Título: Clima de confronto
Autor: Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 27/03/2013, Política, p. 2

Sob pressão, PSC mantém Feliciano

As pressões de manifestantes, de deputados e até do presidente da Câmara ainda não foram suficientes para tirar o deputado Marco Feliciano do comando da Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Depois de uma semana de mistério, o PSC anunciou ontem o veredicto da legenda sobre o caso: o pastor fica no cargo. Para justificar a posição, que contraria o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o partido alegou que Feliciano não é ficha suja nem homofóbico nem racista. A decisão acirrou o clima de confronto e, na próxima terça-feira, líderes partidários vão se reunir com o pastor para pedir mais uma vez que ele se afaste da comissão. Mas o partido de Marco Feliciano bateu o pé e não abre mão de dar a última palavra sobre a polêmica.

O comando do PSC cobrou abertamente apoio do PT e do governo, alegando que os integrantes da legenda estão ao lado dos petistas desde 1989, quando Luiz Inácio Lula da Silva disputou a primeira eleição à Presidência. Hoje à tarde, o pastor vai presidir a terceira sessão à frente da comissão e deve enfrentar novos protestos. Em uma demonstração de que está decidido a ficar no comando do colegiado, anunciou que fará hoje, às 9h, uma visita à Embaixada da Indonésia para pedir clemência por condenados a morte, entre eles dois brasileiros.

A decisão de Feliciano inflamou os manifestantes, tanto os contrários à permanência do deputado quanto religiosos que foram ao Congresso Nacional oferecer apoio ao pastor. Os dois grupos, por pouco,não entraram em confronto direto e tiveram que ser separados por seguranças da Câmara. O anúncio de que Marco Feliciano não deixaria o cargo, a despeito dos apelos de Henrique Eduardo Alves, ocorreu pouco depois das 16h, ao fim de uma reunião da bancada do PSC com a direção nacional do partido. Quem fez o comunicado foi o vice-presidente nacional da legenda, pastor Everaldo Pereira.

O dirigente do PSC leu uma longa carta para justificar a decisão de seus correligionários. Primeiro, fez um histórico da relação da legenda com o PT e com o governo, em uma clara tentativa de cobrar a fatura do apoio a Lula e à presidente Dilma. "Durante seus dois mandatos, fomos um dos partidos mais fiéis da base aliada", justificou Everaldo. "O deputado Feliciano, eleito com quase 212 mil votos, está na legitimidade de seu mandato, não tem nenhuma condenação no Supremo. Nós entendemos que ele não é homofóbico nem racista e já se desculpou por colocações malfeitas. Qualquer um pode deslizar nas palavras", acrescentou o vice-presidente do partido.

Regimento interno Lideranças evangélicas aguardavam na porta da liderança do PSC à espera do anúncio. Antes mesmo do fim da reunião, Marco Feliciano já havia dado pistas sobre a decisão. Quando chegou para o encontro, cercado de seguranças e muito assediado pela imprensa, ele foi questionado por jornalistas se renunciaria. "É só olhar no meu rosto", disse o pastor, com o semblante tranquilo. Mais tarde, no cafezinho do plenário, ele conversou rapidamente com repórteres e explicou que a direção do partido "mandou ele fechar a boca com zíper".

Apesar de se recusar a comentar a polêmica, ele aceitou falar sobre seus planos para o comando da comissão. "Amanhã (hoje) tenho uma reunião com o embaixador da Indonésia para pedir clemência pela vida de nove condenados à morte. Quero saber se há brasileiros nessa lista e, se houver, vou pedir ajuda ao ministro do Itamaraty, Antônio Patriota, e se for preciso até à presidente Dilma. Nosso país é democrático, e o direito à vida tem que ser preservado", disse Feliciano, que, na semana passada, já havia visitado a Embaixada da Bolívia para pedir apoio aos 12 corintianos presos no país. Sobre as perspectivas de novos confrontos na sessão de hoje da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, o pastor disse que terá "cautela" na organização da sessão. "Houve um sabotamento (sic) da outra vez", justificou.

Ontem à noite, Henrique Eduardo Alves se reuniu com líderes partidários até as 22h. Eles analisaram formas de driblar a decisão do PSC com base no regimento interno da Câmara. Uma das hipóteses era que os partidos retirassem seus indicados da comissão para que ela ficasse sem quórum e, portanto, os trabalhos fossem inviabilizados. "Mas logo, perceberam que a maioria dos atuais integrantes é formada por pastores e que essa estratégia não funcionaria", contou o líder do PSol na Câmara, deputado Ivan Valente (SP).

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, disse que ainda espera uma "decisão democrática e respeitosa" apesar de ter perdido o primeiro round da batalha contra Feliciano e o PSC. "Na reunião com o colégio de líderes, na próxima terça-feira, ele terá a oportunidade de dar as suas razões e de ouvir as lideranças. Esse clima de radicalismo não pode continuar, é dever do deputado Feliciano cuidar para que a comissão volte à normalidade", afirmou o presidente da Câmara.