Valor econômico, v. 21, n. 5116, 28/10/2020. Política, p. A12
Com tom moderado, Boulos tenta vencer ‘fama de invasor de casa’
Carolina Freitas
28/10/2020
Candidato do Psol foi recebido por empresários para sabatina de duas horas de duração
O candidato do Psol à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, enfrentou ontem uma sabatina conduzida por empresários na Associação Comercial paulista, grupo com viés de atuação liberal. Apesar de perguntas espinhosas, como sobre de onde tira seu sustento, o professor e líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) adotou um tom moderado. Disse que o objetivo era desfazer “estereótipos” de que seria um “invasor de casas” ou um inimigo do setor privado. Sem elevar o tom de voz e mantendo o semblante sorridente, o candidato do Psol foi entrevistado por duas horas por dirigentes da associação.
“Minha trajetória é mais conhecida no movimento social do que como professor, o que me rende a fama de invasor, ‘vai tomar a casa dos outros’, dizem. Acho que essa é uma oportunidade de desmitificar isso”, disse o candidato do Psol.
Um dos coordenadores da ACSP disse a Boulos que o discurso dele estava tão “redondo” que ele parecia “até candidato de direita”. “Agradeço por dizer que o discurso está redondo. Justamente por isso ele é de esquerda. Isso não é característica da direita”, respondeu Boulos. “Talvez imaginassem que ia chegar aqui um cara com boné vermelho gritando ‘companheiros e companheiras’. Esse estereótipo tem a ver com o fato de que muitas pessoas não me conhecem ou me conhecem pela caricatura.”
Boulos tomou o combate à desigualdade como ponto de convergência com os empresários que o ouviam. “Minha trajetória é de combate à desigualdade. É bom para todo mundo. Ativa o comércio e a economia, deixa a cidade mais segura.”
O candidato do Psol prometeu, se eleito, manter o diálogo com a iniciativa privada. Deixou claro ser contrário às privatizações e ter críticas à forma como hoje são feitas as parcerias público-privadas (PPP), mas prometeu não “demonizar” o setor privado. Para Boulos, privatizar serviços públicos de saúde, educação e lazer os torna menos inclusivos.
“Não dá para pensar São Paulo sem diálogo com o setor privado”, afirmou. Para Boulos, incentivos fiscais são ineficientes para atrair investimentos. No lugar disso, ele sugere aquecer a demanda local, por meio do pagamento de renda solidária aos vulneráveis e geração de emprego em frentes de trabalho. “Ninguém vai investir em um lugar em que não tem gente com condições de comprar o seu produto. Fortalecer economicamente São Paulo e combater a desigualdade são coisas que coincidem.”
Outro sinal de moderação do candidato foi a forma como pretende tratar ações da prefeitura de que discorda. “Não tenho condições de desmontar a operação delegada, porque não tem o que colocar no lugar. Defendo que a Guarda Civil Metropolitana retome o papel que é jurisdição dela e isso é um processo de longo prazo. Precisa abrir concurso, equipar. Não acabarei em janeiro com operação delegada, da mesma forma não tenho condições de chegar e dizer que acabaram as OS que gerem equipamentos de saúde”, afirmou. “São processos de transição.”
No fim do evento, ao agradecer o convite para falar, Boulos disse que “democracia é a capacidade de conversar com quem discorda da gente”. “Vivemos um tempo no país em que a discordância descamba para a agressão. Não tenho objetivo de destruir ninguém.”