O globo, n. 31830, 29/09/2020. País, p. 8

 

Número de candidatos da segurança sobe 12%

Rayanderson Guerra

29/09/2020

 

 

Dezenove estados registraram aumento na quantidade de policiais militares, civis, bombeiros e outras categorias que vão disputar as eleições, e Rio lidera alista entre as capitais. Apenas entre os membros das Forças Armadas, salto foi de 44%

 O número de agentes de segurança que registraram candidatura para um dos cargos de prefeito e vereador pelo país cresceu 12,2% desde a última eleição municipal, em 2016. Com base em dados divulgados pela Justiça Eleitoral, O GLOBO identificou que policiais militares, civis, bombeiros, membros das Forças Armadas e militares reformados saltaram de 5.991 para 6.720. Os candidatos que se licenciaram do Exército, Marinha e Aeronáutica representam um aumento ainda maior desde a eleição passada. Houve um crescimento de 44% de registros de candidaturas. Esta será a primeira eleição após a vitória de Jair Bolsonaro, que foi acompanhada de uma eleição recorde de agentes de segurança para cargos legislativos.

O número de candidatos vinculados à área subiu em 19 estados. Em todo o país, serão 3.559 policiais militares, 11% a mais do que há quatro anos. Em contrapartida, a eleição deste ano terá menos candidatos da Polícia Civil do que em 2016. O número recuou de 1.025 para 914. Neste ano, em todo o país, serão 388 candidatos a prefeito, 399 a vice-prefeito e 5.932 a vereador. Em 2016, foram 181, 192 e 5.614, respectivamente.

Em oito unidades da federação, o número de candidatos oriundos das forças de segurança caiu. No Rio Janeiro, houve uma oscilação pequena, de 720 para 716. A capital do estado continua sendo a cidade com mais candidatos vindos do setor. Na corrida para Prefeitura do Rio, a delegada Martha Rocha, que deixou a Polícia Civil em 2014 para se dedicar a política, vai disputar o cargo, após seis anos na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

PM YOUTUBER

Além da pedetista, cabos, sargentos e capitães de primeira viagem vão concorrer por uma vaga de vereador no Palácio Pedro Ernesto. O youtuber e policial militar Gabriel Monteiro é um dos novatos que vai tentar carreira política. Monteiro chegou a ser expulso da PM no início de agosto por deserção. O PM era lotado no 34º BPM (Bangu) e faltou o serviço para o qual foi escalado no dia 22 de julho deste ano. O youtuber permaneceu até o dia 31 sem dar qualquer satisfação sobre seu paradeiro à corporação e completou mais de oito dias de ausência, o que configura o crime de deserção previsto no artigo 187 do Código Penal Militar. Pouco tempo depois ele se apresentou e foi reintegrado, até pedir licença para concorrer nas eleições deste ano.

“Irei fazer uma campanha inovadora, se vocês acham que eu na Polícia enfrentei o sistema, com o mínimo de blindagem vocês verão o que é um homem com fé no Brasil e em Deus. Podem até me matar, mas não abaixarei a cabeça pra CORRUPTO”, afirma nas redes sociais.

Além do Rio de Janeiro, outra cidade fluminense aparece entre as dez primeiras cidades com o maior número de candidatos da categoria: Duque de Caxias. O município da Baixada Fluminense aparece em oitavo lugar, com 35.

Na lista das cidades com mais membros das forças de Segurança, Salvador aparece logo atrás de Rio (93), Manaus (76) e São Paulo (74). Na capital baiana, serão 69 na disputa para a Câmara Municipal e para a prefeitura. Uma das candidatas, a Major Denise (PT) se afastou da Polícia Militar no início do ano para disputar a eleição pelo Partido dos Trabalhadores. Apesar de a maioria dos candidatos serem de partidos de direita, Denise acredita que o maior número de membros das forças de Segurança sinaliza que “trabalhadores e trabalhadoras da segurança pública, que são cidadãos e cidadãs como todos os outros, estão se sentindo preparados e preparadas para contribuir com as suas cidades”.

—Estamos falando de pessoas que podem contribuir para que a gente cuide melhor da nossa gente. Todas as pessoas são legítimas para disputar as eleições, para colocar o nome à disposição do povo. Decidi disputar as eleições porque me senti convocada a cuidar ainda mais do povo da minha cidade —contou ao GLOBO.

PSL ATRAI MAIS

O PSL, partido pelo qual o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi eleito, é a legenda com o maior número de representantes, com 647 candidatos, seguido pelo Republicanos (431), do PSD (422) e do MDB (398). O partido de esquerda com o maior número de membros das forças de Segurança é o PSB, na 16ª posição, com 232.

O aumento de número de candidatos com origem em instituições das forças de Segurança é visto como um risco de politização e quebra de neutralidade das tropas, segundo Rafael Alcadipani, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

— É bastante preocupante que a gente veja um aumento considerável. A impressão que tenho é que eles estão seguindo uma rabeira do movimento que elegeu Bolsonaro, na esperança de aumentar a força nos parlamentos municipais e nas prefeituras. A legislação brasileira é leniente com os candidatos da categoria. Eles podem disputar uma eleição e depois voltar aos quartéis. Não pode pairar dúvida sobre sobre a imparcialidade das instituições.

