Correio braziliense, n. 20960, 12/10/2020. Cidades, p. 13

 

Á espera de um emprego, mesmo temporário

Cibele Moreira 

12/10/2020

 

 

As tradicionais vagas de emprego temporário ofertadas no final de ano devem sofrer forte impacto devido à pandemia da covid-19. De acordo com o presidente da Associação Comercial do Distrito Federal (ACDF), Fernando Brites, o cenário para este ano é de cautela. Para ele, a tendência é de que haja uma redução significativa nos postos de trabalho em relação ao mesmo período do ano passado. “O que se espera é que a gente tenha um Natal bom, mas não com muitos gastos, pois a economia anda muito retraída”, destaca ao Correio. No entanto, os brasilienses que estão à procura de um emprego, mesmo que temporário, não perdem a esperança de recolocação no mercado.

Sair das estatísticas de desempregados é o sonho de Edilene de Sousa Santos, 33 anos. Moradora do Riacho Fundo I, ela conta que vai tentar as vagas temporárias no final do ano para entrar no mercado de trabalho. “Fiquei 14 anos parada para cuidar dos meus filhos, agora que eles estão maiores, quero um emprego para compor a renda de casa”, explica Edilene, que tem experiência com vendas e serviços gerais. “Trabalhei muitos anos como freelancer, agora pretendo arrumar algo mais fixo ou até mesmo temporário. O que aparecer, estou aceitando”, destaca.

Ela afirma que a busca por um trabalho está difícil. “Estou entregando currículo desde o ano passado mas, com a pandemia, dei uma pausa e agora retornei. O mercado de trabalho fechado e, quando contratam, escolhem quem tem qualificação”, conta.

De acordo com levantamento feito pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Distrito Federal (Fecomércio-DF), cerca de 20,9% dos empresários sinalizaram que vão oferecer vagas temporárias neste ano. A expectativa é de 2.860 postos de trabalho para as vendas do Natal. No ano passado, nesse mesmo período, a oferta era de 3.094 (22,6%). A pesquisa ouviu 402 lojistas do DF de diversos segmentos, entre 20 e 27 de setembro.

Para Francisco Maia, presidente da Fecomércio-DF, apesar da baixa oferta de emprego em relação a 2019, o índice é positivo. “O Natal é sempre um momento mágico e uma das melhores oportunidades para a recuperação no fluxo de caixa. Por isso, alguns empresários aumentarão sua mão de obra e poderão efetivar trabalhadores temporários, o que é bom para a economia local e para a recuperação do mercado de trabalho”, completa.

De acordo com a pesquisa, 54,76% dos empresários vão começar a contratar a partir da segunda quinzena de novembro e 36,9%, a partir da primeira quinzena de dezembro. Os principais pré-requisitos apontados para o preenchimento das vagas são: flexibilidade de horário (33,04%); comportamento proativo (24,23%) e experiência prévia para o cargo (22,47%).

Demanda

Jefferson Macedo, diretor administrativo da rede de supermercado Super Veneza, conta que a quantidade de empregos temporários para o final do ano caiu mais da metade. Dos 200 que já chegou a contratar nas 10 lojas no Distrito Federal, este ano chega a 80 temporários. “Estamos com uma perspectiva mais modesta. Com um acréscimo de 5% no quadro de funcionários. Em anos anteriores, esse número era de 15% a 20%”, explica.

A expectativa de consumo também é mais retraída. Jefferson conta que entre os produtos sazonais, como tender, chester, peru, devem vender menos. “Ainda estamos em pandemia, então as grandes festas não vão ocorrer e isso deve impactar com uma queda superior a 30%. Trabalhamos com a redução desses produtos. No entanto, a gente torce para manter o nível de compra do ano anterior”.

Mesmo com a baixa oferta de temporários, Jefferson adianta que durante os últimos seis meses a rede contratou mais funcionários. “A venda on-line aumentou e tivemos que reforçar a equipe para atender à demanda, além de suprir aqueles que estavam afastados por serem do grupo de risco ou por estarem de atestado médico”, ressalta. Sobre a possibilidade de efetivação dos contratos temporários, ele afirma que a ideia é manter todos os eventuais contratados. Estão sendo ofertadas vagas para atendente, operador de loja, açougueiro, auxiliar de padaria, auxiliar de cozinha e menor aprendiz. A seleção é feita totalmente on-line, e os currículos podem ser encaminhados para o e-mail selecao.veneza@gmail.com.

A rede de brinquedos Ri Happy tem com uma perspectiva positiva, principalmente para o Natal. Após meses sem receber o público presencialmente, a loja aposta na contratação de temporários de forma tímida ainda. Na filial de Brasília, foram contratados mais 35 funcionários para dar suporte nas vendas para o feriado do Dia das Crianças. Parte deste quantitativo deve retornar em dezembro.

