Título: Longa Preparação
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 09/03/2013, Mundo, p. 18

Foi uma semana marcada por 21 horas de reuniões preparatórias para um conclave histórico e muitas conversas reservadas sobre a situação da Igreja e, mais do que isso, sobre quem será o novo papa. Quando estavam livres dos compromissos no Vaticano, os cinco brasileiros que compõem o colégio cardinalício tentaram obedecer ao trivial da vida religiosa, com refeições em horários bem definidos, missas diárias, orações e leituras individuais, além do descanso.

A bancada brasileira na votação secreta marcada para começar na próxima terça-feira se conhece muito bem. Os cinco estão acostumados a Roma e são familiarizados com a metodologia dos encontros na Cúria. Embora aparentem encarar o atual momento com naturalidade, no entanto, os purpurados do Brasil não estiveram imunes da expectativa em torno dos desdobramentos das discussões a portas fechadas e da tão esperada definição do início do conclave.

Três dos cinco brasileiros são estreantes no processo de escolha do sumo pontífice: dom Raymundo Damasceno, além dos papáveis dom Odilo Scherer e dom João Braz de Aviz (o único que mora no Vaticano e pertence ao corpo administrativo da Igreja). Ainda que de maneiras diferentes, todos têm optado pela discrição nesses dias e, como a maior parte dos cardeais, evitado a imprensa. O Correio fez um resumo de como cada um deles passou o período de pré-conclave.

Os brasileirosOs brasileiros

Após passar o fim de semana em Assis (a 175km de Roma), dom Odilo começou o período pré-conclave como um forte candidato à sucessão de Bento XVI. Ele se consolidou como papável entre os vaticanistas, o que despertou o interesse da mídia internacional. De início, o arcebispo de São Paulo reagiu naturalmente ao burburinho. No meio da semana, em entrevista por e-mail ao jornal O São Paulo, da arquidiocese que comanda, deixou escapar críticas à imprensa. Hospedado no Colégio Pio Brasileiro com outros dois cardeais, chegava e saía carregando uma maleta preta com livros e anotações. Ele demonstrava tranquilidade e não se incomodava em posar para fotos tiradas por funcionários e padres que moram na casa de hospedagem. Durante as congregações, pediu que comprassem para ele um estudo escrito pelo papa emérito, um texto do falecido cardeal Agnello Rossi sobre a história dos conclaves e o elenco bibliográfico sobre o Concílio Vaticano II.

» Dom Cláudio Hummes

Como de costume quando viaja à capital italiana, o frade dom Cláudio Hummes está hospedado na casa da ordem franciscana em Roma, onde participou de missa todos os dias e fez a maior parte das refeições. Mesmo longe da movimentação em torno dos cardeais brasileiros que participarão do conclave, manteve contato com os compatriotas. Ele visitou, pelo menos duas vezes, o Colégio Pio Brasileiro, onde três deles estão acomodados. Em uma bolsa de apostas divulgada pelo The New York Times durante as Congregações Gerais, o nome de dom Cláudio apareceu em 17º na lista de 25 purpurados citados. Embora seja um homem extremamente culto e tenha uma consolidada trajetória religiosa — atualmente, integra a Pontifícia Comissão para a América Latina —, a idade (78 anos) diminui, nas condições atuais da Igreja, as chances de ele assumir o cargo máximo da instituição. » Dom João Braz de Aviz

O único dos cardeais brasileiros votantes que integra a Cúria Romana — e papável forte para alguns vaticanistas — adotou a lei do silêncio. Nas idas e vindas das reuniões preparatórias para o conclave, dom João cruzava a Praça de São Pedro, com terço em mãos, sem dar qualquer declaração a quem o abordava. Para evitar que o reconhecessem, tirava o solidéu e usava um longo sobretudo preto sobre a veste cardinalícia. Chegou a entrar a pé pela garagem do prédio onde mora, a poucos metros da Basílica. Seguranças eram rudes com quem tentava se aproximar dele. Na noite de quarta-feira, participou de uma missa no Colégio Pio Brasileiro, ao lado dos três cardeais brasileiros. Em uma das vezes em que visitou os colegas, pediu o apoio de batedores da polícia do Vaticano. Nas horas vagas, além das orações e das conversas com cardeais, dedicou-se a se atualizar sobre o estado de saúde do irmão, padre José Amauri de Aviz, recém-operado em Brasília. » Dom Raymundo Damasceno

O mais falante da bancada brasileira no conclave, dom Raymundo não hesitou em dar declarações no início da semana. Demonstrava bom humor sempre que questionado sobre a data do conclave. Afirmou, inclusive, estar com saudades de Aparecida, onde é arcebispo. Acostumado a lidar com a imprensa, uma vez que preside a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), não se incomodou em desmentir notícia veiculada na imprensa italiana de que não votaria em dom Odilo Scherer. "Não sei em quem vou votar, mas não disse que não votaria no senhor", dirigiu-se ao próprio dom Odilo, ainda na segunda-feira, quando voltavam do primeiro dia de reuniões. Em sermão, durante uma missa realizada no Colégio Pio Brasileiro, na noite de quarta-feira, reforçou aos padres presentes a importância de rezar pela escolha do novo papa.

» Dom Geraldo Magela

Antes do início das reuniões preparatórias para o conclave, dom Geraldo bateu perna nas ruas próximas ao Vaticano para fazer compras. Queria levar para o Brasil um miniprojetor multimídia portátil, mas não encontrou o aparato disponível nas lojas. Acabou escolhendo outros equipamentos eletrônicos e também incluiu no "carrinho" fotos de Bento XVI, com quem estivera no dia da oficialização da renúncia, urante o encontro de despedida do agora papa emérito com os cardeais. Ao longo a semana, o arcebispo emérito de alvador — o mais velho do grupo, com 79 anos — passou a maior parte do tempo livre recolhido no quarto onde está hospedado, na ala reservada a bispos do Colégio Pio Brasileiro. Nos dias em que havia congregações pela manhã e à tarde, om Geraldo aproveitava o intervalo para descansar.