O Estado de São Paulo, n.46293, 16/07/2020. Política, p.A10

 

Analistas veem erro no uso de lei de Segurança

Rayssa Motta

16/07/2020

 

 

Nas últimas semanas, o governo federal usou a Lei da Segurança Nacional (LSN) ao menos três vezes para embasar ofensivas jurídicas contra críticos ao Planalto – o ilustrador Renato Aroeira e o jornalista Ricardo Noblat, por causa da publicação de uma charge; o jornalista Hélio Schwartsman pela publicação de um artigo; e o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), por comentário sobre Ministério da Saúde. Analistas ouvidos pelo Estadão veem "equívoco" no uso da lei nesses casos.

O advogado constitucionalista Almino Afonso Fernandes, avalia como "equivocada" a utilização sistemática do dispositivo em substituição ao Código Penal Brasileiro. "A LSN é totalmente incompatível com o ordenamento jurídico constitucional vigente, pois afronta os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, consagrado pela sociedade brasileira. Não é por acaso que muitos analistas a classificam de "entulho autoritário", disse.

O constitucionalista e criminalista Adib Abdouni vai na mesma linha e vê "contornos autoritários" nas iniciativas que, para ele, buscam "institucionalizar o crime de opinião". Para ele, os episódios não se assemelham a crimes que possam causar lesão à integridade territorial, soberania nacional, regime democrático ou ao presidente.

A LSN foi sancionada em 1983, durante a ditadura militar, pelo presidente João Figueiredo, para listar crimes que afetem a ordem política e social – incluindo os cometidos contra a democracia, a soberania nacional, as instituições e a pessoa do presidente da República.

José Nantala Bádue Freire, especialista em direito internacional, diz que para ser enquadrada na LSN, a manifestação deve incitar a violência e a agressão às instituições em si. "Críticas às pessoas dos governantes, suas posições políticas, suas ideologias, ainda que mais ácidas, são normalmente relevadas ao âmbito pessoal e, portanto, tratadas nos âmbitos do direito penal e do direito civil 'comuns'", disse.