Correio braziliense, n. 20979, 31/10/2020. Economia, p. 6

 

Desemprego atinge recorde de 14,4%

Marina Barbosa 

31/10/2020

 

 

A crise causada pelo novo coronavírus levou a mais um recorde do desemprego. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 13,8 milhões de pessoas estão sem trabalho no país. Por isso, a taxa de desemprego chegou a 14,4% no trimestre encerrado em agosto. Analistas dizem, contudo, que essa taxa ainda deve subir, apesar de o governo enxergar uma "retomada em V" do emprego Brasil.

Os dados do desemprego foram divulgados ontem pelo IBGE por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), um dia depois de o Ministério da Economia ter comemorado a criação de 313 mil vagas de trabalho com carteira assinada em setembro. E revelam que cerca de 1,1 milhão de pessoas entraram na fila do desemprego só entre os meses de junho, julho e agosto, o que representa um aumento de 8,5% da população desocupada.

Analista da Pnad Contínua, Adriana Beringuy creditou o aumento da taxa de desemprego à flexibilização das medidas de isolamento social. Ela lembrou que muitos dos brasileiros que foram demitidos no início da pandemia de covid-19 não saíram logo à procura de uma nova ocupação por conta do distanciamento social. Só agora que a circulação urbana está retomando, portanto, essas pessoas estão começando a buscar um novo trabalho e, consequentemente, a pressionar a taxa de desemprego.

"Esse aumento da taxa está relacionado ao crescimento do número de pessoas que estavam procurando trabalho. No meio do ano, havia um isolamento maior, com maiores restrições no comércio, e muitas pessoas tinham parado de procurar trabalho por causa desse contexto. Agora, a gente percebe um maior movimento no mercado de trabalho em relação ao trimestre móvel encerrado em maio", explicou Adriana. Ela admitiu, por sua vez, que, além disso, também continuam ocorrendo demissões, mesmo que em menor proporção que no auge da pandemia.

Economistas dizem, no entanto, que o avanço do desemprego foi maior que o esperado no trimestre encerrado em agosto. E avisam que a tendência é que essa taxa continue subindo. Afinal, os dados do IBGE também mostram que, além de 13,8 milhões de desempregados, o Brasil tem 5,9 milhões de desalentados que podem entrar na busca por um emprego nos próximos meses.

Segundo o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, o real tamanho do estrago causado pela pandemia de covid-19 no mercado de trabalho brasileiro só vai ser conhecido no primeiro semestre do próximo ano. Afinal, muitos brasileiros também não estão procurando emprego por conta dos auxílios emergenciais, mas podem partir em busca de uma ocupação quando essa ajuda chegar ao fim.

"Enquanto a economia não voltar a ganhar pujança, vamos ver pessoas saindo às ruas para procurar emprego e, possivelmente, não encontrando", alertou. Ele disse ainda que é por conta disso que, apesar de o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) já ter apontado três meses de criação de vagas formais, o desemprego continua subindo. "A velocidade de criação de vagas ainda é inferior à velocidade com que as pessoas estão saindo para procurar emprego", analisou.

Retomada lenta
Étore e outros analistas acreditam, então, que a taxa de desemprego pode chegar a 16% no início de 2021. E não veem uma retomada da economia forte o suficiente para reabsorver esse pessoal no curto prazo. Um dos indícios de que a retomada será lenta também está na Pnad Contínua, de acordo com o economista-chefe da Necton Investimentos, André Perfeito. Ele destacou que, segundo o IBGE, a massa de rendimentos dos trabalhadores brasileiros caiu 5,7% nos últimos 12 meses, ou seja, perdeu R$ 12,3 bilhões e chegou a R$ 202 bilhões. E essa redução, lembrou Perfeito, deve puxar para baixo o consumo das famílias brasileiras, que é um dos grandes motores da economia brasileira. "Esse dado diz muito do patamar da demanda doméstica e deixa claro que, se não tivermos o auxílio emergencial, o estrago será ainda maior", frisou.

No entendimento dos analistas, o resultado do desemprego, portanto, só aumenta a pressão por uma definição das políticas sociais e econômicas que serão implementadas pelo governo no pós-pandemia. E ainda reforça a pressão pela derrubada do veto à desoneração da folha, que será apreciado na próxima semana pelo Congresso. "Se a desoneração não for renovada, muitas empresas podem ter dificuldade no custeio da folha de pagamento e isso pode aumentar ainda mais o desemprego, pois o benefício atende aos 17 setores que mais empregam no país. Por isso, esse veto deve ser derrubado, mesmo sendo custoso para o governo", opinou o professor de ciências econômicas do Centro Universitário Iesb Luis Guilherme Alho.

Nesta semana, contudo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, avisou que não vai apoiar a desoneração enquanto o Congresso não apontar uma fonte de receitas que compense essa perda de receita. Ele defende a recriação da CPMF como uma forma de custear a desoneração da folha, mas decidiu deixar o imposto "morto" por conta das críticas dos parlamentares. Guedes ainda disse que vê uma recuperação em V do emprego no Brasil, com base nos dados do Caged. E o secretário especial de Previdência de Trabalho, Bruno Bianco, reforçou esse discurso. Para Bianco, os próximos meses serão positivos em termos de criação de vagas formais.

