Título: Cenário global atrapalha
Autor: Pinto, Paulo Silva
Fonte: Correio Braziliense, 10/03/2013, Economia, p. 9

Várias pessoas ligadas à Petrobras no passado ou no presente atribuem os problemas da estatal a fatores conjunturais, incluindo a crise global. “Não é possível que isso dure para sempre”, diz o engenheiro Joel Rennó, que presidiu a estatal entre 1992, no governo Itamar Franco, e 1999, no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. “Os problemas da empresa são passageiros. Não me filio aos pessimistas”, afirmou ele ao Correio em seu escritório de consultoria no bairro carioca do Leblon.

Para o vice-presidente da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet), Fernando Siqueira, a situação da empresa nada tem a ver com as cores sombrias mostradas por analistas de mercado. Apesar disso, ele defende uma redução de cerca de 20% no montante previsto de investimentos.

Segundo Siqueira, do ponto de vista estratégico, não é preciso aumentar tanto a produção quanto a Petrobras planeja, algo que “só interessa aos países desenvolvidos”. Para o engenheiro, a opção deve ser “garantir que nossas reservas abasteçam o mercado interno por um período longo, nos próximos 30 anos pelo menos, enquanto poderemos encontrar substitutos para o petróleo”. As salas espartanas da associação ficam no 32º andar de um prédio no Centro do Rio, com vista privilegiada para a Petrobras.

Independentemente de ser favorável ou não à redução de investimentos, a revisão dos números da estatal pode se tornar inevitável. O analista da XP Investimentos Rossano Oltramari acha que isso deve ser feito o quanto antes. “É uma questão de transparência em relação aos investidores. A Vale reduziu a meta de investimentos e a Rio Tinto também, devido à redução do preço do minério de ferro. Por que a Petrobras não pode fazer isso?”, indaga.

A dificuldade está, de novo, no fato de que a maior estatal brasileira não tem apenas ambições corporativas. Recai sobre ela também a obrigação de ajudar a levar o país adiante. Não por acaso, está sob sua responsabilidade a maior parte dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Após assistir ao balanço do programa, no fim do mês passado, o diretor de Engenharia da Petrobras, José Figueiredo, afirmou ao Correio que o cronograma de investimentos para este ano será rigorosamente cumprido.

“Teremos novas plataformas em funcionamento, o que compensará os campos que já estão com a produção em queda e as paradas de manutenção em algumas plataformas. Com isso, a produção vai se manter no mesmo patamar de 2012”, diz Figueiredo. O Brasil produz, em média, pouco menos de 2 milhões de barris de petróleo por dia, o que praticamente coincide com o volume de consumo. Analistas questionam, porém, a qualidade desses investimentos, criticando desperdício em negócios, como a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, e em obras no Brasil, caso da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que deverá ser inaugurada neste ano.

Agilidade Não bastassem esses problemas, a Petrobras sofre outras limitações, que persistem mesmo quando ela é bem administrada. É o que acontece com a obrigação de se ater à lei de licitações. Como os projetos demoram muito para ser colocados em prática, a exigência tira agilidade da empresa. O ex-presidente Rennó discorda de que seja um problema grave. “Isso, de fato, dá trabalho, mas resolve-se trabalhando um pouco mais”, afirma.

Motta Veiga diz que a Petrobras vive seu grande momento na gestão de Henri Philippe Reichstul, que sucedeu Rennó. “Ela melhorou muito do ponto de vista gerencial e deixou de ser uma empresa de petróleo para se transformar em uma empresa de energia. Depois disso, involuiu”, critica.

A gestão de Reichstul foi tão orientada à maximização de lucros, que chegou a cogitar a mudança de nome da empresa para Petrobrax, algo que soa melhor para estrangeiros — em inglês, “bras” significa sutiã. Sob uma chuva de críticas, a diretoria teve de voltar atrás na mudança de nome. Indagado pelo Correio a respeito dos atuais resultados da empresa, Reichstul afirmou que está frustrado do mesmo modo que a atual gestão, e minimiza o problema: “O Brasil é assim mesmo, melhora um pouquinho, depois piora um pouquinho”.

Lastro

O professor da Fundação Getulio Vargas Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor financeiro da Petrobras, diz que não se pode esquecer das reservas de petróleo significativas. da companhia. “A empresa tem lastro”, afirma. Economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Freitas avalia que o governo terá de autorizar mais aumentos de combustíveis neste ano. Mas, de olho na inflação, não concederá tudo o que a empresa precisa.

Conta petróleo

A Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet) defende a criação de um mecanismo que permita ao governo subsidiar o preço do combustível, se considerar necessário, sem onerar a estatal. Isso era feito no passado pela conta-petróleo, extinta definitivamente em 2003, depois que uma auditoria reduziu em R$ 1,2 bilhão o montante devido pelo Tesouro à empresa.