Título: Freio em abuso de planos de saúde
Autor:
Fonte: Correio Braziliense, 06/03/2013, Opinião, p. 12

“Parece o SUS!” O comentário desabonador se torna cada vez mais frequente entre os usuários dos planos de saúde. Entendê-lo não exige esforço nem provoca oposição. Trata-se do constrangedor e desrespeitoso tratamento dispensado aos brasileiros que buscam a contrapartida do desembolso mensal feito para receber atenção melhor que a oferecida pelo Estado.

Além da dificuldade de marcar consulta, da falta de leitos hospitalares, da fila em unidades de terapias intensivas, da escassez de profissionais de determinadas especialidades, contestam-se pedidos de procedimentos médicos. Segundo a Agência Nacional de Saúde (ANS), as 75.916 reclamações de clientes anotadas em 2012, 57.509 se deveram à negativa de cobertura. O número representa nada menos de 75,7% do total.

A cifra pode estar subestimada caso se leve em conta que muitos cidadãos — por comodismo ou ignorância — deixam de registrar a queixa. Assim, vale lembrar, o ruim pode ser pior. Resultado: o cliente, desamparado, tem duas saídas. Uma: desembolsar o valor cobrado por instituição privada. A outra: recorrer ao Sistema Único de Saúde. E aí começa outra via-crúcis até conseguir atender a exigência médica.

Quando identifica procedimento coberto por operadora realizado na rede pública, o governo cobra reembolso. O salto do montante cobrado demonstra o crescimento do descaso com a população. Entre 2011 e 2012, foram arrecadados R$ 154,4 milhões das operadoras de planos de saúde por atendimento dos clientes no SUS. Não só. Nada menos de R$ 110 milhões foram inscritos na dívida ativa da União e serão cobrados na Justiça. O valor supera o registrado em uma década. Entre 2000 e 2010, foram recolhidos R$ 124,8 milhões.

A avalanche de reclamações procede. É, pois, bem-vinda a resposta do governo. O Ministério da Saúde anunciou medida capaz de inibir a desenvoltura com que o seguro adotou a prática. O plano terá de justificar por escrito — em até 48 horas — a negativa de procedimento médico. A providência talvez não resolva o drama enfrentado pelo cidadão, mas pode ajudá-lo na busca dos direitos. Com o documento em mão, é mais fácil acionar agências e órgãos de defesa do consumidor.

O Brasil tem 62 milhões de beneficiários de planos de saúde. Nem todos leem jornal, acessam a internet ou se interessam por noticiários de rádio e televisão. Impõe-se fornecer-lhes, por correspondência ou campanhas educativas, duas informações. Em primeiro lugar, de que a declaração não é automática. Precisa ser requerida. Em segundo, de que casos de urgência estão acima de qualquer recusa. Todas as emergências têm de ser atendidas.