Título: Corrida contra o tempo
Autor: Pinto, Paulo Silva
Fonte: Correio Braziliense, 10/03/2013, Economia, p. 9

Controle do preço dos combustíveis limita a capacidade da empresa de tirar do papel projetos de US$ 236 bilhões até 2016

A sete meses de completar 60 anos, a Petrobras vive um de seus maiores desafios. Não que sejam poucos os avanços acumulados em sua história. Ao ser criada, em 3 de outubro de 1953, pela Lei de Petróleo de Getulio Vargas, a empresa era só uma promessa. Hoje, tem tecnologia única para a produção em águas profundas, é dona de imensas reservas no subsolo e detém os frutos da maior capitalização já realizada no mundo, em 2010. Levantou R$ 120 bilhões no mercado, dos quais R$ 45 bilhões foram para o seu caixa.

Essas conquistas não foram suficientes para tornar confortável a vida da presidente da empresa, Maria das Graças Foster. A maior dificuldade é ter de atender ao mesmo a sociedade e seus acionistas. Isso nunca foi simples, segundo três ex-presidentes da empresa ouvidos pelo Correio. O patrimônio acumulado pela companhia é pouco para fazer frente a duas imposições do governo que, segundo analistas, são impossíveis de conciliar: um plano de investimentos de US$ 236,5 bilhões em quatro anos, até 2016, e a obrigação de conter o preço dos combustíveis na refinaria. “Há uma clara mudança do modelo econômico neste governo. Antes, se segurava a inflação por meio dos juros. Agora, pelo controle de alguns preços, incluindo o dos combustíveis”, assinala o diretor da consultoria Macroplan Alexandre Mattos.

Defasagem A situação não é inédita. Antes fosse. O maior problema é exatamente a época a que remete. Tempos em que decisões políticas destruíram valor da Petrobras e nem assim conseguiram segurar a carestia no país. O advogado Luís Octávio da Motta Veiga presidiu a estatal no início do governo de Fernando Collor, por apenas nove meses. Ele saiu da empresa ao se negar a atender exigências do empresário Paulo César Farias, e denunciou a existência de um esquema de tráfico de influência no Planalto. Mas ele conta, pela primeira vez, que o mal-estar começou com a imposição de valores de produtos abaixo dos necessários para a empresa pagar seus custos e investir.

“O Sarney já segurava os preços, e isso com a inflação chegando a 82% ao mês. Quando entrei, encontrei uma situação de grande defasagem. E, de repente, piorou: veio a Guerra do Golfo e o petróleo subiu muito. Mas o governo não queria que eu elevasse o valor do combustível. Eu vivia reclamando. Com a história do Paulo César Farias, a situação foi ficando insustentável”, revelou Motta Veiga em entrevista ao Correio, em seu escritório no Centro do Rio.

Do início da década de 1990 para cá, não foram poucas as vezes em que a Petrobras se viu obrigada a limitar a tabela nas refinarias para evitar impacto sobre outros preços da economia. Mas a questão vem assumindo proporções preocupantes por conta da inserção de um número cada vez maior de brasileiros no mercado. Entre 2000 e 2006, o consumo de combustíveis no país cresceu 5%. Entre 2007 e 2012, o aumento foi de 5% ao ano, segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP).

Em janeiro, o preço da gasolina teve aumento de 6,6% e o diesel, de 5,4%. Na semana passada, o óleo subiu mais 5%. Apesar disso, os dois produtos continuam com defasagens de, respectivamente, 13% e 18% em relação às cotações internacionais. Em 2011, a Petrobras perdeu R$ 10 bilhões por causa desse descompasso. No ano passado, foram R$ 23 bilhões. Neste ano, o prejuízo poderá se repetir. Se for assim, bem antes de dezembro terão ido pelo ralo os R$ 45 bilhões direcionados ao caixa da companhia após a capitalização.

Desinvestimento O vice-presidente da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet), Fernando Siqueira, afirma que a empresa é prejudicada pela alta margem que o setor de distribuição de combustíveis no Brasil detém sobre o preço nos postos. “É o dobro do que se vê em outros países”, critica. Além disso, ele diz que a Petrobras está pagando pelos incentivos concedidos à indústria automotiva. “O país não precisa de mais carros, nem mesmo a nossa infraestrutura urbana os comporta. O que precisamos é de mais transporte coletivo”, defende ele, engenheiro aposentado da empresa.

Como não se pode voltar atrás no número de veículos em circulação, a dúvida é o que fazer a partir de agora. O analista da XP Investimentos Daniel Noronha aposta na venda de ativos no exterior, que não deve se limitar à refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, a bola da vez. “Provavelmente, a empresa vai vender ativos no Golfo do México”, diz Noronha.

Na semana passada, a estatal satisfez parcialmente o mercado com elevação do preço do óleo diesel em 5% nas refinarias, provocando alta das ações.