Valor econômico, v. 21, n. 5127, 13/11/2020. Internacional, p. A19

 

Trump quer impedir Estados de certificar vitória de Biden

Rebecca Ballhaus

Rebecca Davis O'Brien

13/11/2020

 

 

Estratégia poderia abrir caminho para uma reeleição de Trump no tapetão. Especialistas, porém, consideram improvável que a ofensiva jurídica do presidente possa ter êxito, a menos que existam evidências de fraude generalizada na votação

A campanha do presidente Donald Trump vem criando uma colcha de retalhos de ataques jurídicos em Estados-chave nos quais Joe Biden foi considerado vencedor nas eleições, no que é considerado um tiro no escuro para tentar impedir autoridades estaduais de certificarem os resultados, segundo assessores e advogados.

Assessores de Trump têm se mostrado mais incisivos nas conversas com o presidente nos últimos dias dizendo-lhe que não veem espaço para vitória, mesmo se os esforços jurídicos tiverem algum sucesso, segundo uma fonte da Casa Branca. Alguns outros assessores, no entanto, continuam dizendo ao presidente que ele ainda tem chance. Uma fonte disse que Trump compreende que a luta não pode ser vencida, mas descreveu o pensamento dele da seguinte forma: “Deixem-me lutar”.

Uma possível estratégia discutida pela equipe jurídica de Trump seria tentar conseguir ordens judiciais para atrasar a certificação dos votos em Estados cruciais, potencialmente posicionando os Legislativos estaduais controlados por republicanos para indicar delegados pró-Trump, que virariam o Colégio Eleitoral a seu favor, segundo fontes a par do tema.

Não se sabe até que ponto a campanha considerou essa ideia seriamente, disse uma fonte. Muitos de seus assessores e advogados duvidam que a tentativa teria sucesso e dizem que o objetivo do esforço em grande medida é satisfazer Trump, que acredita ter sido roubado na eleição e espera que sua equipe continue lutando.

Alguns dos assessores e advogados de Trump disseram que não há uma coordenação ou uma teoria legal abrangente por trás dos esforços da campanha. A batalha legal provavelmente acabaria com Trump dizendo que a eleição foi manipulada contra ele e que ele lutou contra o resultado, segundo a fonte da Casa Branca.

“Não acho que exista realmente uma estratégia coerente”, disse uma fonte republicana.

A campanha de Trump não apresentou evidências de fraude generalizada em qualquer um de seus processos.

Tim Murtaugh, porta-voz da campanha de Trump, disse que o principal foco do esforço jurídico é “assegurar que todos os votos legais sejam contados e os votos ilegais, não - não apenas nesta eleição, mas também para a integridade de todas as eleições no futuro”.

Mandi Merritt, porta-voz da Convenção Nacional Republicana, disse que há “centenas de relatos de irregularidades na eleição que merecem ser examinadas”.

Um integrante da campanha disse que estão preparando um programa jurídico Estado por Estado que emprega estratégias diferentes, dependendo das leis estaduais e dos processos de apuração.

A campanha de Trump entrou com ações na Pensilvânia, Michigan e Arizona, para pedir aos juízes que impeçam as autoridades estaduais de certificarem os votos. Um grupo jurídico conservador fez requerimento similar num tribunal de Michigan, onde um juiz deve tomar decisão nesta semana.

Se Biden tiver negados os 47 votos nesses três Estados, ele não terá a maioria no Colégio Eleitoral. Biden lidera com cerca de 50 mil votos (0,75%) na Pensilvânia, 146 mil votos (2,6%) em Michigan, e 13 mil votos (0,4%) no Arizona.

Poucos tribunais consideraram pedidos similares no passado, de forma que há poucos precedentes. Especialistas legais consideram improvável que juízes bloqueiem a certificação de votos de um Estado, a menos que existam evidências de fraude generalizada.

A campanha de Trump não apresentou evidências de fraude no Arizona e na Pensilvânia. Em Michigan, apresentou depoimentos de republicanos dizendo que foram assediados e excluídos à força das seções de apuração de votos enviados pelo correio e que testemunharam adulteração em muitos votos.

Na Pensilvânia, a campanha sustenta que o Estado não deu aos observadores acesso suficiente para fiscalizar a contagem dos votos e deu aos condados com inclinação democrata mais oportunidades para corrigir problemas nos votos enviados por correio.

Autoridades nos dois Estados defenderam seus processos eleitorais, sustentando que foram justos e não tiveram problemas graves. Democratas disseram que contestarão qualquer esforço para impedir a certificação dos votos.

A procuradora-geral de Michigan, a democrata Dana Nessel, disse que os processos no Estado têm por objetivo evitar que os resultados sejam certificados, na esperança de que o Legislativo republicano envie uma lista de delegados a favor de Trump. “Estamos preparados para combater isso”, disse em teleconferência na quarta-feira.

Perguntada sobre as tentativas da campanha de Trump de adiar a certificação em alguns Estados, a diretora jurídica da campanha de Biden, Dana Remus, disse na terça-feira: “Eles simplesmente não têm evidências, e, para que se tenha êxito num processo para interromper a certificação, é preciso haver evidências de problemas no processo.”

Na Pensilvânia, representantes do governo estadual disseram que a lei não permite ao Legislativo enviar um conjunto de delegados pró-Trump.

Em artigo em outubro em um jornal da Pensilvânia, líderes da maioria republicana na Câmara e no Senado estaduais, disseram que o Legislativo “não tem e não terá influência em escolher os delegados presidenciais do Estado ou em decidir o resultado da eleição”

Uma porta-voz do gabinete do procurador-geral da Pensilvânia, Josh Shapiro, democrata, disse que o governador Tom Wolf, também democrata, é quem irá certificar os delegados escolhidos pelo voto popular.

Uma porta-voz da secretária de Estado do Arizona, a democrata Katie Hobbs, disse que o órgão tem confiança de que certificará os resultados no devido momento. “Os tribunais do Arizona têm experiência de sobra em lidar e resolver processos relacionados às eleições, dentro de prazos estritos”, disse a porta-voz, Sophia Solis.

A própria família do presidente está dividida quanto até onde podem ir as tentativas de contestação legal. Seus filhos Donald Trump Jr. e Eric Trump pressionam para mantê-la como está, segundo fontes. Jared Kushner, assessor sênior da Casa Branca e genro do presidente, pediu que a presidente da Convenção Nacional Republicana, Ronna McDaniel, sinalize para o aparato do partido para que se envolva mais, de acordo com fontes.

A liderança republicana no Congresso tem apoiado a batalha legal de Trump. Alguns assessores veem os esforços como uma forma de manter a base de Trump engajada no segundo turno das eleições na Geórgia que determinarão o controle do Senado.