Correio braziliense, n. 20964, 16/10/2020. Política, p. 4

 

Barroso decide afastar político

Renato Souza 

16/10/2020

 

 

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o afastamento — inicialmente, por 90 dias — do senador Chico Rodrigues (DEM-RR), flagrado com dinheiro nas nádegas durante uma operação da Polícia Federal.

A ordem do magistrado será enviada ao Senado, que pode manter ou rever o afastamento. Não foi definido um prazo para que o Parlamento avalie a situação do político, no entanto, a tendência é de que isso seja feito na próxima sessão deliberativa.

De acordo com interlocutores do Supremo, o entendimento na Corte é de que o afastamento vale de imediato, tendo o Senado que decidir pela manutenção ou não da decisão. Barroso afirma que existe gravidade no fato e que o afastamento é necessário para que o caso seja investigado. “A gravidade concreta dos delitos investigados também indica a necessidade de garantia da ordem pública: o senador estaria se valendo de sua função parlamentar para desviar dinheiro destinado ao enfrentamento da maior pandemia dos últimos 100 anos, num momento de severa escassez de recursos públicos e em que o país já conta com mais de 150 mil mortos em decorrência da doença”, escreveu o magistrado.

Por meio da assessoria de imprensa, o gabinete de Barroso informou que o afastamento de Chico Rodrigues está em vigor até que haja decisão final do Senado.

Apesar de ressaltar a relevância dos fatos, Barroso negou a prisão do parlamentar. “Diante da não configuração de situação de flagrância e da fundada dúvida sobre a possibilidade de decretação de prisão preventiva, impõe-se o afastamento do senador da função parlamentar, de modo a impedir que se utilize de seu cargo para dificultar as investigações ou para, ainda mais grave, persistir no cometimento de delitos”, ressaltou.

Chico Rodrigues foi alvo de mandados de busca e apreensão cumpridos pela Polícia Federal, na quarta-feira, na casa dele, em Roraima. Durante as diligências, as equipes policiais flagraram o senador com R$ 33,1 mil na cueca.

As buscas ocorreram no âmbito da Operação Desvid-19, que apura desvios em recursos destinados ao combate à pandemia do novo coronavírus.

O congressista nega as acusações. “Vou cuidar da minha defesa e provar minha inocência. Volto a dizer: ao longo dos meus 30 anos de vida pública, tenho dedicado minha vida ao povo de Roraima e do Brasil e seguirei firme rumo ao desenvolvimento da minha nação”, escreveu, na internet.

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Conselho de Ética será acionado 

Bruna Lima 

Luiz Calcagno 

16/10/2020

 

 

As investigações que miram o senador Chico Rodrigues (DEM/RR), bem como a determinação do afastamento dele do cargo, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), impactaram parlamentares da Casa, em especial, os colegas de legenda. A articulação dos aliados é para que o investigado deixe temporariamente o mandato por iniciativa própria. Sem acesso ao processo, muitos preferiram manter a discrição ao comentar o caso.

O grupo Muda Senado, que inclui parlamentares de vários partidos, elabora uma representação por quebra de decoro parlamentar, a ser apresentada à Comissão de Ética, na próxima segunda-feira. Um dos integrantes do grupo, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que também é líder da oposição, anunciou em vídeo a iniciativa. Disse que a conduta do senador é “incompatível com a conduta ética e com o decoro”. Ele também declarou apoio à decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, de afastar o político, o que outros parlamentares rechaçaram.

Ex-aliado do presidente Jair Bolsonaro e integrante do Muda Senado, o senador Major Olímpio (PSL-SP) assinou a representação. Ele destacou que a ação visa dar oportunidade ao investigado de esclarecer os fatos na Casa. “É para ajudar e ter um estímulo para que o senador acusado tenha o direito e foro próprio para se defender e apresentar suas argumentações”, justificou. A iniciativa do Muda Senado, porém, revelou o calor dos ânimos. Apoiadores do chefe do Executivo destacaram que “alguns signatários” da representação contra Chico Rodrigues também respondem a procedimentos no conselho. “Vai passar o do Chico na frente?”, questionou um deles.

O presidente do Conselho de Ética do Senado, Jayme Campos (DEM/MT), disse que, antes de especular os próximos passos, é preciso aguardar o documento ser protocolado. “Se, eventualmente, encaminharem ao conselho ou aos setores competentes, aí vamos ver. Por enquanto, está nas mãos da Justiça, e um posicionamento de forma precipitada, antecipada, poderia não passar de mera especulação e juízo de valor. É necessário aguardar”, ressaltou.

A espera para uma apreciação no conselho pode ser longa, principalmente, porque precisa respeitar a ordem da pauta, que já prevê outras deliberações, paradas devido à pandemia. “É preciso respeitar o cronograma das denúncias. Sobretudo, porque há materiais acumulados pelo tempo em que as atividades foram interrompidas”, alegou Campos, colega de legenda de Chico.

DEM

Aliados de Bolsonaro pedem cautela e destacam que, primeiro, ainda não há acusação formal contra o senador e, segundo, ele precisa ter o direito de se defender. Uma das versões que correm é que o dinheiro teria procedência, que Chico Rodrigues não teria premeditado esconder os valores e que botou a soma na roupa em um momento de nervosismo. “Agora, temos que ouvi-lo. Por que não deixou o dinheiro na mesa, já que tinha origem?”, questionou Campos.

O DEM solicitou, ontem, ao STF, o acesso ao inquérito. “O ato tem como objetivo analisar eventual desrespeito aos princípios éticos do Democratas, previstos estatutariamente”, explicou o partido, por meio de nota oficial.

O Departamento Jurídico da legenda acompanha os desdobramentos. “Estamos atentos a todos os detalhes da investigação e, havendo a comprovação da prática de atos ilícitos pelo parlamentar, a Executiva Nacional aplicará as sanções disciplinares previstas no Estatuto do partido”, enfatizou a sigla. As medidas vão desde advertências à suspensão das atividades partidárias, expulsão e cancelamento da filiação.