O globo, n. 31832, 01/10/2020. Economia, p. 21

 

Desoneração: impasse prejudica planejamento de empresas para 2021

Carolina Nalin

01/10/2020

 

 

Setores intensivos em mão de Obra sofrem com falta de definição sobre veto. E difícil até estabelecer preço de calçados

 Com o impasse que se arrasta há quase três meses no Congresso em torno da desoneração da folha de pagamento, os 17 setores que mais empregam no país entram no quarto trimestre sem saber como fazer o planejamento tributário para o ano que vem. Para as empresas, isso significa não saber se fecham a encomenda de um caminhão ou que preço estabelecer para um par de sapatos.

— Onerar é ruim, mas não saber qual será o regime é ainda pior, porque nos tira a possibilidade de planejar o ano que vem. Os caminhões e ônibus que começam a rodar em 2021 precisam ser encomendados agora, mas as compras estão sendo adiadas — diz Vander Costa, presidente da Confederação Nacional do Transporte.

A desoneração não significa que a empresa deixa de pagar impostos, e sim que adota outro modelo. Por ela, 17 setores podem trocar a contribuição previdenciária de 20% sobre salários por uma alíquota de 1,5% a 4,5% sobre a receita bruta.

Esse regime acaba em dezembro deste ano. Em junho, o Congresso aprovou a prorrogação até o fim de 2021, a fim de preservar empregos em setores que são intensivos em mão de obra. O presidente Jair Bolsonaro, porém, vetou a medida, com o argumento de que fará a desoneração por meio da reforma tributária. Os parlamentares prometeram derrubar o veto, mas as sessões têm sido seguidamente adiadas em busca de um consenso com o governo.

RISCO DE DEMISSÕES

Segundo Haroldo Ferreira, presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados( Abi calçados ), o setor calçadista pode te rum aumento de R $570 milhões na carga tributária co mare oneração da folha.

—Teremos daqui a 45 dias a primeira feira física do país, onde os fabricantes estarão expondo os calçados para os lojistas. Mas qual será o preço dos produtos? A planilha de custos fica comprometida. As indústrias também estão finalizando o orçamento para o próximo ano, mas fica difícil pensar em ampliar o número de fábricas e investimentos com essa incerteza —pondera.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecções (Abit), Fernando Pimentel, também relata dificuldades para as empresas do setor se planejarem:

—O impasse gera uma profunda incerteza e uma dificuldade de organizar os orçamentos para 2021, inclusive na questão do valor dos negócios que já estão sendo firmados para o primeiro trimestre. Tudo isso reduz nossa competitividade no mercado mundial, aumenta os custos do mercado local e prejudica a manutenção e ageração de postos de trabalho.

A presidente da Federação Nacional de Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática (Feninfra), Vivien Mello Suruagy, prevê demissões caso a medida não seja prorrogada:

— A permanência do veto pode gerar uma redução de 300 mil trabalhadores de call center, 100 mil em infraestrutura de redes e telecomunicações e informática e cerca de 97 mil em TI.

Ela teme a possibilidade de o setor adiar novos investimentos, pois o planejamento demanda alguns meses:

— É necessário capacitar mão de obra, comprar equipamentos, pedir licenças... Estamos atrasando os investimentos e correndo riscos.

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Congresso adia análise de veto a alívio na folha

Marcello Corrêa

Manoel Ventura

Geralda Doca

01/10/2020

 

 

Segundo Alcolumbre, não havia quórum, mas parlamentares dizem que governo fez uma manobra por não ter votos suficientes

 O presidente do Senado e do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (DEM-AP), decidiu cancelar a sessão que analisaria o veto do presidente Jair Bolsonaro à prorrogação da desoneração da folha de pagamento, que beneficia setores intensivos em mão de obra. A justificativa oficial foi falta de quórum para a reunião, mas, segundo parlamentares, não havia votos para manter esse e outros vetos.

No comunicado, Alcolumbre citou a “inexistência de entendimento suficiente por parte das lideranças do Congresso Nacional sobre as matérias a serem deliberadas ”.

Além da prorrogação da desoneração da folha, estavam na pauta o pacote anticrime e os vetos ao Marco do Saneamento. Não foi definida uma nova data para análise dos textos.

A decisão foi tomada em cima da hora. Alcolumbre esperou até o último minuto por um acordo entre governo e Congresso, que não ocorreu.

Hoje ,17 segmentos da economia têm direito a trocara contribuição de 20% sobre salários por uma alíquota de até 4,5% sobre o faturamento. Mas essa regra só vale até dezembro. O Congresso aprovou a prorrogação desse prazo por um ano, mas Bolsonaro vetou. Apalavra final cabe aos parlamentares.

O impasse já dura mais de três meses. Inicialmente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, acenou coma possibilidade de uma desoneração ampla para todos os setores. Mas, para isso, seria preciso criar um imposto sobre transações, ideia que não tem apoio no Congresso.

‘IMPOSTO IMUNDO’

Ontem, ao comentar os dados de emprego, Guedes voltou a tocar no assunto:

—Gostaríamos, por exemplo, de desonerar a folha de pagamento, acho que é o mais cruel dos impostos, é o mais feio, é o mais imundo dos impostos, é uma arma de destruição em massa de empregos.

O senador Major Olímpio (PSL-SP) disse que a liderança do governo na Câmara dos Deputados orientou que os parlamentares não marcassem presença na sessão que apreciaria os vetos. A votação começaria pela Casa, de manhã, chegando ao Senado à tarde.

—Como o governo não tem uma proposta concreta para a desoneração da folha, vai empurrando com abarriga para ver se o problema desaparece, o que não vai acontecer. Isso é horrível para a sociedade e para as empresas, que não têm como se planejar para 2021— disse Olímpio.

Segundo o deputado Marcelo Ramos (PL-AM), não faltou quórum:

— O que faltou foi voto do governo para manter o veto da desoneração e da lei do saneamento—disse, ressaltando que havia quórum suficiente para instalaras essão.—É triste que esses interessesse sobre ponham à necessidade de dar segurança jurídica e previsibilidade para os 17 setores que mais empregam no país.

O cancelamento da sessão também foi criticado pela deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC). Em uma rede social, ela afirmou que o problema não foi falta de quórum, mas de voto.

“Falta de apoio mudou de nome e virou‘ falta de quórum ’. Governo não fala a verdade quando diz que suspendeu a sessão do Congresso por falta de quórum. Eles suspenderam porque não têm voto para manter o veto da desoneração. Vamos derrubar esse veto e ajudara garantir empregos .”