Título: Ultimato ao PSC
Autor: Mader, Helena; Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 22/03/2013, Política, p. 2

Presidente da Câmara quer uma solução para a saída do pastor Marco Feliciano da Comissão de Direitos Humanos até terça-feira

Diante da crescente pressão pela renúncia do pastor Marco Feliciano (PSC-SP) do comando da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), deu ontem um ultimato ao comando do PSC: ele quer uma solução para o impasse até a próxima terça-feira. Existe um consenso de que a situação do pastor é insustentável, mas o partido ainda busca uma saída que minimize os danos e os desgastes causados pelo caso. Ontem, representantes do PSC evitaram falar sobre Feliciano, mas nos bastidores alguns ameaçam até mesmo deixar a legenda, caso o comando da sigla não encerre logo a polêmica.

Na última quarta-feira, o pastor saiu da Câmara alegando mal-estar com os correligionários. A equipe dele ficou reunida com o vice-presidente do PSC, Everaldo Dias, e com o líder da legenda na Câmara, André Moura. As tratativas se arrastaram até meia-noite, mas sem um consenso. A expectativa é que o pastor deixe o posto na semana que vem.

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, reafirmou ontem que o tema é uma de suas prioridades. Em meio a esforços para ampliar uma agenda positiva para a sua gestão, ele está insatisfeito com a repercussão extremamente negativa gerada pela presença de Feliciano. “Eu posso assegurar que esta Casa vai encontrar uma decisão em curtíssimo prazo. A Comissão de Direitos Humanos, pela sua importância, não pode ficar nesse impasse”, justificou o presidente. “Eu espero até no máximo terça-feira por uma decisão. Agora passou a ser também responsabilidade do presidente da Câmara dos Deputados”, acrescentou.

Henrique Alves argumentou que a presença do pastor atrapalha o trabalho da Câmara. “Virou um clima de radicalização que esta Casa não pode aceitar. Temos que primar pelo equilíbrio, pela serenidade, pela objetividade, pelo trabalho parlamentar. E do jeito que está, a situação se tornou insustentável”, concluiu o presidente da Câmara dos Deputados.

Caso Feliciano renuncie, ainda não há consenso sobre o que será feito. O PSC deve indicar outro parlamentar com perfil menos polêmico para o cargo. A vice-presidente da comissão, deputada Antônia Lúcia (PSC-AC), é alvo de uma ação do Ministério Público Eleitoral por compra de votos. Ela foi absolvida pelo Tribunal Regional Eleitoral do Acre, mas o MPE recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a decisão. O Ministério Público tenta mostrar que as interceptações realizadas pela Polícia Federal durante as investigações não são ilegais. Na última quarta-feira, o Ministério Público Federal no Acre entrou com ação de improbidade administrativa contra a deputada Antônia Lúcia e o marido dela, o deputado federal Silas Câmara (PSD-AM). Segundo a denúncia, eles teriam usado um celular funcional da Câmara para fazer campanha eleitoral.

Mobilização Nos últimos dias, os gabinetes dos parlamentares do PSC foram bombardeados por e-mails e ligações de eleitores contrários à manutenção de Feliciano. O endereço eletrônico de um dos deputados chegou a contabilizar 20 mil mensagens por dia e mais de 50 telefonemas, alguns até da França.

Ontem, um hacker divulgou pelo Twitter informações pessoais de Marco Feliciano na internet. O autor é o internauta que já havia divulgado em janeiro dados de condenados pelo mensalão, como o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o deputado e ex-presidente do PT José Genoino. O hacker, que se denomina como nbdu1nder, postou em sua página dados como o CPF, o endereço de São Paulo e de Brasília, a filiação, os telefones, o patrimônio, além de dados das empresas do pastor.

Parlamentares voltaram a subir à tribuna do plenário ontem para reclamar da presença de Feliciano. Augusto Carvalho (PPS-DF) disse que o pastor é um constrangimento para os colegas. “Já está passando da hora de o deputado tomar a decisão. Como até agora ele não teve um gesto de grandeza, só resta à presidência desta Casa afastá-lo”, afirmou. O deputado Amauri Teixeira (PT-BA) reclamou dos comentários homofóbicos de Feliciano. “A sociedade é diversa, contempla, abraça e acolhe todos”, argumentou o parlamentar.

