Título: Dom odilo: Tão perto, tão longe
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Fonte: Correio Braziliense, 14/03/2013, Sucessão no Vaticano, p. 1

Não foi a primeira vez que um brasileiro esteve entre os papáveis, mas o favoritismo de um cardeal do Brasil que antecedeu o último conclave nunca havia acontecido. O nome do arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, começou a ganhar força cerca de 10 dias antes da escolha e, desde então, não deixou mais a posição de forte concorrente. Mas, na avaliação de especialistas ouvidos pelo Correio, o mesmo motivo que fortaleceu a candidatura — a proximidade com a cúpula católica — pode ter custado a escolha.

A imprensa italiana vinha tratando dom Odilo como o candidato da Cúria. Mas ontem, um dos mais influentes jornais italianos, o La Reppublica, chegou a afirmar que, apesar de considerado uma das principais apostas, dom Odilo perdeu chances reais de competição após ganhar destaque sua proximidade com a Cúria Roamana. O episódio que teria anulado as chances do brasileiro ocupar o Trono de Pedro acabou sendo a defesa feita por ele do cardeal Tarcisio Bertone, secretário do Estado do Vaticano, diante de duras críticas proferidas por outros cardeais, relacionadas a escândalos financeiros.

O professor Roberto Romano, especialista em pontificado e cristianismo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acredita que o arcebispo era claramente o favorito da Cúria Romana. Para ele, a campanha midiática em torno do nome do brasileiro seria, inclusive, fruto da “máquina de propaganda” do Vaticano. Essa associação, reiterou o diretor do programa de Estudos Avançados em Ciência e Religião da Universidade Cândido Mendes, Luiz Alberto Gomez de Souza, “o queimou”. “Ele trabalhou na Cúria, é um homem muito próximo da estrutura atual da Igreja. Nesse sentido, o papa Francisco é mais aberto a mudanças”, afirmou Gomez.

O alinhamento de dom Odilo com o comando católico, segundo Romano, representava uma continuidade do poder centralizador vigente. Por esse motivo, ele não interessaria aos reformistas, que optaram por um cardeal que simbolizasse mais a mudança. “O que ele (dom Odilo) faria seria uma ação interna, de punição dos casos mais notórios de pedofilia, dos abusos do poder econômico, mas sem tocar na composição do poder”, avaliou o professor.

Sem a mesma força, nos conclaves de João Paulo I e de II, o cardeal brasileiro Aloísio Lorscheider foi bastante lembrado. Na escolha de Bento XVI, foi a vez de dom Cláudio Hummes. Romano lembrou que dom Cláudio chegou a ter o apoio discreto da Cúria, mas não era o favorito. “À época, havia uma série de alternativas internas da Igreja e da Europa. Agora, ficou complicado”, avaliou, considerando que, com o objetivo de manter o status quo no Vaticano, o atual poder estaria disposto a apoiar alguém de fora de Roma desta vez.