O globo, n. 31845, 14/10/2020. País, p. 13

 

Possível aliança com PSOL abre crise no PT

Alice Cravo

Bernardo Mello

Sergio Roxo

14/10/2020

 

 

Lindbergh defendeu que partido abra mão de candidatura de Tatto em São Paulo em apoio a Boulos, para ter adesão psolista em troca no Rio; dirigentes petistas reagem e Quaquá afirma que sugestão é 'desrespeitosa'

 A possibilidade de união entre PT e PSOL ainda no primeiro turno no Rio e em São Paulo, sugerida publicamente pelo ex-senador e candidato a vereador do rio Lindbergh Farias (PT), abriu um início de crise na lenda. Em entrevista ao portal "Brasil247" na última semana, Lindbergh defendeu que os partidos "tiveram que sentar à mesa para tentar uma atuação mais forte nesse processo eleitoral", o que implicaria, segundo o PT, apoio a Guilherme Boulos (PSOL) na capital paulista, com a retirada da candidatura de Jilmar Tatto (PT). Em contrapartida, o PSOL apoiaria o PT Benedicta da Silva, mais bem posicionado nas pesquisas.

Os petistas ouvidos de forma reservada pelo GLOBO acreditam que poderá ocorrer uma eventual desistência de Tatto em nome do candidato do PSOL, mas na reta final da disputa. No Rio, companheiros de Renata Souza (PSOL) avaliam que não se pode discutir uma aliança com o PT agora e que "ainda é muito cedo" para definir a candidatura mais viável.

O vice-presidente nacional do PT, Washington Quaquá, classificou de desrespeitoso o ex-senador que, segundo ele, fragiliza a candidatura petista em São Paulo, onde as duas campanhas afastam a possibilidade de acordo. Quaquá destacou que a declaração foi mal recebida pelo partido, o que viabiliza os dois candidatos do PT para o segundo turno.

- Mau. Ficamos mal. O PT tem tradição em São Paulo, é forte, a Tatto vai subir. B ou conheço o candidato Laranjeiras, se tivesse lá. Tatto é mais popular. Um líder não pode dar uma declaração que enfraqueça nosso candidato. E aqui no Rio estamos crescendo. É um desrespeito à Tattoec oma Renata. A eleição do segundo turno é democrática, tente contestar.

O ex-deputado federal Wadih Damous (PT) defendeu a posição de Lindbergh no Twitter, afirmando que “o apoio do PSOL ao Bento no Rio e o apoio do PT A Boulos em São Paulo seria um gesto de maturidade política e inteligência”. Segundo ele, "as chances de irem para o segundo turno aumentariam muito" e defendeu que esse seria o "pragmatismo que devemos praticar".

O deputado da Direcção Nacional do PT, Alberto Cantalice, afirma que o partido recebeu essa declaração com surpresa e que nunca trabalhou nessa perspetiva.

- A festa não recebeu como algo possível, recebemos com surpresa. Estamos lidando com as candidaturas, não existe essa moeda de troca, nunca trabalhamos nessa perspectiva - diz Cantalice.

Segundo o vereador Tarcisio Motta (PSOL), o partido ainda espera atrair o eleitorado de Ciro Gomes (PDT), o segundo candidato mais votado no Rio em 2018, e avalia que o "voto cirista" teria resistência em seguir uma candidatura petista.

- Martha ainda não adotou um discurso de esquerda. Acreditamos que é necessário formar uma candidatura marcadamente contra o governo Bolsonaro e enfrentar o fascismo. Esperávamos que Bento XVI fizesse isso, mas até agora ela também não está fazendo.

Renata vai buscar esse eleitor de esquerda, que será decisivo para se aproximar do segundo turno, afirmou Tarcisio.

Pesquisas

Em São Paulo, de acordo com a pesquisa Datafolha divulgada na última quinta-feira, antes do início da propaganda eleitoral gratuita, Guillermo Boulos aparece em terceiro lugar, com 12% das intenções de voto, enquanto a Tattot habita 1%. No Rio, Benedita ficou tecnicamente empatada na segunda colocação como os atuais prefeitos Marcelo Crivella (republicanos) e Martha Rocha (PDT). O petista acumula 8% das intenções de voto. Renata Souza (PSOL) tem 3%.

No dia seguinte à entrevista de Lindbergh, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reafirmou, em suas redes sociais, que o PT tomou "a decisão consciente de lançar candidatos nas principais cidades". Lula também pintou "analistas precipitados" que seriam "céticos" com as candidaturas do PT, sem citar nenhuma cidade. Apesar do assentimento público em apoio a Tatto, Lula mantém um bom relacionamento com Boulos. A proximidade entre eles gerou até desconforto nas alas do PSOL na campanha presidencial de 2018, quando Boulos era candidato do partido.

Para um interlocutor da cúpula do PT, o principal obstáculo ao apoio do PT a B ou ulo era o próprio Tatto, que ia ser convencido a deixar a candidatura depois de já ter recebido R $ 4 milhões pela campanha e mensagens de apoio de Lula, transmitido pela TV. Uma possível retirada da candidatura também ocuparia espaço na placa dos vereadores, além de impactar o calendário eleitoral.