O globo, n. 31835, 04/10/2020. País, p. 4

 

Bloco do eu sozinho nas eleições

04/10/2020

 

 

Um em cada três candidatos a prefeito no país não tem coligação com outro partido

 O fim das coligações para o Legislativo nestas eleições municipais teve como consequência o maior isolamento dos partidos. Levantamento feito pelo GLOBO nos 5.570 municípios brasileiros, com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), aponta que um em cada três candidatos não formou coligação para disputar o cargo de prefeito em novembro. Em quatro anos, as candidaturas solitárias saltaram de 16% para 35% do total.

O maior isolamento foi registrado por quase todas as siglas, mas atingiu em cheio as agremiações que polarizaram a última disputa presidencial: PT e PSL. Em mais da metade das cidades onde lançaram candidatos, essas legendas estão sozinhas. O percentual está acima do registrado por legendas como PSD, DEM e MDB, cuja taxa de isolamento gira em torno de 20%. É também quase o dobro de 2016, quando os petistas tiveram o pior resultado em uma eleição municipal em duas décadas. Especialistas e presidentes de partidos ouvidos pelo GLOBO ressaltam que, não podendo fechar chapas conjuntas para a disputa de vereador, agremiações que antes talvez fizessem alianças proporcionais em troca de apoio a chapas majoritárias tiveram menos estímulos este ano. A estratégia foi lançar candidato a prefeito para aumentar a chance de puxar votos na Câmara de Vereadores. O distanciamento das discussões travadas no plano nacional também influenciam no isolamento de legendas mais “ideológicas”.

 — Sem a possibilidade de coligação proporcional, deixa de ser interessante para legendas abrirem mão de lançar nomes próprios, que acabam sendo usados para alavancar candidaturas no Legislativo —explica Emerson Cervi, cientista político da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Os dados indicam, no entanto, que lançar candidato solo não costuma ser uma boa estratégia. Em 2016, apenas 109 candidatos se elegeram sem coligação. Destes, 98% em cidades com menos de 30 mil eleitores, 2% de todas as prefeituras do país.

DESGASTE E VAZIO

Presidente nacional do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) enfatiza que não foi apenas a esquerda que ficou mais fragmentada na corrida eleitoral, mas também a direita e o Centrão. —É como no futebol, não dá pra ganhar sem entrar com o time em campo. Dá mais visibilidade quando agente trabalha o número, o 13. Geralmente quem vota no 13 para prefeito tende a votar 13 para vereador —diz Gleisi. Especialistas citam, ainda, o fim da atratividade de PT e PSL, distantes da “caneta” do governo federal, responsável por obras e recursos, principal mentenos municípios pequenos.O PS L ficou aquém do potencial vislumbrado após a eleição de 2018, coma debandada do clãBol sonar o, apesar de candidaturas no Rio, São Paulo e Curitiba, e do lançamento de 731 candidatos, quatro vezes mais que em 2016.

Legendas que estão mais próximas ao poder, como PP e PSD, que hoje compõem a base de apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), acabaram ganhando maior capilaridade. Este ano, os dois desbancaram o PSDB da segunda posição na lista de partidos com mais candidaturas. Para Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD, a partir do fim das coligações proporcionais, as alianças que existirem serão mais alinhadas ideologicamente.

— O partido sabe que para ele crescer tem que investir no seus próprios quadros. Na minha visão, a mudança tornou o sistema partidário mais saudável. Atendência é que as legendas cada vez mais disputem com candidatura própria, com mensagens específicas para seus eleitores. Carolina Botelho, cientista política do Laboratório de Estudos Eleitorais, Comunicação Política e Opinião Pública da Uerj, acredita que, apesar da fragmentação, os prefeitos não devem sofrer com problemas de governabilidade.

—Os partidos vão se organizar de alguma forma. Há uma corrente que a hiper fragmentação é o problema, mas os dados mostram que isso não foi impeditivo de votar pautas importantes e se desenvolver. As alianças vão ser construídas em torno das pautas e das lideranças do partido —ressalta.

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Siglas aprovam vetos a alianças com rivais na disputa

Sérgio Roxo

04/10/2020

 

 

Efeito é só pontual e comandos partidários fecham os olhos para acordos locais que contrariam as determinações nacionais

Diante do acirramento da polarização política no país, comandos nacionais de partidos aprovaram resoluções para tentar impedir a concretização de alianças com legendas rivais nas eleições municipais. Porém, até agora, o artifício tem gerado efeito apenas pontual. Em alguns casos, a cúpula partidária decidiu fechar os olhos para os acordos firmados localmente. Em outros, foi estabelecido um conflito com o diretório municipal que deve ser decidido pela Justiça Eleitoral.

Um dos poucos casos até agora de interferência concretizada se deu em Itapirapuã Paulista, município de 4 mil habitantes, onde havias ido estabelecida uma chapa coma petista Sirlene Camargo como candidata e com Aguinaldo da Cruz, do PS L, de vice. Os diretórios estaduais do PS Ledo PT determinaram que a coligação fosse desfeita.

O comando nacional do PSL, porém, não aprovou nenhuma diretriz nesse sentido. Já o PT de São Paulo se valeu de uma resolução de fevereiro da executiva nacional. “O PT Nacional decide que não ocorram alianças com os partidos que sustentam o projeto ultraneoliberal (DEM, PSDB) e veta qualquer aliança com aqueles que representam o extremismo de direita”, afirma o documento. Mas apesar da resolução, alianças com essas siglas se concretizaram até em cidades com mais de 100 mil eleitores, onde a cúpula nacional monitora a formação das chapas.

Dos 199 municípios desse grupo, o PT está na mesma coligação que o DEM em oito, de acordo com um documento do Grupo de Trabalho Eleitoral petista com data do último dia 18. Com o PSDB, o PT tem sete alianças. Com o PSL também são sete coligações. O deputado José Guimarães (CE), coordenador do grupo de trabalho eleitoral do PT, diz que alguns acordos ainda podem ser revistos no diretório nacional.

— Esses casos específicos precisam ser analisados à luz da orientação da direção nacional. Mas eles estão longe de comprometer a estratégia eleitoral que nós montamos —afirmou.

A Executiva do PTB, comandada por Roberto Jefferson, aprovou, no começo de setembro, uma resolução proibindo alianças com 11 partidos (DEM, PSDB, PT, PSOL,PDT, PCdoB, Rede, PSB, PCB, PSTU e PCO). Visto como tentativa de Jefferson de agradar o presidente Jair Bolsonaro, o ato teve como justificativa a oposição do PTB “a partidos comunistas e socialistas”.

 Em São Bernardo e Osasco, na região metropolitana de São Paulo, o PTB indicou os vices dos petistas Luiz Marinho e Emidio de Souza, respectivamente. Apesar da resolução, as chapas foram registradas e os casos devem ser decididos pela Justiça Eleitoral.