Título: Afinal, qual é o preço da mercadoria?
Autor: Maia, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 04/03/2013, Cidades, p. 24

A legislação exige que o comércio detalhe a composição do valor dos produtos, revelando os percentuais correspondentes à taxa de juro, aos encargos e aos seguros. Mas grande parte dos estabelecimentos comerciais ignora a regra, inclusive os das grandes redes do varejo

Embora, há cinco anos, o Banco Central exija que as lojas e as instituições financeiras informem ao cliente o Custo Efetivo Total (CET) dos parcelamentos, a prática ainda está longe de se tornar realidade. Basta uma ida aos estabelecimentos físicos das principais varejistas de eletrodomésticos para perceber que nem as grandes redes estão prontas para informar ao cliente o quanto ele realmente vai gastar comprando um produto a prazo. Para quem não quiser sair de casa, uma consulta às páginas virtuais mostra que a compra parcelada ainda é nebulosa.

Boa parte das lojas de departamentos se limita a informar a taxa de juros e o valor da parcela mensal. Pela resolução do Banco Central, o consumidor deveria ser informado sobre o percentual que corresponde ao juro, aos encargos e aos seguros anuais. Alguns estabelecimentos exibem em cartazes o espaço reservado para o CET, mas o deixam em branco. “Ou falta ou a informação errada acaba induzindo o cliente ao erro”, diz Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Associação de Consumidores Proteste.

Para provar que as maiores varejistas e supermercados brasileiros não informam o consumidor da maneira que a lei estabelece, a Proteste fez uma pesquisa com 10 lojas e supermercados, tanto na versão virtual quanto física. Entre os avaliados estavam as Casas Bahia, Ricardo Eletro, Fast Shop, Ponto Frio, Extra, Walmart, Carrefour, Shoptime, Americanas.com e Submarino. De acordo com o levantamento, somente as unidades on-line das Casas Bahia, do Extra e do Ponto Frio informavam o CET ao consumidor. Nenhuma das unidades físicas visitadas pela associação esclareciam ao consumidor o quanto ele pagaria no total se optasse pela compra a prazo, inclusive, nem sequer os vendedores sabiam o significado da sigla CET.

O resultado da falta de informação é cliente insatisfeito, assim como a recepcionista Suely Rodrigues dos Santos, 37 anos. Ela conta que de tanto ser ludibriada por vendedores, ela passou a anotar o que o lojista diz e a calcular qual seria o preço final. Somente depois do cálculo, ela opta se vai parcelar e em quantas vezes. “Cansei de ver fatura chegando com taxinhas e juros sobre os quais eu não fui informada na hora da compra. Por isso, aprendi. E tem outra coisa: se a loja me enganou uma vez, eu evito comprar lá”, conta.

As varejistas e ossupermercados se defendem e argumentam que informam ao cliente o valor total da compra a prazo, mas nem sempre usam a denominação CET. A Fast Shop, por exemplo, esclareceu, via nota, que as etiquetas de preços de produtos nas lojas e no site comunicam o Valor Total a Prazo (VTP) e “que nada mais é o custo total do produto ou serviço”. Ainda, de acordo com a nota, a empresa não vê diferença de valor total a prazo e o CET.

Para a Proteste, contudo, os diferentes nomes também induzem o cliente ao erro, porque o CET unifica os significados do total pago naquele parcelamento. “Se o consumidor tem informação igual de todas as lojas em que está pesquisando preço, ele vai poder comparar de forma igual”, analisa Maria Inês. Os resultados do levantamento da Proteste foram encaminhados aoBanco Central, à Federação Brasileira de Bancos (Febraban), ao Procon RJ e ao Sindicato dos Lojistas do Comércio do Rio de Janeiro. As lojas físicas visitadas pela associação estão na capital fluminense.

Por meio de nota, a Via Varejo, que representa a Ponto Frio e as Casas Bahia, informou que os clientes são cientes do CET e que trabalha dentro das exigências da lei, tanto que “informa prévia e adequadamente sobre o preço de seus produtos, dos acréscimos decorrentes do financiamento, das formas depagamento, incluindo em todas as ofertas o CET mensal e anual e, também nos contratos.”

O Extra respondeu que não foi comunicado da pesquisa e que não sabe dos critérios e metodologias utilizados pela Proteste. Garantiu que “obedece à legislação de proteção ao consumidor”. A B2W, que representa as lojas virtuais Americanas.com, Shoptime e Submarino limitou-se a responder que a empresa “cumpre a legislação vigente e, constantemente, analisa seus processos para melhor atender o cliente”.

A Ricardo Eletro ponderou que, por meio de cartazes, os consumidores tomam conhecimento sobre a taxa de juro cobrada e o CET, que inclui o valor do Imposto sobre Operação Financeira (IOF) na venda parcelada de produtos no cartão próprio ou por meio de carnê. Quanto aos valores financiados, o contrato é emitido de acordo com a regulamentação vigente. O Carrefour e o Walmart não responderam até o fechamento dessa edição.

Onde reclamar Os interessados em reclamar da não aplicabilidade da Resolução 3.909/10 do Banco Central podem entrar em contato com a instituição ou reclamar nos órgãos de defesa do consumidor como o Procon de sua cidade.

O que diz a lei

Exigência legal A partir da edição da Resolução nº 3.909/2010, todos os custos com a obtenção de uma linha de crédito foram unificados em uma única taxa, o Custo Efetivo Total (CET). Ele expressa a taxa de juros, os encargos e os seguros e deve ser apresentado na forma percentual anual. A resolução determina que o CET deve ser calculado a qualquer momento pelas empresas – sejam lojas físicas, on-line, supermercados ou bancos – a pedido do cliente. Como o Código de Defesa do Consumidor também determina que o cliente tem o direito básico à informação clara e precisa, as empresas que não informam o CET descumprem a resolução e o CDC.