Título: Conversas informais antes do conclave
Autor: Tranches, Renata; Amorim, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 06/03/2013, Mundo, p. 21

Às vésperas do início da reunião para a escolha do novo papa, cardeais intensificam negocioações de bastidores. Capela Sistina é fechada para o público

Após cinco dias de sede vacante no Vaticano, integrantes do Colégio dos Cardeais se engajaram ontem em conversações informais, na iminência da abertura do conclave que escolherá o sucessor de Bento XVI. Mais uma reunião preparatória foi realizada, com a presença de 110 dos 115 cardeais eleitores. Mas, ao fim do segundo dia das Congregações Gerais, a data de início do encontro ainda não foi anunciada — o que deve ocorrer quando todos os votantes estiverem em Roma. A Capela Sistina, que abrigará a reunião a portas fechadas, está interditada para visitantes e passará por adaptações. Os religiosos enviaram por telegrama uma mensagem de agradecimento ao papa emérito, que permanece recluso em Castel Gandolfo.

Inicialmente, estavam previstos dois encontros diários entre os cardeais em Roma até que a data do conclave fosse estabelecida. Mas, em explicações à imprensa, o porta-voz do Vaticano, padre Federico Felini, afirmou que as reuniões de ontem e de hoje seriam restritas a uma pela manhã, em um sinal de que os votantes terão mais tempo para se reunir informalmente. Os encontros e os diálogos não oficiais que antecedem o conclave, como explicou o coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC de São Paulo, Francisco Borba, podem ser mais decisivos do que durante o processo de escolha. “O conclave tem uma dinâmica que diminui muito o tempo para isso (conversações). É quase que praticamente a votação”, disse ao Correio. O objetivo, segundo Borba, seria minimizar ao máximo a possibilidade de manobras políticas internamente e deixar o momento para que “cada cardeal vote apenas em função da sua consciência, da sua relação com Deus”.

Em entrevista coletiva, o arcebispo de Boston, cardeal Sean O’Malley, ponderou que se não houver tempo para essas conversações durante as congregações gerais, o conclave poderá se arrastar. “Acho que a preferência deveria ser para termos suficientes discussões prévias, de modo que, quando as pessoas forem para o conclave, tenham uma ideia bastante boa sobre em quem vão votar”, disse, segundo a agência Reuters. Já para o cardeal brasileiro dom Raymundo Damasceno, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), há uma vontade entre os religiosos de acelerar esse processo. “Não há mais motivo para eles não estarem aqui. Por que ainda não chegaram?”, provocou, em conversa exclusiva com o Correio, referindo-se aos cardeais ainda faltosos.

Vatileaks Da reunião de ontem, participaram 148 cardeais, 110 dos quais com menos de 80 anos e, portanto, aptos a votar no novo papa. A expectativa é de que até hoje de manhã outros quatro eleitores desembarquem em Roma, faltando apenas um para completar o colégio eleitoral de cardeais. Os cinco brasileiros – dom Odilo Scherer (arcebispo de São Paulo), dom João Braz de Aviz (arcebispo emérito de Brasília), Geraldo Majella Agnelo (arcebispo emérito de Salvador), Cláudio Hummes (arcebispo emérito de São Paulo), além de dom Raymundo – estão no Vaticano desde o início das congregações gerais. Desde o fim de semana, dom Odilo vem ganhando força entre os principais nomes na disputa.

No segundo dia de reunião a portas fechadas, segundo agências e jornais internacionais, os cardeais discutiram os problemas da Cúria Romana (a burocracia vaticana) e o relatório secreto sobre o escândalo e intrigas na alta cúpula do Vaticano, no caso que ficou conhecido como Vatileaks. O documento seria um dos motivos da histórica renúncia de Bento XVI. Ao final da reunião, os cardeais enviaram ao papa emérito um telegrama de agradecimento por seu ministério e reconhecimento de toda a Igreja Católica. “Os Padres Cardeais, reunidos no Vaticano para as congregações gerais em vista do próximo conclave, lhe enviam suas devotas saudações”, dizia o texto.

Em um sinal de preparação para o conclave, a Capela Sistina foi fechada para turistas. Outras salas do imenso museu do Vaticano, como o apartamento Bórgia e a coleção de arte religiosa, poderão ser visitadas pelos turistas normalmente. A famosa capela, repleta de afrescos dos maiores artistas do Renascimento e localizada dentro dos museus do palácio apostólico na Cidade do Vaticano, deverá receber, pela primeira vez, duas chaminés, uma destinada à fumaça branca e, outra, à preta. O ritual é usado pelos cardeais para comunicarem ao mundo sua decisão após uma rodada de votação. Se não houver um consenso, a fumaça será preta. A branca indicará que já há um pontífice.

Lentes indiscretas Em seu retiro no Palácio Apostólico de Castel Gandolfo, onde está desde a formalização da renúncia ao pontificado, Bento XVI não escapou das lentes de paparazzi. A revista italiana Chi, do ex-premiê Silvio Berlusconi, publicou as primeiras imagens do papa emérito, enquanto passeava pelos jardins.

Carta dos cardeais a Bento XVI

À Sua Santidade O Papa Emérito Bento XVI Castelgandolfo

Os padres cardeais no Vaticano para a Congregação Geral, em vista do próximo Conclave, lhe enviam em um coro uma devota saudação com a expressão de renovada gratidão por todo o Seu luminoso ministério petrino e pelo exemplo de um generoso interesse pelo bem da Igreja e do mundo.

A sua gratidão (dos cardeais) é a intenção de representar o reconhecimento de toda a Igreja pelo Seu incansável trabalho na vinha do Senhor. Finalmente, os Membros do Colégio Cardinalício e toda a Santa Igreja confiam em suas orações.

Cardeal Angelo Sodano