Nas redes sociais, a pressão contra Feliciano cresce a cada dia. A ONG internacional Action Aid, que luta contra a pobreza, divulgou nota de repúdio à eleição do deputado. Segundo a entidade, “Marcos Feliciano na Comissão de Direitos Humanos é um insulto ao povo brasileiro”, diz a nota. “Acreditamos que a comissão tem uma função ímpar de lutar pelos direitos humanos, especialmente de pessoas que têm seus direitos negados e, muitas vezes, se encontram em situação de vulnerabilidade e pobreza.”

Outra manifestação que ganhou repercurssão nas redes sociais foi protagonizada pelo ator global Lázaro Ramos, durante a cerimônia de comemoração de 10 anos da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Seppir). Ele criticou o pastor que atualmente preside a Comissão de Direitos Humanos e gritou “Fora Feliciano”.

Colaboraram Adriana Caitano e Juliana Colares

Cronologia de uma crise

27 de fevereiro Líderes dos partidos se reúnem para discutir a distribuição das comissões e, por acordo, a de Direitos Humanos e Minorias é destinada ao PSC. O PT, que tradicionalmente liderou esse colegiado, abriu mão da vaga para beneficiar a legenda que está na base de apoio do governo Dilma.

28 de fevereiro O PSC anuncia a indicação do deputado e pastor Marco Feliciano, de São Paulo. Movimentos de defesa dos direitos humanos e a imprensa mostram que o pastor estava ligado a uma grande polêmica desde 2011, quando escreveu em uma rede social que o amor entre pessoas do mesmo sexo levava “ao ódio, ao crime e à rejeição” e que os descendentes de africanos seriam “amaldiçoados”.

7 de março Marco Feliciano é eleito para a presidência da Comissão de Direitos Humanos. Ao todo, 12 deputados participaram da sessão e o pastor obteve 11 votos —– o restante foi em branco. Seis parlamentares do PT, PSol e PSB abandonaram a sessão em protesto e não participaram da votação. O deputado Domingos Dutra (PT-MA), que até então presidia a comissão, renunciou ao cargo e abandonou a reunião.

9 de março O Correio publica uma reportagem mostrando que o pastor Feliciano fez uso de seu mandato parlamentar em benefício de suas empresas. Ele usou dinheiro da Câmara para contratar funcionários que trabalham em seus negócios particulares, como o produtor de seu programa de TV e o advogado que defende sua empresa. Na tarde do dia 9, protestos contra Feliciano ocorrem em todo o país. Militantes de cidades como Brasília, Rio de Janeiro (foto), Salvador, Fortaleza, Porto Alegre, Curitiba e Florianópolis fazem manifestações para mostrar descontentamento com a eleição de Feliciano.

13 de março Feliciano preside sua primeira sessão na Comissão de Direitos Humanos em meio a muitos protestos no Congresso. Centenas de militantes foram ao plenário da comissão para tentar participar da reunião, mas muitos foram barrados. Os que conseguiram entrar no colegiado fizeram muito barulho, atrapalhando o andamento da sessão. Parlamentares contrários a Feliciano mais uma vez abandonaram a reunião e alguns quase saíram no tapa.

20 de março Em sua segunda sessão na Comissão de Direitos Humanos (foto), Feliciano abandona a reunião depois de apenas oito minutos. Mais uma vez, militantes gritam palavras de ordem contra o pastor e pedem a sua renúncia. Deputados criam a Frente Parlamentar dos Direitos Humanos, para tentar atuar paralelamente ao colegiado oficial. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), pede ao PSC uma saída para o impasse e representantes do partido prometem uma solução em poucos dias.

Cota parlamentar chega a R$ 34 mil A Diretoria-Geral da Câmara dos Deputados concluiu ontem o estudo encomendado pela Mesa Diretora sobre o reajuste da cota de atividade parlamentar e do auxílio-moradia. O cotão, que hoje varia entre R$ 23 mil e R$ 34 mil, dependendo do estado de origem do deputado, passará a ser de R$ 25 mil (DF) a R$ 38 mil (RN). Já o benefício pago para quem não mora em apartamento funcional aumentará de R$ 3 mil para R$ 3,8 mil, mesmo valor recebido pelos senadores. Os dois reajustes devem começar a valer em abril e terão um impacto total de R$ 22 milhões, além dos R$ 7 milhões a serem gastos com a criação de 48 cargos. A Mesa Diretora argumenta, no entanto, que os custos serão compensados pela economia estimada de R$ 49 milhões feita com o fim do pagamento dos 14º e 15º salários aos parlamentares e a mudança no controle de presença dos funcionários, com a implantação do registro de ponto eletrônico a todos os funcionários e a restrição das horas extras.