Título: OAB quer barrar cursos
Autor: Caitano, Adriana; Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 24/03/2013, Brasil, p. 8
Entidade discutirá com MEC a possibilidade de dar parecer final sobre novas graduações. Ordem se manifesta hoje apenas em caráter opinativo
Após selar um acordo com o Ministério da Educação (MEC) para restringir a abertura de novos cursos de direito, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pretende convencer o governo a utilizar obrigatoriamente o rendimento dos alunos no exame da classe como critério para impedir a abertura de vagas nas faculdades. A lei vigente determina que a posição da entidade seja consultada apenas em caráter opinativo. A OAB destaca que, por não ouvir seus pareceres sobre instituições mal avaliadas, o MEC acabou permitindo que o número de estudantes de direito aumentasse, mesmo com o resultado no teste sendo abaixo do recomendado — apenas um em cada 10 consegue aprovação. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) indicam que são criadas em média 30 mil vagas de ensino jurídico anualmente no país. O salto foi de 75% em 10 anos (veja a arte).
De acordo com a Lei 8.906/ 1994, que cria o Estatuto da Advocacia e a própria Ordem dos Advogados do Brasil, antes de credenciar uma faculdade de direito, o MEC precisa ouvir a opinião da Comissão Nacional de Educação Jurídica do Conselho Federal da entidade. A OAB informa que a média de rejeição é de 90% dos pedidos, o que não foi suficiente para evitar que o número de faculdades com o curso no Brasil seja de 1.260, contra 1,1 mil em todo o mundo. Levantamento feito pelo Correio sobre dados do Inep apontam ainda que, entre 1999 e 2011, a quantidade de alunos matriculados passou de 328,7 mil para 722,8 mil — um crescimento de 120%.
“A OAB não autorizou o funcionamento dessas faculdades. Essas faculdades foram autorizadas ao longo dos anos pelo MEC, que agora está revendo essa posição, numa atitude muito positiva. Minha expectativa é de que, a partir dessa comissão conjunta formada, se possa discutir diversas situações, inclusive que o parecer emitido pela Ordem, hoje meramente opinativo, tenha caráter vinculativo”, afirma o vice-presidente da OAB, Claudio Lamachia. De acordo com ele, à entidade caberia referendar pedidos de criação, reconhecimento ou credenciamento de novos cursos ou vagas adicionais em graduações existentes.
Para o presidente do Movimento Nacional dos Bacharéis em Direito, Reynaldo Arantes, a entidade tem outro propósito, ao impedir a expansão dos cursos de direito no país. “O problema não está nas más faculdades, mas na forma como a OAB realiza uma reserva de mercado, escolhendo quem deve ou não passar, mesmo estando apto para ser advogado”. Arantes rechaça qualquer hipótese de a entidade interferir de forma decisiva na fiscalização e aprovação de novos cursos, defendendo que apenas o governo tem capacidade técnica de aferir a qualidade de instituições de ensino. “A OAB não é fiscalizada e serve para avaliar os cursos de direito”, ironiza.
Drama social
Lamachia classifica como “drama social” a situação de bacharéis que não conseguem se inserir no mercado de trabalho. “São pessoas que investiram quantidades siginificativas de recursos e não receberam qualificação. É isso que o exame da Ordem mostra. Por que temos 80% de aprovação de instituições federais e algumas faculdades privadas não aprovam nenhum candidato? Temos que fazer alguma coisa”, afirma Lamachia. Em média, de acordo com a OAB, 100 mil pessoas se formam em direito anualmente no país, mas só 20 mil passam a atuar como advogados.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello, relator do caso julgado na Corte em 2011 que considerou o exame da OAB constitucional, defende que o resultado da última prova — quando 90% dos inscritos foram reprovados – é um sintoma de que algo vai mal no ensino do país. “Pela ordem natural das coisas, deveria ter mais de 50% de aprovação, mas os resultados causam perplexidade e robustecem a necessidade de o exame ser mantido”, comenta. “O problema está na aprendizagem, pois toda vez que a faculdade é benevolente, a vida profissional é impiedosa. O curso não pode ser uma mera busca para colocar o canudo debaixo do braço, cabe ao MEC atuar, fiscalizar e descobrir por que não se está conseguindo bons profissionais.”
Histórico da prova
O exame da OAB foi criado em 1963, quando uma lei o colocava como opção ao estágio para o bacharel em direito tornar-se advogado. Somente em 1994 a aprovação no teste passou a ser obrigatória para o exercício da profissão. Até 2009, a unidade de cada estado fazia a própria prova, o que permitia que os reprovados em uma cidade pudessem tentar em outra. No ano seguinte, a Ordem criou o exame unificado nacional em duas fases, com três edições por ano.