O globo, n. 31819, 18/09/2020. País, p. 6

 

STF suspende depoimento do presidente sobre interferência

André de Souza

Carolina Brígido

Leandro Prazeres

18/09/2020

 

 

Decisão de Marco Aurélio também paralisa inquérito até deliberação do plenário

 O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu temporariamente o depoimento do presidente Jair Bolsonaro na investigação que apura se ele interferiu de forma indevida na Polícia Federal. A decisão, que paralisa todo o inquérito, valerá até deliberação do plenário da Corte. Em transmissão nas suas redes sociais, Bolsonaro disse que espera “enterrar” o processo.

Marco Aurélio decidiu suspender o processo porque Bolsonaro já tinha sido intimado pela PF para depor até a próxima quarta-feira e não haveria tempo hábil para o pleno do STF se manifestar antes disso sobre aformado depoimento. A Advocacia-Geral da União (AGU) questionou decisão do relator do caso, Celso de Mello, que não concedeu a Bolsonaro a prerrogativa de depor por escrito por ele ser investigado, e não testemunha. Como Celso está de licença médica, o recurso foi encaminhado a Marco Aurélio.

“Considerada a notícia da intimação para colheita do depoimento entre 21 e 23 de setembro próximos, cumpre, por cautela, suspenderas e quência do procedimento ”, decidiu Marco Aurélio, determinando ainda que a Procuradoria-Geral da República (PGR) dê um parecer sobre o assunto. Em manifestação anterior, o procurador-geral, Augusto Aras, foi favorável ao depoimento por escrito.

O inquérito de Bolsonaro no STF foi aberto para apurar as acusações feitas pelo ex-ministro da Justiça Ser gio Moro, que saiu do governo dizendo que o presidente tentava interferir na corporação. A AGU destaca que em 2017 a prerrogativa de depor por escrito foi concedida ao então presidente Michel Temer, investigado na ocasião com base na delação da JBS. Marco Aurélio não quis decidir sozinho.

—Eu sou avesso à autofagia, ou seja, não aprecio individualmente o merecimento de decisão de colega, ao contrário de alguns lá do colegiado. —disse o ministro.

Não há previsão de quando será realizado o julgamento do recurso. O presidente do STF, ministro Luiz Fux, deve aguardar, primeiro, a manifestação de Aras. E pretende consultar o ministro Celso de Mello. Fux também deve verificar quando haverá quórum mínimo para julgamento. Três ministrosdo STF ouvidos pelo GLOBO em caráter reservado afirmaram discordar da decisão de Celso de Mello. Para eles, o episódio só serviu para colocar lenha na fogueira dos atritos entre o STF e o Planalto.

Em transmissão nas suas redes sociais, Bolsonaro atacou o ex-ministro Moro, afirmou que as suspeitas levantadas pelo ex-juiz sobre sua interferência na PF são uma “farsa”.

—Se Deus quiser, agente enterra esse processo e acaba com essa farsa desse exministro da Justiça de me acusar de forma leviana. — disse Bolsonaro.

Bolsonaro lembrou que, antes de pedir exoneração do cargo, Moro havia dado entrevistas negando interferência do presidente na corporação. Ele afirmou que o pedido para depor por escrito é devido ao precedente anterior.