ou policiais militares.

Em seu discurso de abertura da sessão do conselho, em Genebra, Bachelet fez ainda um apelo para que as autoridades “adotem medidas contundentes para garantir que toda a tomada de decisões seja baseada nas contribuições enas necessidadesde todo o povo brasileiro ”, e denunciou os ataques contra jornalistas e ativistas:

— No Brasil, estamos recebendo relatos de violência rural e despejos de comunidades sem terra, além de ataques contra defensores dos direitos humanos e jornalistas, com o assassinato de ao menos 10 defensores dos direitos humanos confirmados neste ano — disse a alta comissária, que também destacou a gravidade da situação no cenário latinoamericano. —A contínua erosão de organismos independentes para a consulta e a participação comunitária também é preocupante.

Ela se refere a um decreto de abril de 2019, em que Bolso na rode terminou mudanças e até a extinção de órgãos colegiados criados antes de sua gestão. A medida foi vista como limitadora da participação civil no debate público.

Pelas regras do Conselho, o governo brasileiro terá até amanhã para responder. No próximo dia 22, Bolsonaro abrirá o debate na Assembleia Geral da ONU. Em razão da pandemia , os líderes gravarão vídeos para o evento, em vez de se reunirem na sede da ONU em Nova York.

Em seu discurso, Bachelet lista violações de direitos humanos em 25 países, e também disse estar preocupada com o grave impacto da pandemia de Covid-19 no continente americano, destacando a urgência de “abordar as profundas desigualdades de desenvolvimento na região”. A ex-presidente chilena citou a questão racial nos EUA, dizendo que casos recentes de mortes de homens negros pela polícia “trazem à tona, mais uma vez, a necessidade de ações urgentes e profundas para combater o racismo sistêmico e a discriminação racial”.