Título: Os fiadores de Feliciano
Autor: Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 30/03/2013, Política, p. 2

Mais do que apoio do partido, o PSC, o pastor conta com a sustentação de líderes do PMDB e do PR para se manter à frente da Comissão de Direitos Humanos, apesar da pressão de parlamentares opositores e militantes

Além do suporte de correligionários do PSC e de integrantes da bancada evangélica, o deputado e pastor Marco Feliciano conta com o apoio da liderança de grandes partidos para persistir no comando da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Em meio a tentativas de divulgar notas de repúdio contra o deputado ou de buscar saídas regimentais para forçá-lo a largar a presidência da comissão, debatidas por integrantes do colégio de líderes, o único consenso foi uma inócua convocação de Feliciano para uma reunião na próxima terça-feira. O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), e do PR, Anthony Garotinho (RJ), se transformaram nos grandes fiadores da permanência do pastor no colegiado. Esse apoio foi fundamental para reduzir a pressão interna sobre o pastor e para permitir a sua continuidade no cargo, apesar dos protestos e da polêmica.

Juntos, o PMDB e o bloco liderado pelo PR têm 125 parlamentares, o equivalente a 25% do total de deputados da Casa. A relevância do apoio fez com que o pastor, que inicialmente enfrentava a relutância até mesmo de integrantes do próprio partido, ganhasse força para driblar manifestantes e parlamentares opositores.

Assim como Feliciano, Eduardo Cunha e Anthony Garotinho são da bancada evangélica. Mas os líderes negam que o suporte concedido ao pastor tenha relação com a religião. “A minha posição pessoal é de que não há nada o que possa ser feito regimentalmente. Ele só sai da presidência se renunciar e o Feliciano já disse que não vai sair. Quanto mais esse debate for estimulado, mais estaremos alimentando a expectativa de que ele deixe o cargo e mais estaremos fomentando protestos de ambos os lados”, explica Cunha.

A reunião do pastor Feliciano com os integrantes do colégio de líderes foi definida na última terça, durante um encontro do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), com as lideranças partidárias. Na reunião, deputados defenderam que os partidos retirassem os representantes da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, para que o colegiado ficasse sem quórum para funcionar. Mas essa possibilidade foi descartada, já que a maioria dos integrantes da comissão é formada por apoiadores de Feliciano. Alguns líderes defendiam a elaboração de uma nota de repúdio, que seria assinada por todos os representantes das legendas. Mas Eduardo Cunha e Garotinho não aceitaram a proposta e a única saída honrosa foi chamar Feliciano e pedir a ele pessoalmente que renuncie. O pastor e dirigentes do PSC já asseguraram a permanência, independentemente da pressão do encontro com as lideranças.

Eduardo Cunha diz que agora só resta à presidência da Câmara dar garantias para Feliciano trabalhar. “Nessa reunião, será feito um apelo para que ele renuncie, o que obviamente não será atendido. Agora, cabe a ele administrar a comissão e cabe à Casa dar segurança e condições para que o Feliciano faça as reuniões”, argumenta o líder do PMDB. Ele conta que argumentou com o presidente da Câmara para que o encontro da próxima terça-feira não fosse realizado. “Na minha opinião, não adianta ficar expondo o colégio de líderes e a presidência. Disse ao presidente que não adianta trazer para o nosso colo um problema que não é nosso, é desnecessário”, acrescenta Eduardo Cunha.

Protestos Líder do bloco do PR na Câmara, Anthony Garotinho faz eco às críticas. “O presidente da Câmara está errando ao alimentar uma expectativa de saída do Feliciano, essa possibilidade inexiste do ponto de vista regimental. Na medida em que ele estimula isso, alimenta as pessoas que vão à Câmara para protestar”, explica o deputado. “Se essa situação se prolongar, até mesmo pessoas que têm divergências doutrinárias com Feliciano vão ficar ao lado dele. Porque a imagem que passa é que ele está sendo perseguido”, acrescenta o líder.

Para Garotinho, assim como defendem integrantes da bancada evangélica, Feliciano só estaria sofrendo pressão pelo fato de ser pastor. “Qual seria o motivo de ele ser perseguido? O fato de ter problema no Supremo? E os condenados pelo mensalão, que continuam na Câmara e integrando comissões importantes?”

Rebater críticas com acusações contra os deputados envolvidos com o escândalo do mensalão tem sido uma estratégia cada vez mais recorrente entre os que defendem a permanência do pastor na Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Na última quarta-feira, o líder do PSC na Câmara, André Moura, usou esse argumento durante um discurso no plenário. “Por que o PT indica para a Comissão de Constituição e Justiça dois mensaleiros condenados pela mais alta Corte deste país, o STF? Será que julgar a indicação do deputado pastor Marco Feliciano é correto para um partido como o PT, que indicou dois mensaleiros condenados pela mais alta Corte deste país para a Comissão de Constituição e Justiça?”, questionou Moura.

Beijo gay em tradicional publicação americana Em meio à realização do julgamento da Suprema Corte americana que vai decidir sobre a legalidade do casamento gay nos Estados Unidos, a tradicional revista Time estampou, pela primeira vez, na capa um beijo gay. A edição desta semana foi impressa em duas versões: uma delas mostra duas mulheres se beijando e, na segunda opção, dois homens. A capa diz “O casamento gay já ganhou. A Suprema Corte ainda não se decidiu, mas a América já”. Pesquisas americanas mostram que a maioria dos cidadãos americanos é favorável à proposta.

A Suprema Corte americana vai analisar a chamada Lei de Defesa do Casamento, que restringe o matrimônio apenas a relações entre um homem e uma mulher. A reportagem lembra que a liberação do casamento entre pessoas do mesmo sexo começou na Holanda, em 2001, e já beneficia cidadãos da Argentina, da Bélgica e do Canadá. Nos Estados Unidos, nove estados já liberaram o casamento gay.

O Correio Braziliense já havia publicado a imagem de um beijo gay em 11 de maio de 2011. A reportagem foi publicada pouco depois da decisão do Supremo Tribunal Federal que liberou as uniões civis entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil, o projeto que altera o Código Civil para reconhecer a união estável entre homossexuais e para liberar a conversão dessa união em casamento está pronto para ser analisado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). A proposta, apresentada pela senadora licenciada Marta Suplicy (PT-SP), enfrenta forte resistência no Congresso, especialmente por parte da bancada religiosa.

Críticas ao PT Em entrevista ao humorista Danilo Gentili, que foi ao ar na noite da última quinta-feira, o pastor Marco Feliciano atribuiu ao ativismo dos gays nas redes sociais os ataques que vem sofrendo desde que assumiu a Comissão de Direitos Humanos e, pela primeira vez, ameaçou o PT e o governo, de quem é aliado desde as eleições passadas. O deputado disse que pode estar sofrendo pressão para tirar o foco de condenados pelo mensalão que atualmente fazem parte da Comissão de Constituição e Justiça. “É um jogo político. Eu penso que, neste momento, o PT começa a repensar. Se isso estiver acontecendo de fato (o PT expor o pastor para tirar a atenção de outras denúncias envolvendo o partido), a presidente Dilma e o PT devem estar jogando fora o apoio dos evangélicos, que não é pequeno, para a eleição do ano que vem. Somos quase 70 milhões no Brasil.”