Título: O ar que adoece
Autor: Camargos, Daniel; Fonseca, Marcelo da
Fonte: Correio Braziliense, 17/03/2013, Política, p. 6

A pequena Isabela, de 1 ano e 8 meses, não pode se aproximar de um nebulizador que começa a chorar. “Ela tem um pouco de trauma, pois ,desde recém-nascida, precisa ficar internada de dois em dois meses, para usar o aparelho, por causa de problema respiratório”, explica a mãe, Débora Aparecida Lobo. A criança mora no bairro Pires, o mais prejudicado pela poeira provocada pelas mineradoras.

A avó da pequena Isabela, Maria Aparecida Alves Lobo, reclama da água suja, contaminada com o pó. “Hoje cedo não teve como lavar roupa”, lamenta. Ela também se queixa que nem sempre a água entregue em galões é suficiente para beber, cozinhar e banhar as crianças.

O prefeito de Congonhas, Zelinho (PSDB), que foi secretário de saúde nas duas últimas gestões, avalia que o atendimento primário à saúde é bom, mas é preciso melhorar o atendimento de alta complexidade. “Eu não tenho dúvida de que a mineração prejudica a saúde, mas, por outro lado, é importante destacar que a população é dependente da atividade”, avalia.

Quem caminha pelas ruas do bairro e pergunta aos moradores sobre problemas provocados pelo pó de minério não tem dificuldade de encontrar um rosário de queixas. Janaína Ferreira aponta a filha Raíssa Ferreira, de 4 anos, com alergia e erupções na pele.

Marcilei de Oliveira veio de Barbacena, na Região Central do Estado, há 8 anos, para trabalhar como operador de caminhão em uma mineração e também convive com alergia e problemas da pele que começaram após a chegada a Congonhas. De acordo com a enfermeira do Posto de Saúde do Bairro Pires Janaíne Nogueira de Rezende, é comum os moradores apresentarem doenças respiratórias. “Acontece muito com crianças recém-nascidas, pois o pó do minério provoca um processo alérgico”, detalha a profissional.

A pensionista Maria Antônio Gomes chegou ao bairro há 45 anos e desde então percebe que a poluição piora. O filho mais velho dela, de 42 anos, tem grave problema de bronquite. Os netos de 16 e 11 anos apresentam sangramento nasal quase que diariamente. “Eu tenho rinite e muita dor de cabeça”, afirma Maria.

Os problemas estão presentes em todas as regiões da cidade. No Centro de Congonhas, a funcionária de uma farmácia, Jaqueline Modesto, mostra os produtos, muitos pretos de pó. “Mesmo fazendo limpeza constante, é impossível deixar tudo limpo”, afirma. A gari Arlete Terezinha varre as ruas da cidade há quatro anos e sabe o que dá mais trabalho: “O pó preto, de minério”. Por dia, segundo a prefeitura, são recolhidas sete toneladas de poeira das ruas da cidade.

No Bairro Praia, próximo ao sopé do Morro de Engenho, última barreira natural das lavras de minério Anderson Alves Silva lava o carro recém-comprado. “Tem que terminar de lavar e colocar na garagem, pois senão empoeira tudo de novo”, explica.

O Morro do Engenho é uma importante reserva ambiental com 29 captações de água, que responde pela metade do abastecimento de Congonhas.

Na eleição de 2008, a Galvasud S.A., empresa que pertence à CSN (hoje chamada de CSN/Porto Real), foi a maior financiadora da campanha no município, com investimento total de R$ 80 mil que contemplou todos os vereadores que tentaram a reeleição. No pleito do ano passado, a CSN não fez doações.

R$ 243,8 milhões Rendimento dos royalties do minério para o município de Congonhas (MG) nos últimos dez anos

R$ 4,8 bilhões Valor dos royalties do petróleo para o município de Macaé (RJ) no mesmo período