Valor econômico, v. 21, n. 5112, 22/10/2020. Brasil, p. A15

 

Novo programa social deve ter prêmios de até R$ 1 mil por estudante

Fabio Graner

22/10/2020

 

 

Versão modificada do Bolsa Família deverá premiar mérito educacional e esportivo

Independentemente do tamanho e do nome que terá, a nova versão do Bolsa Família que o governo prepara já tem uma série de propostas tecnicamente prontas e que podem ser executadas com o nível de Orçamento atualmente previsto para 2021. Entre as ideias que dependem apenas de se bater o martelo politicamente, estão prêmios para mérito esportivo, em ciência e tecnologia (como olimpíadas de matemática e de física) e para educação de forma geral.

No caso de esportes e ciência e tecnologia, a ideia é dar um benefício extra de R$ 1 mil por ano para as famílias de jovens que ficarem bem posicionados nesses certames. Além disso, esses estudantes que se destacarem receberão individualmente R$ 100 por mês ao longo do ano.

O custo é relativamente baixo, estimado e R$ 50 milhões nas duas modalidades, e visa estimular o desenvolvimento dos jovens em famílias do programa social. Com esses recursos, seria possível premiar 20 mil jovens (10 mil em cada modalidade). Obviamente os valores e o alcance da proposta podem mudar por decisões políticas.

A premiação por mérito escolar de forma geral terá um custo maior, porque pretende alcançar quase 2 milhões de estudantes. Nesse caso, o desenho ainda não está finalizado no governo, que discute quais serão os critérios para premiação. Ela deve ser da ordem de R$ 200 por ano para os melhores alunos. Um grupo de trabalho está discutindo qual será o foco dessa premiação, por exemplo, se ela estará voltada para as faixas etárias com maior evasão escolar.

Para essas iniciativas de premiação poderem ser implementadas, depende do governo mandar uma medida provisória ou aprovar um projeto de lei, o que tende a ocorrer apenas depois das eleições. A necessidade decorre do fato de que isto não está previsto na legislação atual do Bolsa Família.

Além dos estímulos para o melhor desempenho, o novo programa social deve trazer mudanças para tentar simplificar a estrutura do pagamento de benefícios. Hoje, ela envolve seis modalidades, com um auxílio básico, de R$ 89, e cinco variáveis. A ideia é que se trabalhe com apenas três modalidades, entre elas uma especificamente voltada à primeira infância - para famílias com filhos de até três anos.

Essa mudança, segundo uma fonte, não deve implicar redução de valores hoje pagos às famílias. Aliás, nesse redesenho, com o orçamento previsto para o ano que vem e um número de 14,5 milhões de famílias, o benefício médio pode subir dos atuais R$ 191 para R$ 202. Atualmente, o programa atende 14,3 milhões.

No projeto de lei orçamentária, há uma menção a 15,1 milhões de famílias a serem atendidas pelo orçamento de R$ 34,8 bilhões. O tamanho final, contudo, vai depender de como estará a situação de pessoas em situação de pobreza após o fim do auxílio emergencial.

Na reformulação que está sendo preparada, outra preocupação é em lidar adequadamente com a volatilidade de renda das famílias que conseguem renda no mercado de trabalho para não ter mais que receber o benefício. Nesse sentido, está se trabalhando em estratégias de complementação de renda por algum período mesmo após a saída da família do programa.

O desenho do que já foi chamado de Renda Brasil também inclui um forte esforço tecnológico, que ganhou impulso com a demanda gerada pelo auxílio emergencial. A intenção é articular o Cadastro Único de programas sociais, que foi aprimorado nos últimos meses, com plataformas privadas de busca de emprego e, assim, viabilizar trabalho para os pais e até estágio para os jovens das famílias inscritas no programa. É uma das chamadas “portas de saída”.

Também se buscará fomentar mecanismos de seguro privado para baixa renda e educação financeira para as famílias. Ainda que se saiba que com a renda baixa é praticamente inviável se falar em poupança, a visão é que se pode fazer com que as famílias consigam pelo menos organizar melhor suas contas e, mais importante, preparar os jovens para lidar melhor com dinheiro no futuro.

A forte interação digital também terá papel reforçado no combate às fraudes ou aos repasses de recursos para quem não precisa. Até a análise de redes sociais está nesse escopo.

Discutido desde o ano passado, mas intensificado com a pandemia da covid-19 e o sucesso do auxílio emergencial, o novo programa social do governo já foi chamado de Renda Brasil, Renda Cidadã e já teve anúncio de que o nome Bolsa Família seria mantido.

Isso continua em aberto, mas uma fonte esclarece que originalmente o “Renda Brasil” era um guarda-chuva que contemplava todas as diversas facetas do novo programa social. Entre essas, estava o “Renda Cidadã”, que tratava apenas da remuneração financeira que hoje está no Bolsa Família e cuja estrutura de benefícios está sendo simplificada.

A principal pendência hoje, a rigor, é a sobre qual será o efetivo tamanho do novo programa social. E isso depende da área econômica do governo conseguir convencer o presidente Jair Bolsonaro a aceitar cortes em outros programas, como abono salarial e seguro-defeso, ou medidas mais impopulares, como deixar de repor a inflação por dois anos no salário mínimo e em despesas a ele atreladas. A cada R$ 10 bilhões a mais de recursos para o novo programa, o benefício médio pode subir R$ 35.

O Ministério da Cidadania e o da Economia lideram a formatação do novo programa social. Outras pastas, como as da Ciência e Tecnologia e da Educação, também participam das discussões.

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Governo estuda realocação de recursos

Fabio Graner

22/10/2020

 

 

Ideia é elevar de R$ 34,8 bilhões para em torno de R$ 40 bilhões o orçamento do programa social para baixa renda

Sem definições sobre que programas seriam incorporados para turbinar a capacidade financeira do novo Bolsa Família (ou Renda Cidadã), o governo estuda fazer um remanejamento de recursos no projeto de lei orçamentária de 2021 para elevar de R$ 34,8 bilhões para algo em torno de R$ 40 bilhões o orçamento do programa social para baixa renda.

Se for adiante, o público-alvo subiria dos atuais 14,3 milhões para cerca de 17 milhões de famílias.

A decisão, porém, ainda não está tomada. A vantagem dessa alternativa é que permitiria reforçar o Bolsa Família dentro dos limites do teto de gastos e sem o desgaste de acabar com programas como seguro-defeso e abono salarial. Por outro lado, implicaria perda de recursos para outras pastas do governo, em um ambiente de escassez financeira generalizada.

Nas discussões do novo programa social, há também uma ideia de deixar pronto um mecanismo de “benefício-calamidade”, que seria acionado em situações como os desastres das barragens de Brumadinho e Mariana, a mancha de óleo no Nordeste e outras situações, inclusive semelhantes à da pandemia da covid-19.

Isso permitiria aumentar o valor dos benefícios, como um complemento de renda, para os participantes do programa social de maneira mais célere, bastando a liberação do crédito extraordinário pelo Congresso Nacional. A ideia em discussão é que esse desenho possa ser acionado para atingir inclusive pessoas que não estão no programa social, mas que acabam atingidas pela situação de calamidade. A medida, contudo, ainda está em aberto no governo.