Correio braziliense, n. 20975, 27/10/2020. Cidades, p. 18

 

GDF recorre de decisão

Caroline Cintra

Cibele Moreira 

27/10/2020

 

 

O Governo do Distrito Federal (GDF) recorreu da decisão da Justiça que determinou ao Executivo local o retorno das aulas presenciais nas escolas públicas. O recurso foi encaminhado ontem, pela Procuradoria-Geral do DF. Na avaliação do governador Ibaneis Rocha (MDB), não há condições de proporcionar um ambiente sanitário seguro dentro do tempo estipulado.

"O número de escolas é muito elevado e seria necessário um investimento grande em equipamentos de proteção", destacou Ibaneis. "É muito simples para o Ministério Público determinar o retorno sem saber o impacto que isso vai causar na vida das pessoas. Mais uma vez o Judiciário querendo governar", pontuou o chefe do Executivo, em evento de inauguração do Centro Especializado de Saúde da Mulher (Cesmu), na manhã de ontem.

Na última sexta-feira, a Justiça determinou que o GDF apresentasse um plano de retorno às aulas presenciais nas creches e escolas de ensino infantil, fundamental e médio da rede pública de ensino, de forma escalonada, com um prazo de execução em 20 dias. Porém, a notícia não foi bem recebida pelo Executivo local, pelos sindicatos e pelos pais de alunos.

A decisão ainda divide opiniões. Para a Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do DF (Aspa), a volta às aulas é uma necessidade. O presidente da associação, Alexandre Veloso, afirma que muitos alunos não se adaptaram ao ensino remoto e outros não tiveram acesso à internet. Para não prejudicar esses estudantes, as aulas presenciais, mesmo que de forma parcial, é uma alternativa a se pensar, de acordo com a Aspa. "A associação entende que é importante esse retorno, mas tem de ser feito com cautela. Quando o governo chega e assume que não há condições de viabilizar o retorno, a gente não vai ser irresponsável de afirmar o contrário. Porém, é preciso pensar e mobilizar um plano para quem não está conseguindo acompanhar no ensino remoto", destaca Veloso.

Professora da disciplina de Vigilância Sanitária, do curso de Farmácia da Universidade de Brasília (UnB), Izabel Cristina Rodrigues da Silva, 42 anos, afirma que não vai mandar a filha de seis anos, caso o ensino público retorne com as aulas presenciais. "Não estou segura se as escolas têm condições de promover um ambiente seguro contra a covid-19. Não dá para se ter um planejamento dessa dimensão em 20 dias. Tenho acompanhado de perto, e não há equipamento de proteção individual (EPI) suficiente para suprir a demanda", relata. De acordo com ela, o retorno tem de ser pensado de forma consciente. "Cadê as estatísticas das contaminações nas escolas particulares? Há um estudo que embase essa decisão para as escolas públicas?", questiona.

Em mensagem enviada aos gestores da rede pública de ensino, o secretário de Educação do DF, Leandro Cruz, pediu paciência. "Gostaria que toda a rede ficasse tranquila e confiasse, como confiou na primeira fase, em que garantimos que a nossa primeira preocupação seria a preservação da vida", disse. "Temos muita confiança de que, a Justiça ao ler nosso recurso e ter ciência de toda a complexidade que envolve esse retorno, teremos uma resposta positiva", acrescentou.

O Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF) afirmou que está acompanhando a situação e que vai fazer o possível para impedir o retorno das aulas presenciais nas escolas públicas neste ano. Para o sindicato, a decisão da Justiça é irresponsável.

 Rede particular

O primeiro dia de aulas presenciais para alunos do ensino médio das escolas particulares do Distrito Federal foi marcado por salas vazias e baixa adesão. Os estudantes do 1º ao 3º ano retomaram as aulas presenciais ontem. De acordo com o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinepe-DF), dos 28 mil matriculados nessa etapa na rede privada, aproximadamente 9 mil devem retornar às atividades esta semana para encerrar o ano letivo em cerca de 60 colégios.

Apesar do modelo híbrido — com aulas presenciais e on-line — ser uma realidade nas escolas particulares, a adesão dos estudantes é pequena. Ontem, o Correio esteve na porta de algumas escolas e registrou pouco movimento. No Centro Educacional Sigma, na 912 Sul, alguns alunos chegaram mais cedo. Antes das 7h, vários deles já estavam na porta da unidade. A abertura dos portões ocorre às 7h15. Ao todo, a escola tem 1,7 mil alunos no ensino médio. Porém, apenas 20% devem retornar presencialmente esta semana.

Segundo a coordenadora pedagógica do ensino médio da unidade, Gláucia Brito, estudantes do 2º e 3º ano são maioria no primeiro momento. "Acredito que, ao longo da semana, os pais sintam mais segurança e mandem os filhos para a escola. Uma coisa é ouvir os outros falarem que a escola está seguindo os protocolos certos, outra coisa é eles presenciarem. Então, estamos confiantes de que nos próximos dias mais alunos retornem", disse Gláucia.

Aluna do 3º ano, Ana Luísa Pires, 18 anos, contou que estava ansiosa para voltar à escola e rever os amigos. O encontro foi bastante diferente, sem abraços, com apenas demonstrações de carinho a distância. "Estou me sentindo segura, está tudo afastado. Com os amigos está sendo só olho no olho e dando pulos de alegria. Já demos várias risadas e me sinto recompensada", afirmou a jovem. No Colégio Objetivo, na 706 Norte, o diretor Ricardo Basílio esperava entre 20% e 30% dos alunos do ensino médio. A realidade, no entanto, o surpreendeu. "Não recebemos nem 10% dos estudantes", afirmou. A expectativa é de que ao longo da semana aumente a quantidade. "Pode ser pelo primeiro dia. Talvez os colegas em casa, que continuam tendo aula, queiram aderir. Aqueles que se habituaram ao remoto dificilmente voltarão", disse.