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Na pandemia, presença de profissionais de saúde aumenta

Marlen Couto

Pedro Capetti

29/09/2020

 

 

Número chega a 17,3 mil, uma alta de 14% em comparação com 2016; postulantes atribuem ã Covid-19 a decisão de concorrer

 Em uma eleição atravessada pela pandemia de Covid-19 e os seus impactos nas cidades, o volume de candidaturas de profissionais de saúde subiu 14% na comparação com o pleito municipal anterior, em 2016: de 15,1 mil para 17,3 mil concorrentes aos cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador. É o que revela levantamento feito pelo GLOBO com base nas estatísticas eleitorais divulgadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

A variação foi superior ao crescimento do número total de candidatos na disputa municipal deste ano, que foi de 10%. A alta de candidaturas ocorreu em oito profissões da saúde analisadas pelo GLOBO, mas foi maior entre fonoaudiólogos (48,2%) e técnicos de enfermagem (43%). Este último grupo passou a liderar o ranking de profissionais da área com maior número de candidatos. Ao todo, 4,5 mil técnicos de enfermagem disputarão cargos públicos em novembro.

Já o número de médicos candidatos cresceu 7%, passando de 2,5 mil para 2,7 mil, o que foi impulsionado pelo aumento de concorrentes ao cargo de prefeito em todo o país. Este ano, esses profissionais continuaram a liderar o ranking com mais candidatos ao posto: ao todo, serão 747 em busca do cargo mais alto do Executivo municipal.

ALTA PREOCUPAÇÃO

Tradicionalmente a saúde aparece entre as prioridades dos eleitores brasileiros na hora de decidir o voto. Em São Paulo, por exemplo, a área é aquela em que os moradores da cidade mais enfrentam problemas, segundo pesquisa divulgada pelo Ibope no último dia 21. A saúde foi citada em 33% das respostas, número três vezes maior do que o transporte coletivo, que ficou em segundo lugar.

Em busca de votos de eleitores preocupados com a saúde pública, quase 80% dos médicos candidatos vão usar a identificação de “doutor” nas urnas, de acordo com os registros de candidatura. O MDB é o partido que concentra, em números absolutos, o maior número de médicos candidatos, com 262 profissionais, seguido pelo PSD, com 226, e PSDB, com 207.

Em Mogi das Cruzes (SP), a pandemia foi responsável por amadurecer a ideia do endocrinologista Matheus Armando Ramos Rodrigues, de 38 anos, a se candidatar a uma vaga para a Câmara dos Vereadores. Trabalhando 90% do tempo no SUS, o médico afirma que a Covid-19 foi determinante para que ele aceitasse o desafio de concorrer a uma vaga pelo Democratas.

— (A pandemia) Ajudou bastante, foi uma maneira de sair do quadrado do consultório e fazer algo mais macro. No consultório, você fica restrito a 40 a 50 pessoas dia, e num trabalho público pode ajudar mil —ressaltou.

Ele afirma que, apesar dos conhecimentos em saúde, um médico deve focar em outras temáticas correlatas para melhorar a cidade.

—A medicina não está só dentro do hospital, as pessoas precisam de uma boa casa, lugar para morar. Saúde vem daí, temos que avançar —lembra.

PESO DA EXPERIÊNCIA

Depois de 36 anos de profissão e de administrar hospitais públicos e privados do Rio, o obstetra Sérgio Teixeira (Novo), de 60 anos, decidiu disputar pela primeira vez uma vaga na Câmara dos Vereadores da capital. A decisão veio depois de anos de vivência no SUS e, segundo ele, da sua “indignação” com a falta de fiscalização e de transparência no sistema de saúde:

— A pandemia mostrou como nossa rede é desarticulada. É muito triste depois de 36 anos me dedicando a salvar vidas ver o que está acontecendo com a saúde do Rio. Não é exemplo para ninguém. Essa não é a primeira nem a última crise que vamos atravessar. Penso que a experiência que adquiri com gestão e minha indignação com a situação da saúde pública me fizeram tomar a decisão de me candidatar. Decidi partir para a ação —diz Teixeira.

O cientista político Eduardo Grin, da FGV-SP, avalia que o crescimento dessas candidaturas já era esperado, uma vez que a saúde despontou como grande preocupação dos eleitores. Ele enfatiza que o SUS deve enfrentar desafios no próximo ano e que os municípios terão papel central nesse contexto, porque são a porta de entrada para serviços básicos de saúde.

—Há uma expectativa de que a demanda por saúde vá crescer no ano que vem não apenas como efeito da Covid, mas porque, ao gerar muito desemprego, a crise social e econômica faz com que muitos setores da sociedade não possam mais pagar seus planos de saúde —avalia Grin, ressaltando, porém, que os candidatos eleitos enfrentarão forte pressão da população:

— Não é uma aposta isenta de riscos porque a sociedade vai cobrar fortemente dos eleitos com essa agenda respostas que dificilmente serão aceitas como de médio prazo. Serão cobradas no curto prazo, sobretudo porque esse deve ser um tema fortíssimo no debate eleitoral.