Título: Cabral faz pressão
Autor: Almeida, Amanda; Abreu, Diego; Braga, Juliana
Fonte: Correio Braziliense, 08/03/2013, Política, p. 2

Um dia após o Congresso derrubar os vetos à lei dos royalties e decidir por uma divisão mais igualitária das compensações pela exploração do pré-sal, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, determinou ontem a suspensão de todos os pagamentos do estado, com exceção do salário dos servidores públicos, até que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue a constitucionalidade da norma. Por meio de nota, o governo afirmou que é uma medida preventiva, “em função da grave ameaça à solvência do estado decorrente da decisão” dos parlamentares. O resultado foi divulgado ontem e segue ao Planalto para que a presidente Dilma Rousseff o promulgue.

É mais um instrumento de pressão que o Rio usa para tentar reverter as perdas para o estado. Segundo o comunicado, entre 2013 e 2020, o Rio deve deixar de receber mais de R$ 10 bilhões, sendo R$ 4,7 bilhões a menos para os cofres estaduais e R$ 5,3 bilhões para os municípios. “Não consigo compreender o que leva a se tomar uma decisão desta, que não resolverá o problema de nenhum estado ou município, e leva à falência um governo estadual e muito de suas prefeituras”, reclamou Cabral.

Nos corredores do Congresso, parlamentares lembraram ontem que, em 1999, quando o então governador de Minas Gerais, Itamar Franco, declarou que não havia como pagar a dívida do estado com a União e decretou moratória, várias ações de bancos e de empresas europeias no país caíram, o Brasil perdeu credibilidade no exterior e acabou criando uma crise na economia nacional. O governo do Espírito Santo registrou que pode diminuir os investimentos em até 10%. “São bilhões e bilhões de reais. Há um claro desequilíbrio orçamentário”, disse o governador do estado, Renato Casagrande.

Para o ministro aposentado do STF Carlos Velloso, os magistrados não podem se pautar pelas pressões eventualmente exercidas por quem quer que seja. “O Supremo julga independentemente. A suspensão dos pagamentos é uma questão exclusivamente do governador e de seus credores”, afirmou.

Judiciário Os dois estados e São Paulo prometem entrar com ações diretas de inconstitucionalidade (Adins), porém não podem fazê-lo antes da promulgação da lei. Por ora, o Supremo já analisa mandados de segurança de parlamentares das bancadas. O ministro Luiz Fux, relator de dois deles, pediu informações ao Congresso. Ele disse que Adins que possam “acarretar em desorganização institucional” são apreciadas com celeridade pelo tribunal.

“Se o Supremo vier a julgar inconstitucional a lei, significa dizer que ela era inconstitucional desde o nascedouro”, alertou Fux. Na prática, se o STF derrubar a lei, os ministros poderão definir que a decisão passe a valer somente a partir do julgamento, o que evitaria, por exemplo, que algum estado não produtor tivesse que devolver recursos que eventualmente tenha recebido. A expectativa dos estados produtores é obter uma liminar que suspenda os efeitos da lei até uma decisão definitiva do Judiciário sobre o tema.

Quando perguntado sobre como é relatar os casos que envolvem um interesse do Rio de Janeiro, estado onde nasceu, Luiz Fux foi incisivo. “Isso é um argumento que não tem a menor procedência. Este é um tribunal de 11 pessoas. O problema de ser do estado ou não ser do estado não tem a menor importância”, afirmou o ministro, acrescentando que mora há 14 anos em Brasília.

Mandados Os parlamentares questionam a sessão tumultuada de quarta-feira, quando após muito bate-boca, as bancadas do Rio e Espírito Santo deixaram o plenário, reclamando do não cumprimento do regimento. Os principais pontos são os critérios de seleção de quais vetos seriam analisados — existem mais de 3 mil na fila — e da limitação do tempo de fala, que de 20 minutos o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), reduziu para cinco. Fazia parte da estratégia dos estados não produtores atrasar ao máximo a votação, colocando toda a bancada para aproveitar o tempo que dispunha na tribuna.

Na tarde de ontem, surgiu outra questão. O parlamentar Anthony Garotinho (PR-RJ) declarou que o deputado Zoinho (PR-RJ) não votou, mas seu nome e assinatura constavam na lista dos votantes. “Se isso aconteceu com ele, com quantos outros não pode ter acontecido?”, indagou. Garotinho pediu a lista à Mesa Diretora e anunciou que vai registrar um boletim de ocorrência.

O ministro da Advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams, esteve com Calheiros ontem pela manhã e, na saída, negou que a judicialização dos vetos cause uma insegurança jurídica nas concessões de exploração. “Só em relação à repartição. A rigor, a lei está dada, a regra está estabelecida.”