Título: Enquanto isso em Brasília...
Autor: Marcos, Almiro
Fonte: Correio Braziliense, 12/03/2013, Política, p. 3

Se na Câmara dos Deputados a eleição do pastor Marco Feliciano (PSC-SP) para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) provocou uma série de reações negativas por conta de declarações homofóbicas e racistas do parlamentar, a Câmara Legislativa do Distrito Federal também registra a sua cota de polêmica. Mal foi eleito para comandar a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar local, na semana passada, e o deputado distrital Doutor Michel (PEN-DF) já fez declarações fortes em plenário e nas redes sociais. Ele dá a entender que bandidos não são dotados de humanidade e que, portanto, precisam ser combatidos. As posições duras causaram constrangimento entre os colegas.

Distrital de primeiro mandato, Márcio Michel Alves de Oliveira é delegado de Polícia Civil de carreira. Em 2010, fez boa parte da sua campanha baseada em um discurso que colocava o cidadão de bem de um lado e os bandidos de outro. Quando na atividade policial, acabou chamando a atenção na forma que chefiava delegacias na região Norte do DF, como em Sobradinho 2. “Era um delegado à moda antiga, que agia com força e truculência, mas reduzia a criminalidade. Isso lhe deu popularidade. Quando se candidatou, ele encarnou esse personagem e não o abandonou mesmo depois de eleito”, diz um deputado.

Doutor Michel, que trocou o PSL pelo PEN ao longo do mandato, ocupou a vice-presidência da Câmara Legislativa até o ano passado e foi parar na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Ética por indicação de seu bloco partidário (PEN e PSB). Por conta de seu dito passado truculento, o fato acabou contrariando até mesmo integrantes da base do governo, da qual faz parte. No entanto, como ninguém se candidatava para a função, o delegado assumiu a vaga sem titubear. No mesmo dia em que acabou eleito por unanimidade para a presidência da comissão, em 6 de março, o distrital declarou em plenário que iria exercer o mandato defendendo “os direitos humanos para os humanos”, e ainda publicou no Twitter: “Fomos eleitos presidente da Comissão de Direitos Humanos da CLDF, e vamos trabalhar com direitos humanos para os humanos!”, acrescentando um questionamento na publicação seguinte: “Será que bandido é humano?”.

“Guerra civil”

Em vez de abrandar o discurso, Doutor Michel manteve a linha. Em novas postagens, ele conclamou a comunidade da capital federal a fazer um levante contra a criminalidade (“estamos numa guerra civil, em que o cidadão está perdendo”) e defendeu penas mais rígidas. Em outra publicação no Twitter, dirigida ao também distrital Patrício (PT-DF), que é oriundo da Polícia Militar, o delegado deixou clara sua posição: “A polícia está prendendo, mas as leis são muito benevolentes, vamos à luta, camarada, bandido não pode ter beneficio”.

As posições causaram constrangimento em colegas de Câmara Legislativa. Na edição do último domingo, por exemplo, o Correio trouxe na coluna Eixo Capital uma frase do distrital Chico Leite (PT-DF), procurador de carreira do Ministério Público do DF, que é resposta à postura do delegado: “Muita gente que quer bandido pobre morto convida bandido rico para ser paraninfo de formatura, porque paga a festa”. Mas o petista não foi a única voz. “O Michel precisa entender que é um deputado e que precisa ter uma postura digna dessa posição. Afinal, é a imagem da Casa que está em jogo”, diz um distrital.

Doutor Michel é conhecido por não escolher palavras para utilizar, mesmo quando está em plenário. As frases ditas por ele, que muitas vezes levam os colegas de gargalhadas ao desespero, incluem termos tão chulos que o atual presidente da Câmara Legislativa, Wasny de Roure (PT-DF), pediu que trechos fossem editados para que não entrassem no registro histórico das sessões. O Correio tentou falar com o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Ética ontem, mas não obteve êxito.

Para saber mais

Investigação de denúncias

A Comissão de Direitos Humanos é um colegiado permanente das casas legislativas, mas tem títulos diferentes em cada uma delas. Na Câmara dos Deputados, é acrescido o termo “Minorias”, para destacar o atendimento a grupos sociais com menor representatividade, como negros e índios. Na Câmara Legislativa do Distrito Federal, o colegiado leva o nome de Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar. De acordo com o regimento interno de ambas as Casas, a comissão tem o papel de receber, avaliar e investigar denúncias relativas a ameaça ou violação de direitos humanos, apreciar projetos sobre o tema e tratar de assuntos referentes a minorias étnicas e sociais. O colegiado também organiza audiências públicas para debater esses assuntos e convoca autoridades para debatê-los. A diferença é que, na Câmara Legislativa, cabe também à comissão investigar deputados suspeitos de quebra de decoro parlamentar. No órgão nacional, essa função é exercida separadamente por um conselho autônomo.