O Estado de São Paulo, n.46301, 24/07/2020. Metrópole, p.A20

 

Novo coronavírus entrou pelo menos cem vezes no país

Roberta Jansen

24/07/2020

 

 

Pesquisadores de 15 instituições dizem que maior parte dessas introduções ocorreu em voos internacionais em SP, RJ, MG e CE

O novo coronavírus entrou no Brasil de forma distinta pelo menos cem vezes – na maioria delas vindo da Europa. A maior parte dessas introduções foi identificada nas capitais com maior incidência de voos internacionais como São Paulo, Minas, Ceará e Rio de Janeiro.

Apenas uma pequena parcela dessas introduções, no entanto, resultou nas linhagens que se dispersaram por transmissão comunitária no País. Um novo estudo revela que 76% dos vírus detectados até o fim de abril se agrupam em três grandes grupos que foram introduzidos entre o fim de fevereiro e o início de março e se espalharam rapidamente pelo País, antes que as medidas de controle de mobilidade fossem iniciadas.

Os resultados foram obtidos por uma força-tarefa composta por pesquisadores de 15 instituições brasileiras (em conjunto com instituições britânicas), que realizaram o sequenciamento de 427 genomas do novo coronavírus SARS-CoV-2, de 21 no País. O estudo foi publicado na Science, ontem, com amostras colhidas de pacientes que testaram positivo para o novo coronavírus entre os meses de março e abril em 85 municípios. Tratase do maior estudo de vigilância genômica do covid-19 na América Latina.

"Para poder fazer uma vigilância epidemiológica eficiente temos de saber como o vírus chegou, como fio transmitido, quais cepas estão circulando e se estão sofrendo mutações", explicou Ana Tereza Vasconcelos, coordenadora do Laboratório de Bioinformática do Laboratório Nacional de Computação Científica LNCC/MCTI, onde as amostras foram processadas. "Vamos continuar fazendo esse trabalho para acompanhar a disseminação do vírus e eventuais mutações."

Nesse estudo, os pesquisadores combinaram também os dados genômicos do SARS-CoV-2 com dados epidemiológicos e de mobilidade humana para investigar a transmissão do covid-19 em diferentes escalas e o impacto das medidas de intervenção não farmacêuticas (INFs) no controle da epidemia no País. "Conseguimos demonstrar claramente que quando fizemos o isolamento social conseguimos diminuir a transmissão do vírus", constatou Ana Tereza. "Mas o isolamento foi parcial e acabamos saindo dele antes da hora."

Os resultados demonstram que as INFs, como fechamento das escolas e comércio no final de março, embora insuficientes, ajudaram a reduzir a taxa de transmissão do vírus (para quantas outras pessoas uma infectada transmite a doença) que foi estimada no início do período em superior a 3 para valores entre 1 e 1,6 tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro. O ideal para que não haja disseminação do vírus é que esse número esteja abaixo de 1.

Investigação

"Para poder fazer uma vigilância epidemiológica eficiente temos de saber como o vírus chegou, como foi transmitido."

Ana Tereza Vasconcelos

PESQUISADORA