Correio braziliense, n. 20978, 30/10/2020. Economia, p. 7

 

Guedes diz que nova CPMF "está morta"

Augusto Fernandes 

Marina Barbosa 

30/10/2020

 

 

Enquanto a equipe econômica do governo busca fazer a classe política aceitar a criação de um imposto sobre transações digitais, o ministro da Economia, Paulo Guedes, se irritou durante uma audiência no Congresso Nacional ao ouvir críticas de parlamentares ao tributo. Em tom de ironia, ele disse, que, como o Congresso não está disposto a falar sobre impostos alternativos por conta das eleições, ele também já pensa em não discutir mais sobre o assunto.

"Quem sabe, eu tenho que parar de falar desse imposto mesmo. Inclusive, estamos em véspera de eleição, e quero declarar o seguinte: considere esse imposto morto, extinto. Quando ele foi mencionado a primeira vez, caiu o secretário da Receita. Agora estamos em plena campanha eleitoral e ninguém quer discutir esse troço. O ministro da Economia vai falar disso? Esquece. Esse imposto não existe", reclamou Guedes, visivelmente irritado.

Antes dessa declaração, o ministro havia dito que a implementação de um novo tributo era necessária para compensar a desoneração da folha de pagamento dos 17 setores produtivos que mais empregam no país. Mas, diante das resistências ao imposto, disse que não pode apoiar a proposta de desoneração. E jogou a responsabilidade para o Legislativo. "É privilégio do Congresso fazer esse tipo de coisa. Eu não posso apoiar, eu quero saber de onde vai vir o dinheiro. Como não tenho fonte (de recursos), enquanto não aparecer esse dinheiro, eu não posso aprovar a desoneração", afirmou.

Uma medida que desonera a folha de salários desses setores perderá validade no fim deste ano, e o item de um projeto de lei que prorroga o benefício até dezembro de 2021 foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro, por recomendação de Guedes. O veto, porém, deve ser avaliado pelo Congresso na próxima semana, e pode ser derrubado. Sem o novo tributo, o ministro disse que continua apoiando o veto.

Irritado, Guedes ainda afirmou que a classe política vai precisar dar uma resposta ao aumento do desemprego e à pressão dos setores que correm o risco de ser reonerados em breve. "Essa resposta quem tem é só o Congresso. Eu sou só uma ferramenta empurrada de um lado para o outro", alfinetou.

Guedes rechaçou qualquer semelhança do imposto dobre transações digitais com a antiga CPMF. "Há um futuro digital chegando. O Brasil é a terceira ou a quarta maior economia digital do mundo. Nós vamos ter que ter o imposto digital mesmo. Aí você fala: querem aumentar imposto? Não. Nós vamos diminuir os outros, nós vamos simplificar os outros, nós vamos desonerar a mão de obra. Nós estamos indo para um futuro melhor", disse.
"Nós achávamos justamente que, talvez com a criação desse imposto alternativo, nós desoneraríamos todos e para sempre e por mais tempo. Só que tanto lobby foi feito, tanta coisa foi criticada, tanta interdição aconteceu que, de uma forma simplesmente, digamos assim, pacificadora, principalmente em véspera de eleições, eu cheguei a dizer: Eu desisto desse imposto aí. Fica todo mundo calmo. Não tem mais imposto, não tem desoneração. A gente vive aí com esses 30, 40 milhões de desempregados, como sempre vivemos'", ironizou o ministro.

Bolsonaro
Na noite de quarta-feira, o presidente Jair Bolsonaro afirmou, ao contrário de Guedes, que a proposta em estudo pelo Ministério da Economia para a criação do encargo tem como modelo a CPMF. Segundo o presidente, a "nova CPMF" não significaria aumento da carga de impostos. De todo modo, ele destacou que, caso a proposta saia do papel, pode pedir a opinião dos brasileiros para dar a decisão final sobre o tributo.

"Queriam criar um imposto digital parecido com a CPMF? Queriam, sim, teve essa proposta lá. Agora, eu falei: 'Tudo bem, quer criar isso aqui, e quantos (impostos) que você vai revogar? Se eu me convencer, a gente apresenta à opinião pública. E aí? Cria, recria imposto digital (com alíquotas) de 0,2%, 0,15%, e perde isso aqui. O que você acha que é melhor?'", comentou Bolsonaro.

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Criticas a bancos e a Rogério Marinho 

30/10/2020

 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou a criar desconforto no governo, ontem. Em depoimento na comissão mista do Congresso que acompanha as medidas de combate à covid-19 no país, ele acusou a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) de ser uma "casa de lobby" que financia estudos de "ministro gastador" para tentar derrubar os ministros que querem acabar com os privilégios tributários e o "cartório institucionalizado dos bancos".

Guedes não identificou quem chamava de ministro gastador, mas ficou claro que se referia ao titular da pasta do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, com quem vem mantendo uma desavença aberta no governo. Horas após a declaração de Guedes, Marinho escreveu no Twitter que continua "firme na missão" no governo Jair Bolsonaro.

Junto à mensagem, ele postou um vídeo no qual recebe elogio do presidente Jair Bolsonaro, durante viagem ao Maranhão. "Um homem que vive pelo Brasil todo, especialmente pelo Nordeste", diz o presidente no vídeo, referindo-se ao ministro do Desenvolvimento Regional. "Ao Rogério Marinho, minha solidariedade", afirma Bolsonaro.

Infraestrutura
O estudo a que Guedes fez referência teria sido oferecido a Marinho pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) da Organização das Nações Unidas (ONU). O trabalho trata de investimentos públicos e privados em obras de infraestrutura.

Guedes não poupou críticas aos bancos. "A Febraban é uma casa de lobby. Muito honrada, muito justo o lobby. Mas, está escrito na testa 'lobby bancário', que é para todo mundo entender do que se trata. Inclusive, financiando estudos que não têm a ver com a atividade de defesa das transações bancárias. Financiando ministro gastador para ver se fura teto, se derruba o outro lado", acusou Guedes.
Em nota, a entidade rebateu as críticas. "A Febraban sempre se posicionou pela necessidade de sustentabilidade fiscal como pressuposto da retomada econômica e pela defesa clara em favor da manutenção do teto de gastos", afirmou a entidade.

Na audiência pública, o ministro da Economia disse, ainda, que existe um "cartel bancário" no Brasil, que deixa "200 milhões de trouxas sempre na mão de quatro bancos". E afirmou que, quando se sentem ameaçadas, as instituições financeiras "na mesma hora, vêm correndo (atrás do governo), por meio da Febraban". O ministro acrescentou que os bancos legislam em causa própria "fazendo lobby em Brasília, capturando os orçamentos públicos e subsídios para empresas campeãs". (MB)