Título: Um brasileiro e um italiano dominam os holofotes
Autor: Amorim, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 12/03/2013, Mundo, p. 14

Na véspera do início do conclave que elegerá o próximo papa, o gaúcho Odilo Scherer, 63 anos, arcebispo de São Paulo, chegou ontem para a última das reuniões preparatórias sob a atenção dispensada aos favoritos para suceder Bento XVI. De acordo com o jornal italiano La Stampa, dom Odilo — o mais cotado, porém não o único brasileiro incluído entre os papabili — já teria 25 votos entre os 115 eleitores. A escolha de um pontífice de fora da Europa, inédita em 2 mil anos da Igreja Católica, parecia ter como principal obstáculo o arcebispo de Milão, Angelo Scola, 72, que marcaria o retorno de um cardeal italiano ao Trono de Pedro, depois de 35 anos.

“A eleição de um papa é diferente da eleição de um líder político, para o qual é importante a proveniência, enquanto o papa, uma vez eleito, é cidadão do mundo, da Igreja”, analisa frei Evaldo Xavier Gomes, consultor jurídico e canônico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Garantindo que a nacionalidade não é o mais relevante no processo, frei Evaldo não esconde a torcida e afirma que a escolha de um brasileiro seria “uma festa e uma grande honra”. O padre Geraldo de Mori, vice-presidente da Sociedade de Teologia e Ciência da Religião (Soter), justifica a especulação em torno de dom Odilo pela necessidade de reformas na Igreja. “Há uma espécie de cansaço no catolicismo europeu”, observa.

A escolha de um não europeu não só refletiria a expansão da Igreja em outros continentes, como também sinalizaria um passo em direção a mudanças. Apesar da acentuada perda de seguidores, a descentralização do poder é um processo difícil, destaca o padre José Antonio Trasferetti, professor de teologia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Campinas. “A Europa ainda é muito centrada nela mesma. Acho que a tendência por um papa italiano ou europeu é muito forte”, salienta. Amigo e colega de dom Odilo, com quem estudou no fim dos anos 1980, em Roma, Transferetti ressalta as qualidades do brasileiro. “Ele foi um excelente estudante, muito amigo, muito competente intelectualmente e muito comunicativo. Seria um nome maravilhoso”, anima-se.

Dividindo atenções e especulações, o italiano Angelo Scola, contaria de início com o voto de 35 a 40 cardeais, o que demonstraria a resistência da Santa Sé. Para o professor de história Vincent Lapomarda, do College of the Holy Cross (Massachusetts), caso os cardeais não cheguem a uma decisão entre os favoritos citados até ontem, um cardeal menos cotado pode surgir como solução, a exemplo do que ocorreu em 1978, na eleição do polonês Karol Wojtyla, o papa João Paulo II. “Se Scherer e Scola forem incapazes de cruzar o limiar dos necessários dois terços, o argentino Leonardo Sandri, filho de italianos, pode obter a maioria. Se ele não conseguir, o canadense Marc Ouellet ou mesmo o americano Sean O’Malley podem emergir como preferidos”, arrisca.

Os especialistas são unânimes em observar que pesam na escolha do pontífice a formação doutrinária, o domínio de idiomas, a disposição para renovar e a habilidade para falar com uma comunidade muito ampla e diversificada de fiéis. “A Igreja Católica hoje é muito plural. Se os cardeais julgarem que é preciso um papa de ação, acho que dom Odilo se adequa muito bem”, opina Geraldo de Mori, da Sociedade de Teologia e Ciência da Religião. Não há, no entanto, um consenso sobre como seria a posição do brasileiro, em termos de política eclesiástica, caso venha a se tornar papa. Enquanto alguns apostam que ele seria mais liberal e aberto aos problemas enfrentados pela Igreja, outros duvidam que o arcebispo de São Paulo se diferenciaria dos líderes europeus. “Tudo depende de como ele exerceria o ministério”, completa.

Colaborou Renata Tranches

“ A eleição de um papa é diferente da eleição de um líder político, para o qual é importante a proveniência, enquanto o papa, uma vez eleito, é cidadão do mundo, da Igreja””

frei Evaldo Xavier Gomes, consultor jurídico e canônico da CNBB

“Olheiro” de Bento XVI

Recluso na residência papal de verão, em Castel Gandolfo, Bento XVI terá um “olho” no processo sucessório até o momento crucial em que os eleitores serão fechados na Capela Sistina. Na condição de prefeito da Casa Pontifícia, o arcebispo alemão Georg Gänswein, secretário pessoal do papa emérito, participará hoje da cerimônia que precede a procissão dos eleitores até o local do conclave.