Valor econômico, v. 21, n. 5136, 26/11/2020. Brasil, p. A6

 

Mesmo antes da pandemia, 23% da renda disponível era não monetária, indica IBGE

Alessandra Saraiva

26/11/2020

 

 

Lista é formada por bens e serviços gratuitos providos por governo, instituições e outros, como doações

Antes mesmo da crise na economia causada pela pandemia, em torno de um quarto do orçamento dos brasileiros era de origem não monetária, ou seja: bens e serviços gratuitos providos por governo, instituições e outros, como doações. É o que mostra a Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-2018: Perfil das despesas no Brasil, do IBGE.

No levantamento, o instituto apurou também que, na parcela dos 10% mais pobres do país, a dependência por fontes de origem não monetária é ainda maior: quase metade da renda disponível do brasileiro nessa faixa (42,5%) não tinha dinheiro como origem.

“Bens e serviços não monetários são cestas básicas gratuitas, medicamentos doados, serviços de saúde públicos etc.”, exemplificou Leonardo Oliveira, economista do IBGE. “Essa parcela de origem não monetária é importante para as famílias mais pobres.”

A pesquisa mostrou, ainda, clara conexão entre baixa renda e raça: 77,8% de toda a pobreza no país recai sobre famílias cuja pessoa de referência, chefe de família, se declarou preta ou parda. Essas famílias sobrevivem no mês com quase metade do orçamento de uma família cuja pessoa de referência é branca.

O IBGE fez um cálculo novo, sobre qual seria a média nacional para renda disponível familiar per capita mensal, no país. Esse montante levou em conta dinheiro, e valor convertido em reais de bens e serviços recebidos sem pagamento, foi de R$ 1.650,78 deduzido de impostos no período da pesquisa.

A renda bruta com origem monetária, de R$ 1.434,15, corresponde a 86,9% do valor após dedução tributária. Já a renda não monetária equivale a 23%, ou R$ 379,97. Os valores somados ultrapassam os R$ 1.650,78 porque são calculados antes da dedução

O impacto da chamada renda “não monetária” foi tão relevante que ajudou a melhorar medidor de desigualdade. Em 2018, o índice de Gini (indicador que, quanto mais perto de zero, menor desigualdade) ficou em 0,545 na pesquisa Pnad Contínua do IBGE, que leva em conta renda bruta. Na renda disponível familiar per capita, no entanto, que leva em conta o fator de influência “não monetária”, esse indicador ficou em 0,483.

Na parcela de até 5% dos mais pobres, a renda disponível mensal familiar per capita ficou em R$ 245,82 entre os brancos e em apenas R$ 141,98 entre pretos e pardos. No caso dos 5% mais ricos, são R$ 8.988,07 entre os brancos e R$ 4.151,62 entre pretos e pardos.