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US$ 1 bilhão para Bolsa Família 

31/10/2020

 

 

O governo brasileiro tomou um empréstimo de US$ 1 bilhão (cerca de R$ 5,7 bilhões na cotação atual) com o Banco Mundial. O recurso será usado na ampliação do Bolsa Família em 2021, conforme informou ontem o Banco Mundial. "O projeto financiará a ampliação do programa, e expandirá a proteção para ao menos 1,2 milhão de famílias pobres que continuarão a precisar de apoio após o fim do auxílio emergencial", informou o Banco Mundial.

A instituição considera a ampliação do Bolsa Família importante "uma vez que as medidas de auxílio emergencial têm prazo para expirar, e o mercado de trabalho continua devagar". Além disso, o Banco Mundial lembrou que "a recuperação da crise do novo coronavírus deve acontecer de maneira gradual e desigual, com milhares de famílias a mais precisando de ajuda em 2021", o que pode aumentar a pobreza no país em 2021.

"Essa parceria com o Banco Mundial nos permitirá incluir famílias que se tornaram temporariamente pobres ou que não estavam cadastradas no programa anteriormente", disse o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, ao Banco Mundial.

A expectativa é que 3 milhões de pessoas, incluindo 990 mil crianças e jovens e 7 mil indígenas, estejam nesse 1,2 milhão de famílias que poderão ser incluídas no Bolsa Família por meio desses recursos. Com isso, o número de famílias atendidas pelo programa de transferência de renda deve chegar a 15,2 milhões.

Esta é a mesma previsão apresentada pelo governo no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2021, que prevê a destinação de R$ 34,8 bilhões para o atendimento de 15,2 milhões de famílias pelo Bolsa Família no próximo ano, mas não destina nada para o Renda Brasil.

O financiamento com o Banco Mundial, por sinal, foi acordado em meio ao impasse sobre a fonte de recursos do Renda Brasil. O governo e o Congresso ainda não encontraram uma forma de bancar o programa que o presidente Jair Bolsonaro gostaria de criar para substituir o Bolsa Família e o auxílio emergencial em 2021. Por isso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, já vem avisando que, se não houver solução dentro do teto de gastos, acha melhor deixar o Renda Brasil para depois e voltar ao Bolsa Família em 2021.

Investimento
Ontem, Guedes também disse, em reunião com o setor industrial, que "o que reduz desigualdade social é investimento". A ideia é que, ao movimentar a economia, os investimentos produtivos gerem emprego e renda e, consequentemente, reduzam a necessidade de programas sociais como o Bolsa Família e o auxílio emergencial.

O ministro indicou ainda que o governo também estuda usar os recursos de organismos internacionais como o Banco Mundial para estimular os investimentos no país. Afinal, hoje o governo não tem caixa para elevar os investimentos públicos, e os empresários brasileiros têm se queixado das taxas de juros de longo prazo, que subiram diante das incertezas do mercado em relação ao rumo das contas públicas brasileiras.

Esses organismos internacionais, por outro lado, têm caixa e ainda costumam oferecer taxas mais baratas. Por isso, além da parceria com o Banco Mundial, há uma expectativa de ampliação da carteira brasileira no Banco dos Brics, o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), que passou a ser comandado pelo brasileiro Marcos Troyjo, ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, neste ano.

Guedes garantiu aos empresários do setor industrial, contudo, que está confiante na vinda de investidores estrangeiros para o país no próximo ano. Isso porque o ministro vê uma recuperação acelerada da economia brasileira, após o choque da covid-19, e acredita que o país vai tirar as reformas econômicas do papel, passando mais confiança a esses investidores. (MB)

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Projeção da dívida pública 

Vera Batista 

31/10/2020

 

 

A Secretaria do Tesouro Nacional atualizou as projeções para a trajetória da dívida pública. Ao final de 2020, a previsão do governo é de que a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) represente 96% do Produto Interno Bruto (soma das riquezas do país). Isso significará um crescimento de 20,2 pontos percentuais em relação a 2019. A crise do covid-19 exigiu do governo despesas extraordinárias em 2020, com deficit primário que deve atingir 12,7% do Produto Interno Bruto (PIB) ao final de 2020. Para os próximos anos, a estimativa é que de a dívida bruta continue crescendo, porém, mais lentamente, chegando a 100,8% do PIB em 2026. Somente após esse prazo, a dívida começaria uma trajetória de queda, para encerrar 2029 em 98% do PIB.

Em relação à Dívida Líquida do Setor Público (DLSP), a expectativa do governo é de que chegue ao final de 2020 a 68,2% do PIB, com aumento de 12,5 pontos percentuais em relação a 2019. A previsão é de que ela cresça continuamente até 2028, para 87% do PIB. "Para 2029, espera-se que este indicador se reduza marginalmente, fechando em 86,9%", informou o Tesouro no Relatório de Projeções da Dívida.

As repercussões da pandemia vão se estender ainda por anos, já que o endividamento (com impacto de R$ 587,4 bilhões no resultado primário) será incorporado e, com isso elevará as despesas de juros que incidem sobre a dívida pública. "Taxas de juros, crescimento econômico e resultado primário das contas públicas são fatores cruciais nas perspectivas de endividamento. A combinação de choques adversos nessas variáveis pode colocar em risco a trajetória da dívida e a chance de sua estabilização no médio prazo", reiterou o Tesouro.