Esse cenário positivo não reflete em todo o comércio. Muitos estabelecimentos diminuíram a quantidade de funcionários para se adequar à realidade do momento e do pouco movimento. Redução na equipe e no horário foi a forma encontrada por muitos para se manter com as portas abertas. Com o fluxo de clientes pequeno, a loja Basic Collection, na 112 Norte, optou por manter o número atual de empregados, pois não há a necessidade de reforço. “Não está fácil, as pessoas ainda estão com medo e com mais resistência. Oferecemos as peças na página do Instagram e, em alguns casos, levando na casa da cliente, ainda assim está complicado”, relata a gerente Lourdes Bento Tavares. Para a Black Friday, em novembro, e as vendas natalinas, a expectativa é de que melhore um pouco.

Procura

Moradora do Sol Nascente, Marta da Silva, 52, relata que a pandemia dificultou o processo de procurar um emprego. “Antes tinha mais entrevistas, agora não. Mudaram até o jeito de trabalhar no Sine (Sistema Nacional de Emprego). Só os administradores que falam no grupo da rede social e oferecem vagas”, afirma.

Para sustentar a filha de 17 anos, Marta mantém-se com a renda que recebe como cuidadora de uma idosa aos finais de semana. “É melhor do que nada. Eu gosto de cuidar de criança e idoso e, no momento, é o que está me salvando”, acrescentando que está de olho nas vagas temporárias de final de ano. “Vou dar o meu melhor”, destaca. Marta tem experiência em auxiliar de cozinha, recepção, operadora de telemarketing e serviços gerais.

Economista e professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), Jorge Madeira Nogueira explica que este ano está sendo bem atípico e isso vai influenciar no comportamento de empregados e empregadores. “Tem uma porção de gente querendo uma vaga. Muitos perderam o emprego nos últimos seis meses do ‘fique em casa’. Várias lojas foram fechadas. Para quem está procurando, o cenário vai ser ruim. Os lojistas não sabem como será a reação dos clientes e com isso a oferta de trabalho será menor, por se tratar de um cenário de incertezas”, afirma.

Com pouca oferta e grande demanda, Jorge dá algumas dicas para quem quer se destacar na hora de disputar uma vaga. “Prepare bem o seu currículo, destaque aquelas habilidades que você tem. Outro ponto é: mostre-se flexível. Pessoas com disposição e capacitadas para trabalhar em diversos setores tendem a ter mais chances”, ressalta.

Retomada

Para o secretário do Trabalho do Distrito Federal, Thales Mendes, a tendência é de um aquecimento econômico a partir de novembro. “Muitos que deixaram de consumir nos primeiros meses de pandemia, agora, estão comprando. A expectativa é de que o cenário volte ao normal a partir do mês que vem”, relata. Sobre os postos de emprego temporário que serão abertos no final do ano, ele conta que há uma possibilidade significativa. “São esperados 30 mil postos de trabalho no final do ano, entre temporários e efetivos. No entanto, algumas empresas, que precisaram afastar seus funcionários durante o período em que os estabelecimentos ficaram de portas fechadas, devem optar pela recontratação”, pontua.

Thales ainda ressaltou a retomada do setor econômico que tem oferecido diversas vagas de emprego nas últimas semanas. “De junho a julho foram 34 mil ofertas de trabalho disponibilizadas nas Agências do Trabalhador. E de lá para cá esse número vem crescendo. Por dia são oferecidas mais de 500 vagas, e nas últimas semanas batemos o recorde com 904 postos de trabalho em aberto”, expõe.

De acordo com a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) divulgada pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), no mês de agosto o número de pessoas desempregadas na capital era de 293 mil — 3 mil a menos do que o registrado no mesmo período do ano passado quando houve 296 mil desempregados. Para Thales Mendes, o dado mostra um panorama positivo. “Estamos no mesmo patamar que antes da pandemia”, afirma ele, que acredita que dessa forma dá para alinhar ações para diminuir esse quantitativo.

Hora de reinventar-se

Confira as dicas do economista e professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília Jorge Madeira Nogueira para aumentar as chances de contratação

» Elaborar bem o currículo com as qualificações e experiências

» Destacar as habilidades

» Mostrar flexibilidade para atuar em outras áreas

» Não se preocupar na entrevista se o emprego vai ser permanente

» Foi contratado? Perceba as carências da empresa e mostre que pode supri-las

Onde procurar

Segmentos com a maior média de contratação por estabelecimento para esse ano de acordo com a pesquisa da Fecomércio

» Minimercado, mercearias e armazéns (7,5%)

» Calçados e acessórios (3,9%)

» Artigos de armarinho, suvenires e bijuterias (3,17%)

» Padaria e confeitaria (3,14%)

» Suprimento de informática (2,75%)

» Vestuário e acessórios (2,63%)

» Cosmético e perfumaria (2,25%)