Valor econômico, v. 21, n. 5116, 28/10/2020. Política, p. A8

 

“Equipe econômica não pode ter menos força que Centrão”

Vandson Lima

 Andrea Jubé

Renan Truffi

28/10/2020

 

 

Para senadora, falta de planejamento compromete reformas

A senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante do Senado, afirmou ontem, na “live” do Valor, que a desorganização do governo do presidente Jair Bolsonaro, em especial da equipe econômica, é a principal responsável pelo insucesso na aprovação de propostas estruturantes para o país.

“O principal obstáculo para a agenda econômica é a falta de planejamento da equipe econômica. Enquanto o governo não sinalizar como quer chegar nas propostas maiores, ficaremos dando desculpa de que o problema é a pandemia”, disse Tebet. Ela apontou que o afastamento da equipe econômica das negociações com o Congresso é prejudicial a reformas como a tributária e administrativa.

“O esqueleto tem de vir do governo federal. Reformas tributária, administrativa e PEC do pacto federativo tiveram mais obstáculos pela falta de planejamento do que pela pandemia. Falta da parte do presidente devolver a economia à equipe econômica”.

Nesse sentido, Tebet foi direta em dizer que a equipe econômica precisa ser fortalecida, com ou sem Paulo Guedes à frente dela. “Falta voltar a fortalecer a equipe econômica do governo. Se vai trocar o chefe, o Posto Ipiranga, não importa. Mas não pode ele ter menos força que o Centrão”, disse, sem poupar o grupo de críticas. “Falta entendimento de como funciona uma democracia. Não somos apêndices do Executivo. A sensação que tenho do Paulo Guedes é que falta entender a política brasileira, a democracia”.

Sobre a criação do Renda Brasil, a senadora criticou soluções como o aumento da carga tributária ou a legalização dos jogos de azar, o que já chegou a ser ventilado. “É inconcebível que a sorte de algumas pessoas matarem a fome de suas crianças dependa do azar de outras, com a legalização do jogos de azar. Sobre um novo imposto, vamos fazer a classe média pagar, quando nosso povo é o que mais paga impostos e a gente não taxa lucros e dividendos?”, questionou.

A possibilidade de prorrogação do estado de calamidade para pagar o auxílio emergencial em 2021 foi vista como problemática. “É uma forma sinuosa de fugir do limite do teto de gastos”. Para não deixar milhões desassistidos, Tebet disse que poderia se avaliar a extensão do auxílio emergencial por mais alguns meses. “Cabe até discutir, de repente, uma medida provisória em caráter extraordinário de dois ou três meses, com o compromisso de a partir de março termos um Renda Cidadã”.

Tebet disse que está segura de que o veto do presidente Jair Bolsonaro à extensão da desoneração da folha de pagamentos será derrubado pelo Congresso Nacional. Deputados e senadores tem sessão marcada para analisar o veto na próxima semana, dia 4. “Não tenho dúvida de que veto à extensão da desoneração será derrubado”.

O cenário é difícil para a aprovação de propostas mais ousadas, mas temas de consenso devem avançar. “Vamos ter pequenos avanços esse ano, como a autonomia do Banco Central. E dá para avançar na lei de falências”.

Uma eventual mudança legislativa que permita que o BC continue atuando na negociação de títulos privados - como debêntures, carteiras de créditos e certificados de depósitos bancários (CDBs) - vem sendo falada, mas não há decisão. Isso ocorre hoje por conta das autorizações dadas no âmbito do decreto do Estado de calamidade. “O BC precisa nos convencer. Tínhamos dificuldade de entender o quanto eles poderiam entrar no mercado secundário. Mas nada impede que em dois meses avance, se prestar contas do que foi feito”.

Considerada um dos nomes mais importantes do Senado atualmente, Simone Tebet admitiu que o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), é favorito caso concorra à reeleição, o que hoje não é permitido. A mudança para permitir a recondução, contudo, tem de ser feita pelo Congresso e via Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apontou a senadora.

Tebet rechaçou, assim, duas possibilidades que circulam nos bastidores da Casa: a de que a autorização da reeleição venha por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ou que, caso a Corte opine que se trata de assunto ‘interna corporis’, de deliberação do parlamento, o Senado faça a alteração por mudança no regimento.

A proibição à reeleição nas presidências de Câmara e Senado em uma mesma legislatura é prevista na Constituição. “Davi tem número para alterar a Constituição. O que não pode é mudar apenas pelo regimento. Essa decisão precisa ir ao plenário do Supremo e este dizer que se obedeça o devido processo legislativo. Só se muda Constituição com PEC”.