O Estado de São Paulo, n.46300, 23/07/2020. Política, p.A12

 

Centrão pressiona Maia contra ações da PF na Câmara

Vera Rosa

23/07/2020

 

 

Líderes querem que presidente da Casa recorra ao STF para impedir diligências em gabinetes, a exemplo do que fez Alcolumbre no Senado

Histórico. Rodrigo Maia diz que Câmara dos Deputados já recorreu de decisões da primeira instância em caso anteriores

Preocupados com as últimas ações da Operação Lava Jato, líderes do Centrão têm pressionado o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir buscas e apreensões da Polícia Federal em dependências da Casa.

A cobrança aumentou depois que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), conseguiu suspender diligência da PF, anteontem, no gabinete do senador José Serra (PSDB-SP). Alcolumbre acionou o Supremo e a decisão foi dada por Dias Toffoli, que comanda a Corte, expondo mais uma vez a polêmica sobre o alcance do foro privilegiado de parlamentares.

Na avaliação de deputados, está havendo "dois pesos e duas medidas" sobre o assunto. Um exemplo citado é que, no último dia 14, policiais federais cumpriram mandados de busca e apreensão na Câmara.

O alvo foi o gabinete do deputado Paulo Pereira da Silva (SP), o Paulinho da Força, presidente do Solidariedade, que, como Serra, é investigado em desdobramentos da Lava Jato. "Se a Câmara e o Senado permitirem esse tipo de coisa, vai virar uma festa", disse o deputado.

O Estadão apurou que a tendência da área jurídica da Câmara também é acionar o Supremo. Se um recurso sobre o caso for aceito, as eventuais provas recolhidas no gabinete de Paulinho da Força poderão ser anuladas. Segundo as investigações da Lava Jato, as campanhas do deputado em 2010 e 2012 tiveram caixa 2 de R$ 1,7 milhão. Paulinho nega a acusação, sob o argumento de que todas as suas contas foram aprovadas pela Justiça Eleitoral.

"A Câmara já tinha entrado contra decisões da primeira instância no caso da ex-deputada Simone (Morgado) e da deputada Rosa Neide", afirmou Maia ao Estadão. "Nos dois casos, tivemos liminares (do STF). Agora, estamos esperando o julgamento dos embargos pelo plenário", completou.

Sobrevivência. O Centrão reúne cerca de 200 integrantes e alguns de seus expoentes são réus no Supremo, como Arthur Lira (AL), que é líder do Progressistas e pré-candidato à sucessão de Maia, em 2021. O presidente Jair Bolsonaro fez uma aliança com o grupo, conhecido pelo apetite por cargos e verbas do Orçamento, para barrar eventual processo de impeachment, uma ameaça que vai e volta em um governo marcado por crises. Deputados do bloco, por sua vez, viram nesse casamento uma chance de sobrevivência política.

No Senado, onde o Centrão praticamente inexiste, Serra disse ter sido surpreendido pela operação em seu gabinete, classificada por ele como "abusiva". Para o senador, que afirma "jamais" ter recebido vantagens ilícitas em seus 40 anos de vida pública, a "espetacularização" tem permeado ações desse tipo no País. Denunciado recentemente por lavagem de dinheiro, Serra também é suspeito de ter recebido R$ 5 milhões durante a campanha de 2014 para o Senado, por meio de caixa 2.

No momento em que a Lava Jato está na berlinda, em guerra com a Procuradoria-geral da República (PGR) e com condutas questionadas por ministros do Supremo, os casos também revelam o desmoronamento dos principais partidos, que vão se enfrentar nas disputas municipais de novembro e nas eleições para o Planalto, em 2022.

Condenado na Lava Jato e enquadrado pela Lei da Ficha Limpa, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está inelegível e, a menos que consiga derrubar a proibição, não pode se candidatar tão cedo. Além disso, desde o mensalão, em 2005, vários quadros do PT acabaram abatidos por escândalos.

No PSDB, os três candidatos da sigla à Presidência – Serra, o deputado Aécio Neves (MG) e o ex-governador Geraldo Alckmin – foram alvejados pela operação.

Em breve, o STF vai revisitar a discussão sobre o foro ao analisar o caso do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-rj). Embora a ação não tenha ligações com a Lava Jato, trata-se de outro assunto que ganha os holofotes. Suspeito de se beneficiar de um esquema de "rachadinha" operado por Fabrício Queiroz quando era deputado estadual, o filho do presidente tenta garantir que a investigação fique na segunda instância da Justiça.

A "rachadinha" consiste no recolhimento de parte do salário dos servidores, sob coação, tendo como destinatário o parlamentar responsável pelo gabinete. Flávio diz que o empresário Paulo Marinho, suplente na chapa, está de olho em sua cadeira e por isso o acusa.