Valor econômico, v. 21, n. 5121, 05/11/2020. Curtas, p. A17

 

Relação com Biden dependerá de ação ambiental no Brasil

Daniel Rittner

05/11/2020

 

 

Se o democrata vencer, EUA não vão buscar confronto com Brasil, mas vão querer medidas de proteção ao meio ambiente, diz presidente da AmCham no Brasil

A profundidade do relacionamento econômico-comercial entre Brasil e Estados Unidos, em um eventual governo Joe Biden, deverá ser ditada pelos resultados da gestão Jair Bolsonaro na área ambiental, mas não se espera nenhum clima de “confrontação” vindo da Casa Branca e os acordos bilaterais fechados recentemente não estão sob risco.

A avaliação é da presidente da Câmara Americana de Comércio (Amcham Brasil), Deborah Vieitas, que recomenda um discurso de boa vontade dos dois lados para afastar qualquer clima de desconfiança mútua. “Há sempre a possibilidade de gestos quebrarem as barreiras iniciais e acelerarem o processo de engajamento dos dois governos”, afirmou Vieitas, ao analisar um cenário de vitória de Biden nas eleições.

Ela pede esforços para preservar mecanismos governamentais e do setor privado - como o Fórum de CEOs, o Fórum de Energia, o Diálogo Comercial e o Diálogo de Parceria Estratégica - que funcionam como um canal direto de interlocução nas relações entre Brasil e Estados Unidos. Para a executiva, pode-se inclusive ter algum tipo de reorientação nesses fóruns, com mais enfoque em temas como energias renováveis e bioeconomia.

“Esses canais são muito importantes para trazer a voz da iniciativa privada à mesa de negociações”, acrescentou Vieitas, que está à frente da maior entre 117 câmaras americanas de comércio no mundo, com 101 anos de existência.

Isso dá ideia da força e do dinamismo das relações empresariais Brasil-Estados Unidos, segundo a executiva, que acabam funcionando como âncora de uma proximidade quase obrigatória entre seus governos. O Brasil é o maior destino das exportações da Flórida (absorvendo praticamente o dobro das vendas à China), seus investimentos nos Estados Unidos aumentaram 350% na última década e 100 mil americanos estão diretamente empregados em subsidiárias de multinacionais brasileiras.

Por causa dos benefícios às empresas de lado a lado, com redução de custos aduaneiros, ela descarta a possibilidade de que uma gestão Biden suspenda o acordo de facilitação de comércio assinado pelos dois países em outubro.

O documento precisa de aprovação legislativa no Brasil, mas não nos Estados Unidos, para entrar em vigência. Vieitas também não espera retrocesso no RDT&E, acordo de cooperação na indústria de defesa, que Washington só mantém com outras 14 nações.

“Existe a necessidade de nos prepararmos para a reconstrução de pontes. Ela passa pela questão ambiental, mas é um exercício de pragmatismo. Na definição de uma política externa para a América Latina, o Brasil tem posição estratégica. Tanto em termos geopolíticos como pela dimensão da nossa economia. Podemos construir uma relação de cooperação e compartilhamento de ideias.”

“O Brasil tem que seguir com uma diplomacia focada em resultados. Teremos a chance de desenvolver as relações bilaterais, que sempre estiveram aquém do seu potencial”, complementou.

Vieitas cita a intenção manifestada pelo vice-presidente Hamilton Mourão, de uma meta de reduzir em 50% o desmatamento na Amazônia até 2023, como possível referência para um trabalho conjunto. “Biden pode usar isso como uma moeda de troca, mas não eu acredito em confronto.”

Moeda de troca, no caso, seria um aceno sobre a possibilidade de ampliar a parceria econômica e até mesmo um acordo de livre comércio - algo que hoje, em um governo Biden, soa impossível diante da imagem negativa de Bolsonaro entre os democratas.

“Será um elemento de negociação dentro do relacionamento como um todo. Mesmo com [Donald] Trump, um acordo de livre comércio com os Estados Unidos não é e nunca foi fácil. Jamais tivemos a ilusão de que seria um caminho rápido. Mas, ainda que não haja a mesma empatia entre os presidentes, pode-se chegar lá com uma agenda pragmática e certo grau de ambição.”

Entidades como a US Chamber e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) já defenderam publicamente um tratado comercial.

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Bolsonaro mantém torcida por Trump

05/11/2020

 

 

O presidente Jair Bolsonaro reiterou ontem que torce pela vitória do presidente americano, Donald Trump, nos EUA e acusou o democrata Joe Biden de tentar interferir na autonomia do Brasil sobre a Amazônia. Em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro falou rapidamente sobre as eleições, após ser questionado se estaria interferindo no pleito. "Minha posição [favorável a Trump] é clara, isso não é interferência, tenho boa política com o Trump, espero que ele seja reeleito", respondeu. "O candidato democrata duas vezes falou sobre a Amazônia, aí sim uma interferência de fora para dentro". Bolsonaro argumentou ainda que os governos de seus antecessores não possuíam ligação com os EUA e somente ele conseguiu estabelecer um nível de "bom relacionamento".